Decisões Sumárias nº 148/08 de Tribunal Constitucional (Port, 11 de Março de 2008

Magistrado ResponsávelCons. Ana Guerra Martins
Data da Resolução11 de Março de 2008
EmissorTribunal Constitucional (Port

DECISÃO SUMÁRIA Nº 148/2008

Processo n.º 158/08

  1. Secção

Relatora: Conselheira Ana Guerra Martins

I – RELATÓRIO

1. Nos presentes autos, em que é recorrente a Caixa Geral de Aposentações e recorrido A., foi interposto recurso, respectivamente, em 28 de Dezembro de 2007 (fls. 209), ao abrigo do artigo 280º, n.º 1, alínea a) da CRP e do artigo 70º, n.º 1, alínea a) da LTC, do acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, que revogou a decisões anteriormente proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, que havia julgado improcedente pedido de condenação da ora recorrente à prática de acto administrativo devido, concluindo “pela inconstitucionalidade material das normas vertidas no n.º 6 do artigo 01º e do art. 02º da Lei n.º 01/04 quando entendidas no sentido de que não é aplicável o regime do DL n.º 116/85 aos processos que se iniciaram antes de 31/12/2003 pelo simples facto de não terem dado entrada na CGA até à data da entrada em vigor daquela Lei, por violação conjugada do disposto nos arts. 02º e 266º da CRP - princípios da protecção da confiança e da segurança jurídica inerentes ao princípio do Estado de Direito” (fls. 198), mediante remissão para decisão anteriormente proferida no âmbito do Proc. 1027/04.

Cumpre, então, apreciar e decidir.

II – FUNDAMENTAÇÃO

2. Sempre que for confrontado com questão que possa ser qualificada como “simples”, o Relator pode proferir decisão sumária, conhecendo desde logo de fundo sobre o objecto do recurso, conforme resulta do n.º 1 do artigo 78º-A da LTC.

3. Sucede que a precisa questão de inconstitucionalidade normativa suscitada nos presentes autos foi, muito recentemente – em 19 de Dezembro de 2007 –, alvo de acórdão proferido por esta Secção do Tribunal Constitucional, proposto, aliás, pela presente Relatora. Acresce que a questão ora em apreço equivale integralmente à que foi apreciada naqueles autos, ou seja, a inconstitucionalidade de determinada interpretação normativa das normas resultantes do n.º 6 do artigo 1º e do artigo 2º da Lei n.º 1/2004, de 15 de Janeiro. Além disso, naqueles autos como nestes, a decisão de desaplicação daquelas normas foi determinada pelo Tribunal Central Administrativo Norte, sendo a fundamentação das decisões recorridas absolutamente equivalente.

Deste modo, pré-existindo jurisprudência deste Tribunal e Secção, relatada pela mesma Relatora dos presentes autos, mais não resta do que reiterar o que já se julgou no âmbito do Proc. n.º 385/07, que deu lugar ao Acórdão n.º 615/2007, já mencionado (cfr. in http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/):

“4. Nos presentes autos, discute-se a constitucionalidade das seguintes normas, constantes da Lei n.º 1/2004, de 15 de Janeiro:

“Artigo 1º

Caixa Geral de Aposentações

(…)

6 – O disposto nos números anteriores não se aplica aos subscritores da Caixa Geral de Aposentações cujos processos de aposentação sejam enviados a essa Caixa, pelos respectivos serviços ou entidades, até à data de entrada em vigor deste diploma, desde que os interessados reúnam, nessa data, as condições legalmente exigidas para a concessão da aposentação, incluindo aqueles cuja aposentação depende da incapacidade dos interessados e esta venha a ser declarada pela competente junta médica após aquela data”.

Artigo 2º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia 1 de Janeiro de 2004.”

Através do n.º 3 do artigo 1º da Lei n.º 1/2004, procedeu-se à revogação do Decreto-Lei n.º 116/85, de 19 de Abril, que, entre outras, dispunha que:

“Artigo 1º

“1 – Os funcionários e agentes da administração central, regional e local, institutos públicos que revistam a natureza de serviços personalizados ou de fundos públicos e organismos de coordenação económica, seja qual for a carreira ou categoria em que se integrem, poderão aposentar-se, com direito à pensão completa, independentemente de apresentação a junta médica e desde que não haja prejuízo para o serviço, qualquer que seja a sua idade, quando reúnam 36 anos de serviço.

(…)

Artigo 3º

1 – Os requerimentos solicitando a aposentação nos termos do n.º 1 do artigo 1º devem dar entrada nos departamentos onde os funcionários e agentes prestam serviço, acompanhados dos necessários documentos comprovativos do tempo de serviço prestado.

(…).”

A referida Lei n.º 1/2004 resultou do Projecto-Lei n.º 362/IX/2ª, que deu entrada na Mesa da Assembleia da República em 07 de Outubro de 2003 (cfr. informação sobre o procedimento legislativo, disponível no sítio electrónico da Assembleia da República, in http://www3.parlamento.pt/PLC/Iniciativa.aspx?ID_Ini=19863). O referido Projecto-Lei só foi publicado em separata ao “Diário da Assembleia da República”, em 28 de Outubro de 2003 (Separata n.º 50/IX/2ª), tendo-se iniciado um procedimento de consulta pública que se prolongou desde aquela data até 26 de Novembro de 2003.

O Projecto-Lei n.º 362/IX/2ª foi votado na generalidade, na especialidade e em votação final global, respectivamente, em 27 de Novembro, 03 de Dezembro e 04 de Dezembro de 2003. Por sua vez, o Decreto n.º 142/IX, que viria dar lugar à Lei n.º 2/2004, foi apenas promulgado e referendado em 30 de Dezembro de 2003. De acordo com a informação disponibilizada pelo próprio órgão autor da norma (cfr. in http://www3.parlamento.pt/PLC/Iniciativa.aspx?ID_Ini=19863), o decreto apenas foi enviado para publicação em 08 de Janeiro de 2004.

5. Encontra-se provado em primeira instância (cfr. fls. 75 e 76) que o associado do recorrido, CARLOS MANUEL NEVES DOS SANTOS, requereu, em 11 de Novembro de 2003, ao Presidente da Câmara Municipal da Figueira da Foz que enviasse o seu pedido de aposentação à ora recorrente, ao abrigo “do n.º 1 do art.º 1º do D.L. n.º 116/85, de 16 de Abril, conjugado com o Decreto-Lei n.º 241/89, de 3 de Agosto (Estatuto Social do Bombeiro)”. Ficou igualmente provado que o Município da Figueira da Foz enviou o referido pedido de aposentação, em 12 de Janeiro de 2004, através de ofício que apenas foi recebido pela recorrente, em 14 de Janeiro de 2004.

A Lei n.º 1/2004 entrou em vigor em 01 de Janeiro de 2004, mas apenas foi publicada, na Iª Série do “Diário da República”, em 15 de Janeiro de 2004.

6. A título prévio – e em benefício da boa decisão da causa – impõe-se confrontar a jurisprudência deste Tribunal, em sede de apreciação da constitucionalidade de mutações do regime jurídico de aposentação de funcionários e agentes da administração pública, com as particularidades próprias do caso ora em apreço.

Com efeito, este Tribunal tem vindo a afirmar – jurisprudência que ora se reitera e acompanha – que as sucessivas alterações àquele regime jurídico de aposentação, ainda que desfavoráveis aos respectivos interessados, não violam o princípio da segurança jurídica, salvo quando manifestamente desrazoáveis, desproporcionadas e inesperadas:

“«Como se escreveu no Acórdão n.º 287/90 (publicado no Diário da República, I Série, de 20 de Fevereiro de 1991):

“Nesta matéria, a jurisprudência constante deste Tribunal tem-se pronunciado no sentido de que ‘apenas uma retroactividade intolerável, que afecte de forma inadmissível e arbitrária os direitos e expectativas legitimamente fundados dos cidadãos, viola o princípio da protecção da confiança, ínsito na ideia de Estado de direito democrático (cfr. o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 11/83, de 12 de Outubro de 1982, Acórdãos do Tribunal Constitucional, 1º vol., pp. 11 e segs.; no mesmo sentido se havia já pronunciado a Comissão Constitucional, no Acórdão n.º 463, de 13 de Janeiro de 1983, publicado no Apêndice ao Diário da República de 23 de Agosto de 1983, p. 133 e no Boletim do Ministério da Justiça, n. 314, p. 141, e se continuou a pronunciar o Tribunal Constitucional, designadamente através dos Acórdãos nºs. 17/84 e 86/84, publicados nos 2º e 4º vols. dos Acórdãos do Tribunal Constitucional, a pp. 375 e segs. e 81 e segs., respectivamente).”

E no mesmo Acórdão n.º 287/90, transcrito depois no Acórdão n.º 285/92, publicado no Diário da República, I Série-A, de 17 de Agosto de 1992, salientou-se que, depois de se apurar se foram afectadas expectativas legitimamente...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT