Acórdão nº 68/07 de Tribunal Constitucional (Port, 30 de Janeiro de 2007

Magistrado ResponsávelCons. Mota Pinto
Data da Resolução30 de Janeiro de 2007
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 68/2007

Processo n.º 215/05

  1. Secção

Relator: Conselheiro Paulo Mota Pinto

Acordam na 2.ª secção do Tribunal Constitucional:

  1. Relatório

    AUTONUM 1.Em 25 de Setembro de 2001 foi distribuída ao 5.º Juízo do Tribunal Tributário de 1.ª Instância de Lisboa, remetida pela Câmara Municipal de Lisboa, onde dera entrada, uma impugnação judicial da liquidação e cobrança de tarifa de conservação de esgotos referente a 1999, que fora efectuada por aquela edilidade em relação a dois imóveis da A., SA, sitos em Lisboa.

    Por sentença de 28 de Outubro de 2002 a impugnação foi julgada improcedente, mas a impugnante não se conformou e apresentou recurso para o Supremo Tribunal Administrativo, que encerrava com as seguintes conclusões:

    - A taxa a cobrar por um ente público é um preço autoritariamente estabelecido embora pela sua natureza não sujeito aos mecanismos da oferta e procura, mas cujo valor deve respeitar um critério de reciprocidade face ao valor da contrapartida recebida pelo particular.

    - A tarifa de conservação estabelecida pelo art.º 77.° do Edital n.º 145/60, ao ser calculada com base no valor patrimonial do prédio e não nos efectivos encargos que os Serviços Municipais têm de suportar ao operar as obras de conservação da rede de esgotos, deixa de se configurar como uma taxa para se revelar um verdadeiro imposto.

    - Na redacção do art.º 4.° da Lei Geral Tributária são os impostos, e não as taxas, que “assentam essencialmente na capacidade contributiva, revelada nos termos da Lei através do rendimento ou da sua utilização e do património”.

    - Diversamente, o carácter sinalagmático da taxa exige que, perante a prestação do sujeito passivo, seja contraposta uma prestação individualizada do ente público.

    - Esta prestação do ente público, ao contrário do que vem sendo superiormente entendido, sempre estará na base da quantificação do valor da prestação a pagar pelo sujeito passivo.

    - Devendo o montante da taxa corresponder (na íntegra) ao custo do bem ou serviço integrador da contraprestação do ente público.

    - O tributo liquidado e cobrado a título de taxa de conservação, ao ser calculado sobre o valor patrimonial dos prédios, e não sobre o serviço efectivamente prestado, para além de contrariar a equivalência desejável entre as duas prestações;

    - propicia a ocorrência de situações em que o montante da taxa liquidada será marcadamente superior ao serviço prestado, e,

    - como tal, o tributo liquidado e cobrado pela Câmara Municipal de Lisboa deixa de se configurar como taxa e passa a assumir contornos de verdadeiro imposto, já que, conforme referido supra, ao ser manifestamente superior ao serviço prestado, pressupõe uma certa capacidade contributiva, característica essencial desses mesmos impostos.

    - A receita em causa foi criada por deliberação da Assembleia Municipal de Lisboa, que, ao estabelecer um verdadeiro imposto, é nula.

    - Podemos concluir que o montante liquidado e cobrado pela Câmara Municipal de Lisboa a título de “TAXA DE CONSERVAÇÃO DE ESGOTOS” não é devido, por ser aquele acto de liquidação ilegítimo, dada a ilegalidade e inconstitucionalidade do preceito de que resulta a criação da receita respectiva – as normas da Tabela de Taxas e Outras Receitas Municipais que estabelecem o pagamento da taxa referida – vício que aqui se argui para todos os efeitos.

    - O acto em causa viola frontalmente os princípios da legalidade, da justiça e da proporcionalidade, por exigir à impugnante o pagamento de tributo não previsto na Lei.

    - É assim manifesto que o acto reclamado enferma de ilegalidade por violação de lei, inexistência de facto tributário e violação de princípios constitucionalmente consagrados

    .

    Por acórdão de 18 de Junho de 2003 o Supremo Tribunal Administrativo julgou-se incompetente, por ter entendido haver questões de facto a apreciar no recurso, razão pela qual este veio a ser remetido ao Tribunal Central Administrativo, onde, por acórdão de 9 de Novembro de 2004, lhe foi negado provimento e confirmada a decisão recorrida.

    Pode ler-se neste acórdão do Tribunal Central Administrativo:

    5. Apreciando, pois:

    5.1.1. A tarifa em causa está prevista no Regulamento Geral das Canalizações de Esgotos da Cidade de Lisboa, aprovado por deliberação camarária de 22/7/1960, Edital n.º 145/60, publicado em 24 de Setembro no Diário do Município, com redacção introduzida pelo Edital n.º 76/96 e o montante liquidado resulta da aplicação do coeficiente de 0,25% ao valor patrimonial dos prédios em causa, de acordo com o art.º 77.º do disposto no Edital.

    E, como salienta a recorrente, a apreciação da questão aqui em causa, passa, no essencial, pela delimitação dos conceitos de taxa e de imposto.

    5.1.2. Ora, essa temática encontra-se exaustivamente tratada, doutrinária e jurisprudencialmente, conforme se refere na sentença.

    No sentido de que a taxa de conservação de esgotos é uma taxa e não um imposto e de que o diploma que criou esta taxa não foi tacitamente derrogado pelo diploma legal que criou a Contribuição Autárquica, se firmou já jurisprudência do STA e do T. Constitucional (cfr., entre outros, o Ac. de 25/11/99, Rec. 22593 do STA, e os demais arestos referenciados na sentença recorrida).

    E a questão de saber se ocorre ilegalidade da liquidação com fundamento em que o art.º 76.º do RGCECL, na redacção do Edital n.º 60/90, viola o art.º 11.º do DL n.º 31.674, de 22 de Novembro de 1941, na medida em que tal Regulamento alterou a base de incidência (ou de cálculo) da tarifa de ligação de esgotos estabelecida naquele diploma legal foi também já objecto de decisões da Secção de Contencioso Tributário do STA, nas quais se vem decidindo que as tarifas apenas estão sujeitas ao princípio da legalidade administrativa e não também ao da legalidade tributária (cfr. Acs. do STA, de 24/2/88, Rec. n.º 004778; de 2/5/96, Rec. n.º 018726; de 4/2/98, Rec. n.º 021513; de 10/2/99, Rec. n.º 020062; de 25/11/99, Rec. n.º 022593).

    E tem sido essa, igualmente, a jurisprudência deste TCA (cfr., entre outros, o ac. de 24/4/2001, rec. 1386/98, e o ac. de 25/5/2004, rec. 1115/03).

    5.1.3. Seguindo a argumentação jurídica constante de tais arestos, que já em anteriores decisões também assumimos, nomeadamente da constante do citado Ac. de 4/2/98, há que referir que, segundo o figurino fixado na lei a tarifa de ligação e a tarifa de conservação de esgotos – a que se referem os art.ºs 76.º do RGCECL e 11.º do Decreto-Lei n.º 31.674, de 22/11/1941, incidiam, anteriormente, «sobre o rendimento colectável do prédio que era considerado para efeitos de tributação em contribuição predial, traduzindo-se numa percentagem sobre ele».

    Ora, o rendimento colectável que era relevado para efeitos da cobrança da contribuição predial de certo ano era, segundo o respectivo Código, o que constava da respectiva matriz do ano anterior.

    Tal regra foi mantida no actual CCA: também nele a cobrança é efectuada com base no valor patrimonial constante da matriz em 31 de Dezembro do ano anterior a que ela respeita (art.ºs 13.º, 18.º e 22.º).

    Congruentemente se passavam as coisas com aquelas tarifas (ligação e conservação de esgotos) dado que o rendimento colectável inscrito na respectiva matriz tinha sido erigido em parâmetro da sua quantificação regulamentar, pois a lei impedia que o seu montante excedesse as percentagens de 10% e de 3% desse rendimento, respectivamente, para as taxas de ligação e de conservação (art.ºs 11.º e 12.º do citado DL n.º 31.674).

    O Edital n.º 60/90, de 7/8/90, introduzindo, além do mais, a nova redacção ao art.º 76.º do RGCECL, determinando a aplicação da taxa de 0.25% do valor patrimonial do prédio (em relação à tarifa de conservação), mais não fez do que, ajustando a taxa, harmonizar as normas de incidência do RGCECL, por referência ao novo CCA, estabelecendo a percentagem de 0.25% do valor patrimonial dos prédios, em substituição da taxa de 2% sobre o rendimento colectável.

    Na verdade, como é sabido e como acima já se evidenciou, a reforma fiscal de 1989 aboliu o tipo tributário da contribuição predial e criou, no espaço económico por ele parcialmente ocupado, o tipo tributário da contribuição autárquica.

    Este novo tipo deixou de incidir sobre o rendimento colectável para passar a recair sobre o valor patrimonial (art.ºs 1.º e 7.º do CCA) e o rendimento colectável só foi relevado como simples método transitório de apuramento do novo valor adoptado como critério de incidência objectiva do novo imposto, como modo de apuramento transitório do valor patrimonial do novo imposto enquanto não entrasse em vigor o modo definitivo a ser enunciado por um Código das Avaliações cuja publicação se previa para o ano de 1989, mas que não aconteceu, todavia, até hoje (art.ºs 6.º a 12.º do DL n.º 442-C/88, de 30/11, que aprovou o CCA).

    A partir da entrada em vigor do novo tipo tributário deixou, pois, de poder falar-se com propriedade na existência da figura do rendimento colectável do prédio, já que este apenas constituía elemento de incidência desse tipo tributário e tinha deixado de fazer parte das respectivas matrizes prediais.

    As alterações ao citado artigo do RGCECL visaram, sem dúvida, adaptar os critérios da incidência e da matéria colectável das tarifas de ligação e de conservação de esgotos à estrutura que havia sido seguida pelo legislador do C.C.Autárquica, segundo a perspectiva, que então havia, de que o valor patrimonial apurado com base no rendimento colectável, e consequente relevância jurídica, apenas vigoraria durante o ano de 1989, já que se previa a publicação durante o mesmo ano do Código das Avaliações.

    O diploma instituidor e o regulamento executivo imediatamente posterior rotularam a tarifa aqui em causa (tal como a tarifa de ligação) de taxas de conservação e de ligação de esgotos. Todavia, os diplomas posteriores alteraram-lhes o «nomen» vocabular para tarifas sem que, no entanto, se tenha alterado o respectivo estatuto jurídico. A natureza do tributo continua a mesma: a...

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