Decisões Sumárias nº 77/08 de Tribunal Constitucional (Port, 20 de Fevereiro de 2008

Magistrado ResponsávelCons. Ana Guerra Martins
Data da Resolução20 de Fevereiro de 2008
EmissorTribunal Constitucional (Port

DECISÃO SUMÁRIA Nº 77/2008

Processo n.º 78/08

  1. Secção

Relatora: Conselheira Ana Guerra Martins

I – RELATÓRIO

  1. Nos presentes autos, em que são recorrentes o Ministério Público e a Caixa Geral de Aposentações e recorrido A., foram interpostos recursos, respectivamente, em 28 de Novembro de 2007 (fls. 158) e em 04 de Dezembro de 2007 (fls. 163), ao abrigo do artigo 280º, n.º 1, alínea a) da CRP e do artigo 70º, n.º 1, alínea a) da LTC, do acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, que confirmou as decisões anteriormente proferidas pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, concluindo “pela inconstitucionalidade material das normas vertidas no n.º 6 do artigo 01º e do art. 02º da Lei n.º 01/04 quando entendidas no sentido de que não é aplicável o regime do DL n.º 116/85 aos processos que se iniciaram antes de 31/12/2003 pelo simples facto de não terem dado entrada na CGA até à data da entrada em vigor daquela Lei, por violação conjugada do disposto nos arts. 02º e 266º da CRP [princípios da protecção da confiança e da segurança jurídica inerentes ao princípio do Estado de Direito]” (fls. 150).

    Cumpre, então, apreciar e decidir.

    II – FUNDAMENTAÇÃO

  2. Sempre que for confrontado com questão que possa ser qualificada como “simples”, o Relator pode proferir decisão sumária, conhecendo desde logo de fundo sobre o objecto do recurso, conforme resulta do n.º 1 do artigo 78º-A da LTC.

  3. Como questão prévia, impõe-se referir que, apesar de a recorrente Caixa Geral de Aposentações identificar a norma constante do n.º 8 do artigo 1º da Lei n.º 1/2004, de 15 de Janeiro, como desaplicada pela decisão recorrida – ao contrário do que foi feito pelo Ministério Público –, da mera leitura da mesma (cfr. fls. 150), resulta que aquela apenas desaplicou as normas constantes do n.º 6 do artigo 1º e do artigo 2º do mencionado diploma legal. Como tal, por força do artigo 79º-C da LTC, este Tribunal apenas pode conhecer da questão relativa à inconstitucionalidade das normas constantes do n.º 6 do artigo 1º e do artigo 2º da Lei n.º 1/2004, de 15 de Janeiro.

  4. Sucede que a precisa questão de inconstitucionalidade normativa suscitada nos presentes autos foi, muito recentemente (em 19 de Dezembro de 2007), alvo de acórdão proferido, por unanimidade, por esta 3ª Secção do Tribunal Constitucional, proposto, aliás, pela ora Relatora. Acresce que, naqueles autos como nestes, a decisão de desaplicação daquelas normas foi determinada pelo Tribunal Central Administrativo Norte, confirmando decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, sendo a fundamentação das decisões recorridas absolutamente equivalente.

    Deste modo, pré-existindo jurisprudência deste Tribunal, mais não resta do que reiterar o Acórdão n.º 615/2007, da 3ª Secção, proferido em 19 de Dezembro de 2007 (cfr. in http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/):

    “4. Nos presentes autos, discute-se a constitucionalidade das seguintes normas, constantes da Lei n.º 1/2004, de 15 de Janeiro:

    “Artigo 1º

    Caixa Geral de Aposentações

    (…)

    6 – O disposto nos números anteriores não se aplica aos subscritores da Caixa Geral de Aposentações cujos processos de aposentação sejam enviados a essa Caixa, pelos respectivos serviços ou entidades, até à data de entrada em vigor deste diploma, desde que os interessados reúnam, nessa data, as condições legalmente exigidas para a concessão da aposentação, incluindo aqueles cuja aposentação depende da incapacidade dos interessados e esta venha a ser declarada pela competente junta médica após aquela data”.

    Artigo 2º

    Entrada em vigor

    A presente lei entra em vigor no dia 1 de Janeiro de 2004.”

    Através do n.º 3 do artigo 1º da Lei n.º 1/2004, procedeu-se à revogação do Decreto-Lei n.º 116/85, de 19 de Abril, que, entre outras, dispunha que:

    “Artigo 1º

    “1 – Os funcionários e agentes da administração central, regional e local, institutos públicos que revistam a natureza de serviços personalizados ou de fundos públicos e organismos de coordenação económica, seja qual for a carreira ou categoria em que se integrem, poderão aposentar-se, com direito à pensão completa, independentemente de apresentação a junta médica e desde que não haja prejuízo para o serviço, qualquer que seja a sua idade, quando reúnam 36 anos de serviço.

    (…)

    Artigo 3º

    1 – Os requerimentos solicitando a aposentação nos termos do n.º 1 do artigo 1º devem dar entrada nos departamentos onde os funcionários e agentes prestam serviço, acompanhados dos necessários documentos comprovativos do tempo de serviço prestado.

    (…).”

    A referida Lei n.º 1/2004 resultou do Projecto-Lei n.º 362/IX/2ª, que deu entrada na Mesa da Assembleia da República em 07 de Outubro de 2003 (cfr. informação sobre o procedimento legislativo, disponível no sítio electrónico da Assembleia da República, in http://www3.parlamento.pt/PLC/Iniciativa.aspx?ID_Ini=19863). O referido Projecto-Lei só foi publicado em separata ao “Diário da Assembleia da República”, em 28 de Outubro de 2003 (Separata n.º 50/IX/2ª), tendo-se iniciado um procedimento de consulta pública que se prolongou desde aquela data até 26 de Novembro de 2003.

    O Projecto-Lei n.º 362/IX/2ª foi votado na generalidade, na especialidade e em votação final global, respectivamente, em 27 de Novembro, 03 de Dezembro e 04 de Dezembro de 2003. Por sua vez, o Decreto n.º 142/IX, que viria dar lugar à Lei n.º 2/2004, foi apenas promulgado e referendado em 30 de Dezembro de 2003. De acordo com a informação disponibilizada pelo próprio órgão autor da norma (cfr. in http://www3.parlamento.pt/PLC/Iniciativa.aspx?ID_Ini=19863), o decreto apenas foi enviado para publicação em 08 de Janeiro de 2004.

    5. Encontra-se provado em primeira instância (cfr. fls. 75 e 76) que o associado do recorrido, CARLOS MANUEL NEVES DOS SANTOS, requereu, em 11 de Novembro de 2003, ao Presidente da Câmara Municipal da Figueira da Foz que enviasse o seu pedido de aposentação à ora recorrente, ao abrigo “do n.º 1 do art.º 1º do D.L. n.º 116/85, de 16 de Abril, conjugado com o Decreto-Lei n.º 241/89, de 3 de Agosto (Estatuto Social do Bombeiro)”. Ficou igualmente provado que o Município da Figueira da Foz enviou o referido pedido de aposentação, em 12 de Janeiro de 2004, através de ofício que apenas foi recebido pela recorrente, em 14 de Janeiro de 2004.

    A Lei n.º 1/2004 entrou em vigor em 01 de Janeiro de 2004, mas apenas foi publicada, na Iª Série do “Diário da República”, em 15 de Janeiro de 2004.

    6. A título prévio – e em benefício da boa decisão da causa – impõe-se confrontar a jurisprudência deste Tribunal, em sede de apreciação da constitucionalidade de mutações do regime jurídico de aposentação de funcionários e agentes da administração pública, com as particularidades próprias do caso ora em apreço.

    Com efeito, este Tribunal tem vindo a afirmar – jurisprudência que ora se reitera e acompanha – que as sucessivas alterações àquele regime jurídico de aposentação, ainda que desfavoráveis aos respectivos interessados, não violam o princípio da segurança jurídica, salvo quando manifestamente desrazoáveis, desproporcionadas e inesperadas:

    “ «Como se escreveu no Acórdão n.º 287/90 (publicado no Diário da República, I Série, de 20 de Fevereiro de 1991):

    “Nesta matéria, a jurisprudência constante deste Tribunal tem-se pronunciado no sentido de que ‘apenas uma retroactividade intolerável, que afecte de forma inadmissível e arbitrária os direitos e expectativas legitimamente fundados dos cidadãos, viola o princípio da protecção da confiança, ínsito na ideia de Estado de direito democrático (cfr. o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 11/83, de 12 de Outubro de 1982, Acórdãos do Tribunal Constitucional, 1º vol., pp. 11 e segs.; no mesmo sentido se havia já pronunciado a Comissão Constitucional, no Acórdão n.º 463, de 13 de Janeiro de 1983, publicado no Apêndice ao Diário da República de 23 de Agosto de 1983, p. 133 e no Boletim do Ministério da Justiça, n. 314, p. 141, e se continuou a pronunciar o Tribunal Constitucional, designadamente através dos Acórdãos nºs. 17/84 e 86/84, publicados nos 2º e 4º vols. dos Acórdãos do Tribunal...

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