Acórdão nº 323/03 de Tribunal Constitucional (Port, 02 de Julho de 2003

Magistrado ResponsávelCons. Mário Torres
Data da Resolução02 de Julho de 2003
EmissorTribunal Constitucional (Port

Acórdão n.º 323/03 Processo n.º 195/03

  1. Secção

Relator: Cons. Mário Torres

Acordam na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional,

1. Relatório

A. interpôs recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional, aprovada pela Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, alterada, por último, pela Lei n.º 13-A/98, de 26 de Fevereiro (doravante designada por LTC), contra o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 22 de Janeiro de 2003 (que rejeitou recurso da sentença do 1.º Juízo Criminal de Lisboa, que o condenara pela prática de crimes de reprodução ilegítima de programas protegidos), pretendendo ver apreciada a conformidade com a Constituição da República Portuguesa, designadamente com o seu artigo 32.º, da “interpretação normativa dos artigos 411.º, n.º 3, 412.º, n.ºs 1 a 3, 414.º, n.º 2, 419.º e 420.º, todos do Código de Processo Penal, se a mesma for no sentido de a falta de conclusões da motivação implicar a imediata rejeição do recurso, sem que previamente seja feito o convite ao recorrente para suprir tal deficiência”.

O acórdão recorrido, para concluir pela rejeição do recurso, “nos termos do disposto nos artigos 412.º, n.ºs 1 e 2, 419.º e 420.º do Código de Processo Penal”, desenvolveu a seguinte argumentação:

“Nos termos do artigo 412.°, n.° 1, do Código de Processo Penal, a motivação enuncia especificamente os fundamentos do recurso e termina pela formulação de conclusões, deduzidas por artigos, em que o recorrente resume as razões do pedido.

Assim, o «âmbito do recurso é dado pelas conclusões extraídas pelo recorrente da respectiva motivação» – Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 13 de Março de 1991, processo n.º 41 694.

Deve ser rejeitado o recurso que na respectiva motivação não apresente conclusões

– Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 21 de Junho de 1995, processo n.º 47 717 –, o que traduz jurisprudência corrente, como assinala Maia Gonçalves, em nota ao artigo 412.° do Código de Processo Penal, a pág. 751 do Código de Processo Penal Anotado, 11.ª edição.

Como se vê da motivação dos recorrentes (fls. 544 a 571), a motivação está articulada e termina formulando pedidos, como consta das alíneas a), b) e c) de fls. 571.

No entanto, as alegações de recurso carecem totalmente de conclusões.

Não é o caso, como bem refere o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto, de suprir deficiências por ausência das menções constantes das alíneas a) a c) do n.° 2 do artigo 412.° do Código de Processo Penal, nem se está perante uma situação de falta de concisão nas conclusões: em qualquer destas situações – se fosse o caso – dever-se-ia convidar os recorrentes a suprirem a deficiência, como se decidiu no Tribunal Constitucional em jurisprudência que, hoje, é obrigatória – ver os Acórdãos do Tribunal Constitucional n.ºs 337/2000, de 21 de Julho de 2000, e n.º 320/2002, de 7 de Outubro de 2002.

Nas situações analisadas pelo Tribunal Constitucional está-se perante recursos onde as conclusões existem, ainda que apresentem deficiências que poderão ser corrigidas pelo convide ao recorrente com tal finalidade.

No caso destes autos está-se perante a ausência total de conclusões.

Salvo o devido respeito, não podemos acolher a jurisprudência referida e constante do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 15 de Novembro de 2001, que teve voto maioritário dos Ex.mos Conselheiros; antes concordamos com a posição assumida pelo Ex.mo Conselheiro que subscreveu o voto de vencido e que, com a devida vénia, transcrevemos em parte: «... a falta de conclusões da motivação determina a rejeição imediata do recurso sem qualquer convite ao recorrente para apresentá-las. É o que resulta, claramente, dos artigos 412.°, n.° 1, 414.°, n.° 2, e 420.°, n.º 1, do Código de Processo Penal. As conclusões, que definem e delimitam o objecto do recurso, são a parte crucial da motivação, pelo que a sua falta corresponde a falta de motivação. A falta de convite ao recorrente para apresentar conclusões não constitui afronta às garantias de defesa do arguido – artigo 32.º, n.º 7, do Código de Processo Penal –, nomeadamente, tendo o mesmo advogado a representá-lo no processo, o qual não pode ignorar o que a lei dispõe nesta matéria. Neste caso, o convite para a apresentação de conclusões constitui uma desproporcionada e ilegítima protecção das garantias de defesa do arguido, incluindo o recurso, que não se pode sufragar, sobretudo se não se conceder igual oportunidade aos outros recorrentes, Ministério Público, assistente, partes civis, etc. O que não temos visto defender.»

Inexiste, assim, com este entendimento, razão para aceitar como regularizada a situação da falta de conclusões com a apresentação das mesmas no âmbito da resposta prevista no artigo 417.°, n.° 2, do Código de Processo Penal

Neste Tribunal Constitucional, o recorrente apresentou alegações, no termo das quais formulou as seguintes conclusões:

“i. É desconforme com a Constituição da República Portuguesa, designadamente com o seu artigo 32.°, n.° 1, a interpretação normativa dos artigos 411.°, n.° 3, 412.º, n.°s l a 3, 414.°, n.º 2, 419.° e 420.°, todos do Código de Processo Penal – aliás, perfilhada no acórdão recorrido –, no sentido de a falta de conclusões implicar a imediata rejeição do recurso, sem que previamente seja feito o convite ao recorrente para suprir tal deficiência;

ii. O direito ao recurso é uma das garantias essenciais do arguido, sendo certo que em processo penal o seu exercício pressupõe que a sua interposição seja motivada, sob pena de não admissão;

iii. Constando as alegações/motivação, embora faltando as conclusões, encontram-se nos autos as razões da discordância quanto à aplicação do direito, sobretudo se nas mesmas (alegações) se encontram efectuadas as indicações referidas nas alíneas a), b) e c) do n.º 2 do artigo 412.° do Código de Processo Penal;

iv. As conclusões são, pois, um «complemento lógico e sintético do procedimento de recurso explanado ao longo das alegações», cuja função, no essencial, é «facilitar o trabalho» ao órgão que irá apreciar e decidir o recurso, maxime se as alegações forem prolixas e de deficiente ordenação lógica;

v. Sancionar com a rejeição fulminante do recurso a simples falta das conclusões, sem que ao recorrente seja dada a oportunidade de as apresentar, importa uma reacção desproporcionada e injusta, que não sopesa devidamente os interesses em presença, fazendo prevalecer claramente o de menor relevância (a saber, a facilitação do trabalho do órgão decisor, na medida em que lhe permita mais fácil e rapidamente apreender as razões da discordância quanto à decisão de que se recorre – e se a motivação for já ela deduzida por artigos, com uma sequência lógica e correctamente ordenada? serão necessárias as conclusões? não estarão as mesmas «contidas» na motivação?);

vi. Tal regime da lei ordinária a vigorar, o que desde já se questiona mesmo em sede de interpretação meramente literal nunca poderá ser...

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