Acórdão nº 325/12 de Tribunal Constitucional (Port, 27 de Junho de 2012

Magistrado ResponsávelCons. Vítor Gomes
Data da Resolução27 de Junho de 2012
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 325/2012

Processo n.º 69/2012

  1. Secção

Relator: Conselheiro Vítor Gomes

Acordam na 3ª Secção do Tribunal Constitucional

I - Relatório

  1. A., S.A., B., S.A., e C., S.A., instauraram ação de contencioso pré-contratual contra o MUNICIPIO do PORTO, impugnando a decisão que excluirá o agrupamento formado pelas autoras de um concurso público (concurso limitado por prévia qualificação internacional denominado “Concessão de recolha de resíduos sólidos urbanos e limpeza pública no Município do Porto”).

    Tendo sido julgada procedente a exceção de caducidade dessa ação, as Autoras interpuseram recurso da sentença para o Tribunal Central Administrativo Norte. Por acórdão de fls 781 foi negado provimento ao recurso.

    As recorrentes interpuseram recurso de constitucionalidade deste acórdão, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, com vista à apreciação da inconstitucionalidade da norma contida na alínea a) do n.º 1 do artigo 469.º do Código dos Contratos Públicos, na medida em que não concede aos particulares concorrentes ou candidatos em procedimentos adjudicatórios a possibilidade que, pelo n.º 2 do mesmo artigo, é conferida às entidades adjudicantes.

  2. As recorrentes apresentaram alegações em que concluem nos termos seguintes:

    1. O presente recurso para o Tribunal Constitucional vem interposto da douta sentença do Tribunal a quo que aplicou a norma prevista no artigo 469.º, n.º 1 do Código dos Contratos Públicos, cuja inconstitucionalidade foi suscitada no recurso de apelação;

    2. Com o presente recurso, os recorrentes pretendem ver julgado inconstitucional o artigo 469.º do Código dos Contratos Públicos, por violação do artigo 13.º, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa, no sentido em que diferencia, sem qualquer justificação, as pessoas de direito público das pessoas de direito privado, em prejuízo destas;

    3. O acórdão recorrido deve ser revogado, aplicando-se o artigo 469.º, n.º 2 aos ora recorrentes, com todos os efeitos legais que daí advêm;

    4. O artigo 469.º do CCP consagra uma diferença de tratamento jurídico entre as pessoas de direito público e de direito privado, pois estipula que as notificações se consideram efetuadas na data da expedição, exceto se trate da entidade adjudicante ou do contraente público, caso em que a notificação feita após as 17h se presume feita às 10 horas do dia útil seguinte;

    5. Sendo pessoas de direito privado e tendo a notificação sido enviada numa 6ª feira, às 22h50m, os ora recorrentes consideraram-se notificados logo naquela data;

    6. Para a sua verdadeira proteção, os destinatários de atos administrativos devem ter a possibilidade de ter conhecimento efetivo destes;

    7. Razão pela qual, nomeadamente, a lei diferencia elaboração e expedição de uma comunicação, bem como se fundamenta a presunção do artigo 469.º, n.º 2 do CCP;

    8. A lei civil faz coincidir a data relevante para inicio da contagem de prazo com a expedição, sendo esta distinta da elaboração da notificação, o que tem todo o sentido, já que não se pode partir do princípio que os notificandos estão com o computador ligado á espera de uma qualquer notificação, como não pode o notificando por via eletrónica ver-se coartado nos seus direitos relativamente aos notificandos por via postal tradicional!

    9. Deve, assim, aplicar-se analogicamente a lei civil, cuja ratio legis é extensível ao caso dos autos, aplicando ao prazo de defesa das ora requerentes uma dilação de 3 dias;

    10. Da mesma forma, a presunção do n.º 2 do artigo 469.º do CCP deve aplicar-se, também, ás pessoas de direito privado;

    11. A diferença de tratamento imposta por aquela disposição causou grande prejuízo aos recorrentes;

      1) O princípio da igualdade, consagrado no nosso ordenamento jurídico no artigo 13.º da CRP, obriga a que uma diferenciação de tratamento imposta por lei seja sustentada por um fundamento que a justifique;

    12. O artigo 469.º do Código dos Contratos Públicos apresenta uma diferenciação entre as pessoas de direito privado e direito público totalmente desprovida de justificação, sendo certo que as entidades públicas e privadas coincidem nos pontos basilares que relevam para a aplicabilidade das regras relativas ao momento em que se deve considerá-las notificadas;

    13. Não existe qualquer circunstância que diferencie as entidades públicas perante o início da contagem de um prazo, nem qualquer interesse público nesse prazo, nem sequer existe uma situação excecional que justifique a diferenciação imposta pelo artigo 469.º do CCP;

    14. O artigo 469.º do CCP, aplicado pelo tribunal a quo, é inconstitucional, por violação do princípio da igualdade, previsto no artigo 13.º da CRP.

      Nestes termos, deverá ser proferido Acórdão considerando a procedência do presente recurso, sendo revogada a douta decisão recorrida e, por via disso, declarado inconstitucional o n.º 1 do artigo 469.º do CCP, bem como aplicado o n.º 2 do mesmo artigo aos ora recorrentes, com as devidas consequências legais”.

      O Município do Porto contra-alegou, suscitando questões obstativas ao conhecimento do objeto do recurso e defendendo a improcedência do recurso, tendo concluído:

      “1. Através do presente recurso vêm os Recorrentes pedir a este Tribunal que declare inconstitucional o n.° 1 do artigo 469° do Código dos Contratos Públicos e que seja bem assim aplicado o n.° 2 do mesmo artigo.

  3. Não resulta claro, nem do pedido nem de nenhuma alegação, qual exatamente a interpretação dada pelo tribunal à norma cuja inconstitucionalidade vem invocada, parecendo as mais das vezes que o que afinal é ilegal não é a norma, mas sim a decisão propriamente dita.

  4. Segundo o próprio TC, para que uma questão desta natureza se considere suscitada em termos de satisfazer este pressuposto não basta a referência a que um preceito legal ou determinada interpretação dele viola a Constituição, é necessário um módico de argumentação, ónus que não foi cumprido pelas Recorrentes, o que necessariamente impede o conhecimento do presente recurso.

  5. Quanto ao pedido de que seja declarado inconstitucional o n.° 1 do artigo 469° do CCP, constitui jurisprudência uniforme e resulta clara e inequivocamente da lei, que o recurso interposto para o Tribunal Constitucional com fundamento na alínea b) do n.° 1 do artigo 70.°, cabe apenas das decisões que tenham aplicado norma cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo, consubstanciando essa a norma-fundamento da decisão recorrida, de forma tal que se possa dizer que ela constitui “a ‘ratio decidendi’ da decisão.

  6. Ora, a concreta norma cuja inconstitucionalidade as Recorrentes pretendem ver apreciada não é fundamento da decisão proferida, uma vez que o TCA - Norte não careceu, de nenhuma forma, de se fundamentar e suportar na alínea a) do número do artigo 469.° do CCP para corroborar o julgamento efetuado em 1ª instância.

  7. Nem na enunciação do juízo formulado, nem na argumentação que lhe serve de base se deteta ou descobre uma só referência ou alusão à alínea a) do número 1 do artigo 469.° do CCP, mas tão-somente aos artigos 100.º a 103.° do CPTA e a várias alíneas do artigo 279.° do Código Civil.

  8. Para além de que a data da notificação foi expressamente reconhecida pelas Recorrentes, pelo que foi a circunstância e fundamento de facto de as Recorrentes reconhecerem e confessarem terem tomado conhecimento do ato administrativo em determinada data e não o preceito do número 1 do artigo 469.° do CCP, que traduziram a “ratio decidendi” da decisão do TAF do Porto e do TCAN.

  9. Impõe-se, quanto a este pedido, a inadmissibilidade do recurso ora interposto pelas Recorrentes para o Tribunal Constitucional.

  10. Também o pedido de que seja aplicado o n. ° 2 do artigo 469°...

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