Acórdão nº 355/09 de Tribunal Constitucional (Port, 08 de Julho de 2009

Magistrado ResponsávelCons. Jo
Data da Resolução08 de Julho de 2009
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 355/2009

Processo n.º 218/09

  1. Secção

Relator: Conselheiro João Cura Mariano

Acordam na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional

Relatório

No processo n.º 4066/07.4TBCSC – B, do Tribunal de Família e Menores do Tribunal de Cascais, em 2-2-2009, foi proferido o seguinte despacho:

“Já tivemos oportunidade de referir a nossa opinião acerca da utilização da aplicação informática Citius no que diz respeito aos Magistrados Judiciais seguindo, em anexo, essa nossa exposição, da qual se pode ler que entendemos que a tramitação dos processos através do Citius não pode ser imposta aos Juízes, e porque consideramos que o Citius é ilegal e insegura não a aplicaremos.

A questão que ora nos é suscitada tem a ver com a utilização do Citius pelos senhores advogados.

A portaria nº 114/2008 de 06-02, alterada pelas portarias nºs 457/2008 de 20-06 e 1538/2008 de 30-12 impõe aos senhores advogados, tal como faz aos Juízes, a utilização da aplicação informática Citius.

Em nosso modesto entendimento tal imposição é também inconstitucional uma vez que bule directamente com o disposto nos artºs 20ºe 13º da Constituição da República Portuguesa (CRP).

Vejamos.

O artº 20º da CRP visa assegurar o acesso dos cidadãos à justiça e à resolução das suas causas por um órgão especificamente destinado a tal: os Tribunais.

Esse acesso não pode ser, de forma alguma, limitado nem sequer por motivos económicos sendo que se trata de um direito fundamental que, por isso mesmo, beneficia de uma protecção constitucional directa – o que já não sucede com as normas constitucionais programáticas – e é exequível obrigando o Estado a assegurar esse acesso.

Ora, ao obrigar os senhores advogados a utilizarem unicamente uma aplicação informática da envergadura do Citius para o envio das peças processuais e todos os requerimentos – que, como já referimos não oferece qualquer segurança permitindo ao poder político um acesso directo ao que se passa em cada processo – sem lhes permitir o uso de outros meios, tais como o fax, o correio electrónico ou simplesmente os correios normais, está-se a coarctar, na verdade, a limitar o acesso à justiça uma vez que não se pode impor que cada advogado tenha um computador, acesso à internet e que seja obrigado a ceder a sua assinatura para que a mesma passe a ser electrónica face aos graves perigos que tal cedência implica.

Aliás, sendo a assinatura pessoal e intransmissível, estando tutelada pelos direitos da personalidade, nomeadamente pelo artº 72º do Código Civil (CC), como se pode obrigar um cidadão, advogado ou não, a ceder contra a sua vontade ou com reserva a sua assinatura-

E perguntamos quando é que os faxes foram abolidos-

Qual a lei ou decreto que acabou com a actividade dos CTT’s-

Não pode um advogado enviar uma peça manuscrita ao tribunal- Porquê-

E se a luz falha e o advogado não consegue aceder em tempo útil ao Citius correndo o risco de não poder cumprir com o prazo e ver precludida a possibilidade de praticar o acto-

Quem é que aí responde perante o respectivo cliente que mandatou esse advogado-

E quem é que paga a multa do artº 145º CPC nas situações em que o advogado, por falta de possibilidade técnica porque o computador falhou, porque as linhas da net estão sobrelotadas ou porque perdeu o cartão que lhe dá acesso ao Citius ou porque este não é correctamente lido pelo sistema, não consegue cumprir um prazo legal enviando a peça ou requerimento já fora de tal prazo-

Não se pode, em nosso entender, impor um único meio de enviar peças ou requerimentos processuais, quando na prática existem tantos outros, sob pena de se limitar tremendamente o exercício de um direito fundamental cuja tutela não admite essa limitação.

E os cidadãos comuns que recorrem ao Tribunal sem a necessidade de constituírem mandatários como acontece na grande maioria das acções que tramitamos neste Tribunal de Família e Menores, também eles, alguns dos quais analfabetos, são obrigados a possuir um computador-

E são obrigados a ter gastos com a internet quando em tantas situações estamos a lidar com pessoas que estão abaixo do limiar da pobreza e os que não estão mal conseguem alimentar os filhos quanto mais pagar uma conta de internet-

Mas se se admite que as portarias em apreço não abrangem o cidadão comum, como parece...

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