Acórdão nº 28/07 de Tribunal Constitucional (Port, 17 de Janeiro de 2007

Magistrado ResponsávelCons. Mota Pinto
Data da Resolução17 de Janeiro de 2007
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 28/2007

Processo n.º 893/05

  1. Secção

Relator: Conselheiro Paulo Mota Pinto

(Conselheira Maria Fernanda Palma)

Acordam na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional:

  1. Relatório

    AUTONUM 1.O Supremo Tribunal Administrativo, por acórdão de 14 de Junho de 2005, negou provimento ao recurso interposto por A. do acórdão proferido, em 21 de Outubro de 2004, pelo Tribunal Central Administrativo Sul, que, por sua vez, tinha negado provimento ao recurso contencioso de anulação do despacho do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, de 13 de Dezembro de 1999, que lhe aplicou a pena disciplinar de perda de pensão de aposentação pelo período de três anos.

    1. interpôs então recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei do Tribunal Constitucional (LTC), visando a apreciação da constitucionalidade da norma constante do artigo 15.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 24/84, de 16 de Janeiro (Estatuto Disciplinar dos Funcionários e Agentes da Administração Central, Regional e Local), por violação do “Princípio da Dignidade Humana, tal como resulta dos artigos 1.º e 63.º, bem como o direito à Segurança Social dos arts. 59.º e 72.º da Constituição da República Portuguesa”.

    O recorrente suscitou a questão de constitucionalidade logo na interposição do recurso contencioso, mas fê-lo, igualmente, nas alegações de recurso perante o Supremo Tribunal Administrativo, tendo afirmado, em conclusão, o seguinte:

    O n.º 2 do art. 5.° do Estatuto Disciplinar padece de inconstitucionalidade material, pois priva o funcionário aposentado da totalidade da sua pensão mensal por um largo período de tempo, em violação manifesta e intolerável do Direito à Segurança Social e aos Princípios do Estado de Direito Democrático e Social e da Tutela da Dignidade da Pessoa Humana plasmados na Constituição da República Portuguesa!

    O Supremo Tribunal Administrativo abordou a referida questão de constitucionalidade nos seguintes termos:

    Dispõe o art. 15.°, n.º 2, do Estatuto disciplinar: “1. Para os funcionários e agentes aposentados as penas de suspensão ou inactividade serão substituídas pela perda da pensão por igual tempo de multa, e a de multa não poderá exceder o quantitativo correspondente a 20 dias de pensão. 2. A pena de aposentação compulsiva será substituída pela perda do direito à pensão pelo período de 3 anos”.

    O arguido entende que este dispositivo, que foi aplicado no seu caso, é inconstituciona1, por violação do princípio da dignidade humana e do disposto nos artigos 63.°, 59.° e 72.° da Constituição, uma vez que equivale na prática à negação do direito à Segurança Social. Invoca a seu favor um Acórdão do Tribunal constitucional que declarou a inconstitucionalidade com força obrigatória geral do art. 824.°, n.ºs 1, b), e 2, do C.P.Civil, na parte em que permite a penhora até um terço das prestações periódicas, pagas ao executado ... a título de regalia social ou de pensão, cujo valor global não seja superior ao salário mínimo nacional”.

    A argumentação do Tribunal Constitucional foi a seguinte: “Este preceito constitucional, como se escreveu no Acórdão n.° 349/91 (in Acórdãos do Tribunal Constitucional, 19° Vol., pág. 515), ‘poderá, desde logo, ser interpretado como garantindo a todo o cidadão a percepção de uma prestação proveniente do sistema de segurança social que lhe possibilite uma subsistência condigna em todas as situações de doença, velhice ou outras semelhantes. Mas ainda que não possa ver-se garantido no artigo 63.° da Lei Fundamental um direito a um mínimo de sobrevivência, é seguro que este direito há-de extrair-se do princípio da dignidade da pessoa humana condensado no artigo 1.° da Constituição’ (cf. Acórdão nº 232/91, in Acórdãos do Tribunal Constitucional, 19.° vol., pág. 341). Pode, assim, configurar-se um conflito de direitos, entre o direito do credor à realização rápida do pagamento do seu crédito e o direito do devedor e pensionista da Segurança Social ou do Estado à percepção de uma pensão que lhe garanta o mínimo de subsistência condigna com a sua dignidade de pessoa. Existindo o referido conflito, o legislador não pode deixar de garantir a tutela do valor supremo da dignidade da pessoa humana – vector axiológico estrutural da própria Constituição – sacrificando o direito do credor na parte que for absolutamente necessária – e que pode ir até à totalidade desse direito – por forma a não deixar que o pagamento ao credor decorra o aniquilamento da mera subsistência do devedor e pensionista. Essencial se torna, pois, a realização de um balanceamento, da utilização de uma adequada proporção na repartição ‘dos custos do conflito’ (cf. J.C. Vieira de Andrade, Os Direitos Fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976, Almedina, 1987, pág. 233). Em consequência, será constitucionalmente aceitável o sacrifício do direito do credor, se o mesmo for necessário e adequado à garantia do direito à existência do devedor com um mínimo de dignidade (...). É certo que o legislador admite a penhora até 1/3 dos salários auferidos pelo executado, mesmo de salários não superiores ao salário mínimo nacional, tal como admite a penhora de idêntica parte das prestações periódicas recebidas a título de pensão de aposentação ou pensão social, sem qualquer limitação expressa decorrente do respectivo montante. Porém, assim como o salário mínimo nacional contém em si a ideia de que é a remuneração básica estritamente indispensável para satisfazer as necessidades impostas pela sobrevivência digna do trabalhador e que por ter sido concebido como o ‘mínimo dos mínimos’ não pode ser, de todo em todo, reduzido, qualquer que seja o motivo, assim também, uma pensão por invalidez, doença, velhice ou viuvez, cujo montante não seja superior ao salário mínimo nacional não pode deixar de conter em si a ideia de que a sua atribuição corresponde ao montante mínimo considerado necessário para uma subsistência digna do respectivo beneficiário. Em tais hipóteses, o encurtamento através da penhora, mesmo de uma parte dessas pensões – parte essa que em outras circunstâncias seria perfeitamente razoável, como no caso de pensões de valor bem acima do salário mínimo nacional –, constitui um sacrifício excessivo e desproporcionado do direito do devedor e pensionista, na medida em que este vê o seu nível de subsistência básico descer abaixo do mínimo considerado necessário para uma existência com a dignidade humana que a Constituição garante. Nestes termos, considera-se que a norma do artigo 824.°, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil, na medida em que permite a penhora até 1/3 quer de vencimentos ou salários auferidos pelo executado, quando estes...

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