Acórdão nº 99/99 de Tribunal Constitucional (Port, 10 de Fevereiro de 1999

Magistrado ResponsávelCons. Paulo Mota Pinto
Data da Resolução10 de Fevereiro de 1999
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃ0 Nº 99/99

Proc. n.º80/98

  1. Secção

    Relator — Paulo Mota Pinto

    Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional:

    1. Relatório:

    2. Em 30 de Janeiro de 1995, L... interpôs, no Tribunal Administrativo de Círculo do Porto, recurso contencioso de anulação do despacho de 28 de Setembro de 1994 da Direcção da Caixa Geral de Aposentações que lhe fixou a respectiva pensão mensal, no montante de 741 838$00, desde a data (7 de Fevereiro de 1994) em que foi submetido à junta médica que declarou a sua incapacidade permanente e absoluta para o exercício das funções de notário.

      Por sentença de 30 de Outubro de 1995 do Tribunal Administrativo de Círculo do Porto, foi negado provimento ao recurso, considerando inverificada a invocada inconstitucionalidade do n.º 5 do artigo 47º do Estatuto da Aposentação (aprovado pelo Decreto-Lei n.º 498/72, de 9 de Dezembro), introduzido pelo artigo 7º da Lei n.º 75/93, de 20 de Dezembro.

    3. Inconformado, o recorrente interpôs recurso para a Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo, mantendo a impugnação da constitucionalidade da norma, mas a 2ª Subsecção da referida Secção, por Acórdão de 1 de Julho de 1997, negou provimento ao recurso, considerando improcedente a invocada violação dos princípios da confiança e da não retroactividade da lei, bem como do disposto nos n.ºs 1, 4 e 5 do artigo 63º da Constituição da República Portuguesa.

    4. Ainda inconformado, o recorrente trouxe recurso para este Tribunal, logo apresentando as respectivas alegações. Notificado para alegar neste Tribunal, concluiu assim:

      "1ª

      O recorrente, durante a sua vida de funcionário público, obteve, através de remunerações variáveis de acordo com o trabalho despendido, proventos que excederam a remuneração-base legalmente fixada para o cargo de Primeiro-Ministro, incidindo a quota que pagava obrigatoriamente à Caixa Geral de Aposentações sobre a sua remuneração mensal global.

      Em contrapartida, a pensão de aposentação a ele atribuída foi reduzida – aliás, incorrectamente – até ao limite da remuneração base legalmente fixada para o cargo de Primeiro-Ministro.

      As quotas pagas, respeitantes às remunerações que excederam aquele plafond, foram totalmente inúteis, acabando o recorrente, assim, por ser despojado das importâncias delas, por não lhe haver sido atribuído o correspondente benefício – a parte da pensão de aposentação que sempre teve a legítima expectativa de obter e que o n.º 5 do art.º 47º do Estatuto da Aposentação veio retirar-lhe.

  2. À obrigação de pagamento de quotas para a Caixa Geral de Aposentações subjaz como que um ‘acordo’ entre o subscritor e essa entidade, segundo o qual ele presta mensalmente, a ela, uma determinada quantia, de modo a obter, na aposentação, uma importância correspectiva.

    Esse direito do recorrente, à data em que efectuou o pagamento das quotizações para a Caixa Geral de Aposentações, não pode deixar de haver-se por adquirido e legalmente protegido.

    O recorrente tinha um efectivo direito a que as quotas por si pagas fossem contadas para o ‘quantum’ da pensão de aposentação.

  3. O art.º 7º da Lei n.º 75/93, de 20 de Dezembro, veio disciplinar o regime da passagem à situação de aposentação designadamente por quem reunia já todos os pressupostos para o efeito, enquadrado por um regime e por forma a precipitar uma diminuição de direitos anteriormente conferidos e a frustar expectativas legítimas.

  4. O referido art.º 7º da Lei n.º 75/93, vigorando aparentemente só para o futuro – rectius: no futuro -, acaba por ter eficácia retroactiva, ao aplicar-se a situações existentes à data da sua entrada em vigor e estabilizadas, de modo a alterar substancialmente a conformação das situações passadas, quanto à projecção destas e às consequências que a elas haviam sido assinadas.

  5. O novo critério de cálculo da remuneração, para efeitos de fixação da pensão de aposentação, ofende, assim, a garantia constitucional do respeito por situações jurídicas subjectivas firmadas à luz de uma lei anterior válida.

  6. A violação de tal garantia constitucional da confiança dos cidadãos, expressa na segurança e certeza da ordem jurídica, representa um desrespeito directo pelo princípio do Estado de direito democrático (Constituição, art.º 2º).

  7. Afectou, pois, retroactivamente, de modo manifestamente desrazoável, a posição juridicamente tutelada do recorrente.

  8. Parte da remuneração global de determinados cargos, como o desempenhado pelo recorrente, era – e é – obtida através de receitas variáveis, sem limite, dependentes apenas do esforço e capacidade de cada um, representando um incentivo e uma recompensa para...

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