Acórdão nº 240/14 de Tribunal Constitucional (Port, 06 de Março de 2014

Magistrado ResponsávelCons. Ana Guerra Martins
Data da Resolução06 de Março de 2014
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 240/2014

Processo n.º 321/2013

  1. Secção

Relator: Conselheira Ana Guerra Martins

Acordam, na 2ª Secção, do Tribunal Constitucional

  1. Relatório

  1. Nos presentes autos, em que é recorrente A. e recorrido o Ministério Público, foi interposto recurso, em 11 de abril de 2013 (fls. 213 e 214), ao abrigo da alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional (LTC), do despacho do Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, proferido em 01 de abril de 2013 (fls. 207 e 210), que indeferiu reclamação de despacho do Juiz-Relator junto da 1ª Secção do Tribunal da Relação do Porto, proferido em 14 de novembro de 2012 (fls. 202), que não admitiu recurso ordinário interposto para aquele Tribunal.

    O recorrente pretende que seja apreciada a norma extraída da conjugação dos artigos 400º, n.º 1, alínea f), e 432º, n.º 1, alínea b), ambos do Código de Processo Penal (CPP), quando interpretada no sentido de que “[n]ão é admissível recurso de acórdãos condenatórios proferidos, em recursos, pelas Relações, que confirmem decisão de primeira instância e apliquem pena de prisão não superior a 8 anos, mesmo que o recurso tenha como fundamento os vícios ínsitos no n.º 2 do artigo 410.º, do CPP, e que estes defluam da própria decisão da Relação” (fls. 213).

  2. Notificado para o efeito, o recorrente proferiu as seguintes alegações, das quais se extraem as seguintes conclusões:

    1. O direito a recorrer entronca no direito de defesa, tendo a Constituição, na sua atual redação (a partir da Lei Constitucional n.º 1/97, de 20 de setembro), consagrado expressamente, entre as garantias de defesa do arguido, o direito ao recurso." 2

    2. O recorrente entende que o seu direito ao recurso foi ilegalmente restringido, porquanto, independentemente de se tratar (ou não) de uma decisão que, na generalidade, confirma a decisão da 1ª Instância, não se poderá simplesmente olvidar que do seu texto resulta, ex novo, uma manifesta desconformidade com o ordenamento jurídico (no caso, um erro notório na apreciação da prova), que lhe é prejudicial.

    3. Dito de outro modo: tratando-se de um dos vícios elencados no n.º 2 do artigo 410.º do CPP, será incontroversa a impossibilidade de tal questão já ter sido objeto de apreciação por um Tribunal, na medida em que, conforme dispõe a aludida disposição legal, o vício tem forçosamente de decorrer do texto da decisão que se acaba de proferir.

    4. Face ao exposto, resulta claro que, na circunstância de estarmos perante uma decisão que, mesmo proferida em recurso, enferme de um dos vícios previstos no artigo 410.º, n.º 2, do CPP, tal vício consubstanciará, de per si, fundamento de recurso para o STJ, sob pena de se ver violado o direito constitucional ao recurso, contido no n.º 1 do artigo 32.º da CRP.

    5. Na verdade, e caso assim não se entendesse, estar-se-ia a permitir que uma decisão materialmente injusta e formalmente ilegal se sedimentasse na ordem jurídica, sem que estivesse previsto qualquer mecanismo legal de controlo por uma instância superior.

    6. Porquanto, a interpretação do Tribunal da Relação do Porto, corroborada pelo Supremo Tribunal de Justiça, do artigo 400.º, n.º 1, alínea f) conjugada com a al. b), do n.º 1 do artigo 432.º do Código do Processo Penal, no sentido de que:

    • Não é admissível recurso de acórdãos condenatórios proferidos, em recurso, pelas Relações, que confirmem decisão de primeira instância e apliquem pena de prisão não superior a 8 anos, mesmo que o recurso tenha como fundamento os vícios ínsitos no n. º 2 do artigo 410.º, do CPP, e que estes defluam da própria decisão da Relação.

    Sempre será inconstitucional, por violação do direito ao recurso, consagrado constitucionalmente no artigo 32.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa.

    (fls. 238 e 239)

  3. Notificado para o efeito, o Ministério Público produziu as seguintes contra-alegações, que ora se sintetizam:

    1. Delimitação do objeto do recurso

    (…)

    2. Apreciação do mérito do recurso.

    2.1. É vasta a jurisprudência do Tribunal Constitucional sobre o direito ao recurso em processo penal e que é uma das garantias de defesa expressamente consagrada no artigo 32.º, n.º 1, da Constituição.

    O Tribunal entende de maneira uniforme e unânime que não tem que haver um duplo grau de recurso, ou um terceiro grau de jurisdição, para que a exigência constitucional seja cumprida.

    Neste sentido e mais concretamente sobre a norma da alínea f) do n.º 1 do artigo 400.º do CPP, já o Tribunal se pronunciou, naturalmente proferindo sempre juízos negativos de inconstitucionalidade (vg. 645/2009, 277/2010, 308/2010).

    Também foram apreciadas dimensões específicas daquela norma.

    Assim, por exemplo, o Acórdão n.º 424/2009, não julgou inconstitucional a norma do artigo 400.º alíneas e) e f), conjugada com a norma do artigo 432.º n.º 1 alínea c) do CPP, na redação emergente da Lei n.º 48/2007, de 29 de agosto, quando interpretada no sentido de que não é admissível recurso para o Supremo Tribunal de Justiça de acórdão da Relação que, revogando a suspensão da execução da pena decidida em 1.ª instância, aplica ao arguido pena não superior a 5 anos de prisão efetiva.

    Por sua vez o Acórdão n.º 385/2011, não julgou inconstitucional a norma do artigo 400.º, n.º 1, alínea f), do Código de Processo Penal, interpretada no sentido de ser irrecorrível uma decisão do Tribunal da Relação que, apesar de ter confirmado a decisão de 1.ª instância em pena não superior a 8 anos, se pronunciou pela primeira vez sobre um facto que a 1.ª instância não havia apreciado.

    Também o Acórdão n.º 659/2011, não julgou inconstitucional a norma do artigo 400.º, n.º 1, alínea f), do Código de Processo Penal, interpretada no sentido de não ser admissível o recurso de acórdão condenatório proferido, em recurso, pela Relação, que confirme a decisão de 1.ª instância e aplique pena de prisão não superior a 8 anos, mesmo no caso de terem sido arguidas nulidades de tal acórdão.

    2.2. Vejamos agora a especificidade do caso dos autos.

    A Relação, apreciando um recurso interposto pelo arguido, detetou no acórdão proferido em 1.ª instância o vício previsto no artigo 410.º, n.º 2, alínea b), do CPP.

    Note-se que esta questão não tinha sido expressamente invocada pelo recorrente no recurso, mas apenas referida por ele na resposta apresentada ao parecer emitido pelo Ministério Público na Relação.

    Diz-se a esse respeito no...

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