Acórdão nº 229/08 de Tribunal Constitucional (Port, 21 de Abril de 2008

Magistrado ResponsávelCons. Vitor Gomes
Data da Resolução21 de Abril de 2008
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 229/2008

Processo n.º 785/2007

  1. Secção

    Relator: Conselheiro Vítor Gomes

    (Conselheira Maria Lúcia Amaral)

    Acordam na 3ª Secção do Tribunal Constitucional

    I - Relatório

    1. A caixa geral de aposentações interpôs recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei nº 28/82 (Lei do Tribunal Constitucional), do acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 14 de Junho de 2007, que, recusando a aplicação das normas contidas no n.º 6 do artigo 1.º e no artigo 2.º da Lei nº 1/2004, revogou o acórdão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga datado de 5 de Maio de 2006 (fls. 241 dos autos).

      No requerimento do recurso de constitucionalidade, diz a Caixa Geral de Aposentações pretender que sejam apreciadas pelo Tribunal Constitucional as normas acima mencionadas [por lapso, indicam-se as constantes dos nºs 6 e 8 do artigo 1.º da Lei nº 1/2004], «na interpretação que delas foi feita no douto Acórdão [do Tribunal Central Administrativo Norte] que recusou a sua aplicação com fundamento em inconstitucionalidade material, por violação do disposto no s artigos 2.º e 266.º da Constituição da República Portuguesa.» (fls. 248 dos autos).

    2. Nas suas alegações de recurso, a recorrente concluiu do seguinte modo:

      “1ª O Decreto-Lei n.° 116/85, de 19/04, previa um regime especial e excepcional de aposentação antecipada face ao regime-regra previsto no artigo 37.° do Estatuto da Aposentação e constituía, antes de tudo o mais, uma medida conjuntural “de descongestionamento da Administração Pública” dependente de não haver “prejuízo para o serviço”, e não o reconhecimento incondicional de um direito dos funcionários à aposentação antecipada, sendo expectável a sua alteração quando se modificassem as circunstâncias da adopção da medida legislativa.

  2. A tramitação administrativa triangular — bem conhecida do legislador —, prevista no artigo 3.° do Decreto-Lei n.° 116/85, de 19 de Abril, esteve na base da eleição do critério da data do envio do processo para a CGA a que se refere o artigo 1.º, n.° 6, da Lei n.° 1/2004, de 15 de Janeiro, não tendo sido propositadamente dada qualquer relevância à data em que o subscritor efectuou o pedido junto do serviço.

  3. Tal critério é claro e objectivo, não violando qualquer princípio ou norma constitucional.

  4. Acresce que a revogação do Decreto-Lei n.° 116/85, de 19 de Abril, não atingiu o conteúdo essencial do direito à aposentação dos subscritores da CGA, seja nos termos gerais (artigo 37.°, n.° 1 e 2 do Estatuto da Aposentação – EA), seja na nova modalidade de aposentação antecipada (prevista no art.° 37.°-A do EA) e, como tal, não implica «uma alteração inadmissível, intolerável, arbitrária, demasiado onerosa e inconsistente».

  5. A publicação tardia do Acórdão n.° 360/2003 do Tribunal Constitucional que considerou a revogação do Decreto-Lei n.° 116/85, de 19 de Abril, pelo artigo 9.° da Lei n.° 32-B/2002, de 30 de Dezembro, inconstitucional por razões de mera forma, bem como o excessivo formalismo exigido, via interpretativa, para a aprovação dos diplomas legais, implicou o atraso no procedimento legislativo tendente à publicação da Lei n.° 1/2004 – que culminou na sua retroactividade “quinzenal” –, mas igualmente permitiu o perfeito (re)conhecimento daquele diploma antes da sua publicação final (pois as normas constantes desta Lei são exactamente as mesmas que foram declaradas inconstitucionais no âmbito da Lei n.° 32-B/2002, de 30 de Dezembro) quer pelos Sindicatos, que as contestaram viva e publicamente, quer pelos subscritores da CGA, para além do eco que as reformas introduzidas no regime jurídico de aposentação tiveram nos media, bem como as vicissitudes a ela ligadas.

  6. A revogação do Decreto-Lei n.° 116/85, de 19 de Abril, era uma alteração com a qual os cidadãos e a comunidade já há muito podiam contar, expectantes que estavam, razoável e fundadamente, na alteração do ordenamento jurídico que regia a constituição daquelas relações jurídicas de aposentação, já que, como se demonstrou era público e notório que estava em marcha o processo legislativo tendente à aprovação de tal medida, nos mesmos moldes que já haviam sido adoptados um ano antes pela Lei n.° 32-B/2002, de 30 de Dezembro, o mais rapidamente possível, para entrar em vigor em 1 de Janeiro de 2004, como, aliás é norma neste tipo de diplomas.

  7. O atraso na publicação, que criou a situação de retroactividade ou de retrospectividade em meros 15 dias, e cuja aprovação, sublinha-se, foi amplamente noticiada na comunicação social e vivamente contestada pelos Sindicatos, não invalida de modo algum os seus efeitos, já que a sua vigência não depende do seu conhecimento efectivo, embora a sua eficácia dependa da sua publicação.

  8. Em conclusão, os artigos 1.º, n.° 6, e 2.°, da Lei n.° 1/2004, de 15 de Janeiro, por conterem normas de efeitos retroactivos, não são inconstitucionais, já que não atingem, de forma inadmissível, intolerável, arbitrária, demasiado onerosa e inconsistente as legítimas expectativas daqueles que podiam requerer a pensão de aposentação, de características excepcionais, prevista no regime instituído pelo Decreto-Lei n.° 116/85, de 14 de Abril.”

    1. O recorrido apresentou contra-alegações, nas quais formulou as seguintes conclusões:

      “(…) o douto Acórdão recorrido, no que respeita à questão da constitucionalidade, apenas versa sobre o regime transitório das normas vertidas no n° 6, do art. 1° e art. 2° da Lei n° 1/2004, de 15 de Janeiro “quando entendidas no sentido de que não é aplicável o regime do Dec. Lei n° 116/85, de 19/4, aos processos que se iniciaram antes de 31/12/2003, pelo simples facto de não terem dado entrada na C. G.A. até à data da entrada em vigor daquela Lei, por violação conjugada do disposto nos art.s 2° e 266° da C.R.P. – princípios da protecção da confiança e da segurança jurídicas inerentes ao princípio do Estado de Direito”, pelo que “será de atender ao regime decorrente do Dec. Lei n°116/85”.

      Assim, o que padece de ilegalidade é esse regime transitório quando define como relevante a data do envio do processo de aposentação (pelos respectivos serviços ou entidades) à C.G.D. abstraindo da data em que o requerente formula o pedido.

      O ora recorrido formulou o seu pedido em 28/11/2003, ao abrigo do disposto no Dec. Lei n° 116/85, então em vigor, mas por razões que lhe não são imputáveis, a DREN só informou e enviou o seu processo de aposentação à C.G.D. em 18/02/04.

      E, nesta vertente – e não de qualquer pretensa irretroactividade – é que o douto Acórdão recorrido entendeu que o referido regime transitório violou os referidos princípios da protecção da confiança e da segurança jurídica estruturantes dum Estado de Direito Democrático.

      Na verdade, sabendo-se que entre a data do requerimento e a resolução final pode decorrer um período mais ou menos longo, o que releva são os pressupostos factuais existentes na data do pedido, de acordo com a lei vigente nessa ocasião e não de harmonia com unia lei entrada posteriormente em vigor.

      Assim, e como dispõe o douto Acórdão recorrido, o interessado não pode ser responsabilizado ou prejudicado pela demora na actuação dos serviços da Administração, não sendo legítimo que o mesmo, confiando no regular e normal andamento dos processos e no respeito escrupuloso dos prazos, venha a ser confrontado com o incumprimento daqueles prazos e penalizado na sua esfera jurídica por motivos aos quais é alheio e que apenas são assacáveis a omissão da Administração.

      Não é justificável ou considerada adequada e respeitadora da Lei Fundamental uma solução legal transitória que permite que dois interessados que hajam formulado a mesma pretensão – aposentação antecipada ao abrigo do Dec. Lei n° 115/85, num mesmo dia, possam ver a Administração decidir em sentidos diametralmente opostos pelo simples facto de quanto a um dos indivíduos o processo se haver desenvolvido com respeito dos prazos e o processo ter dado entrada na CGA antes de 31/12/2003 e quanto ao outro, por omissão da Administração, o processo só ter dado entrada após aquela data.

      Deste modo, para o caso dos autos, a retroactividade desse regime transitório – reportado a 1/01/04, cfr. art. 2º da Lei n° 1/2004 — não é relevante, pois não altera a solução jurídica do caso sub judice – conforme se entendesse que a lei entrou em vigor com a sua publicação (15/01/04) ou se se deve atender à data (retroactiva) de 1/01/04.

      Em qualquer caso, o processo do ora recorrido foi enviado pela DREN à C.G.A. posteriormente a tais datas, pelo que a afirmação da recorrente de que “a eficácia retroactiva ou a retroactividade inautêntica da Lei n° 1/2004, de 15/01, não é inconstitucional por não se traduzir na violação de qualquer princípio ou disposição constitucional autónoma”, nada tem a ver com a situação dos autos.

      Também não está em causa a constitucionalidade da revogação do D.L. n° 116/85, pelo que não se coloca sequer a questão de saber se tal revogação implica “uma alteração inadmissível, intolerável, arbitrária, demasiado onerosa e inconsistente”.

      Em tudo o mais dá-se aqui por integralmente reproduzido o douto Acórdão recorrido.”

      I -Fundamentos

      1. A questão de constitucionalidade

    2. São submetidas à apreciação do Tribunal Constitucional, através do presente recurso de constitucionalidade, as normas constantes do n.º 6 do artigo 1.º e do artigo 2.º da Lei nº 1/2204. É o seguinte, o teor dos referidos preceitos:

      Artigo 1º

      Caixa Geral de Aposentações

      (….)

      6 – O disposto nos números anteriores não se aplica aos subscritores da Caixa Geral de Aposentações cujos processos de aposentação sejam enviados a essa Caixa, pelos respectivos serviços ou entidades, até à data de entrada em vigor deste diploma, desde que os interessados reúnam, nessa data, as condições legalmente exigidas para a concessão de aposentação, incluindo aqueles cuja aposentação depende da incapacidade dos interessados e esta venha a ser declarada pela competente junta médica após...

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