Acórdão nº 182/07 de Tribunal Constitucional (Port, 08 de Março de 2007

Magistrado ResponsávelCons. Mota Pinto
Data da Resolução08 de Março de 2007
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 182/2007

Processo n.º 554/06 2.ª Secção

Relator: Conselheiro Paulo Mota Pinto

Acordam na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional:

  1. Relatório

    AUTONUM 1.Nos presentes autos, emergentes de um processo de falência em que era requerida A. L.d.ª e requerente o Ministério Público foi, em 6 de Abril de 2006, proferido acórdão pelo Tribunal da Relação de Évora, que recusou a aplicação das normas dos artigos 31.º, n.º 5, alínea b), da Lei n.º 30-E/2000, de 20 de Dezembro, e 486.º-A, n.º 2, do Código de Processo Civil, na medida em que determinam que, havendo decisão negativa do serviço de segurança social, quanto a pedido de apoio judiciário, o pagamento da taxa de justiça inicial do processo judicial a que se referia esse pedido deve efectuar-se no prazo de 10 dias a contar da notificação dessa decisão, com fundamento na sua inconstitucionalidade. Consequentemente, o referido acórdão concedeu provimento ao recurso interposto pela requerida e revogou o despacho de 2 de Novembro de 2004 do 1.º Juízo do Tribunal Judicial de Almeirim que determinara o pagamento da taxa de justiça inicial antes da decisão do recurso da decisão denegatória de apoio judiciário, e condenara a agravante em multa. Pode ler-se nesse aresto:

    (...)

    A questão central do presente recurso consiste em saber se a agravante procedeu ao pagamento da taxa de justiça inicial fora de prazo e se, consequentemente, está obrigada ao pagamento da multa cominada pelo atraso.

    Os factos a atender para o conhecimento e decisão do objecto do recurso são os que se deixaram anteriormente extractados.

    Vejamos, então:

    A Lei n.º 30-E/2000, de 20 de Dezembro, vigente ao tempo da formulação do pedido de apoio judiciário, atribuiu aos serviços de segurança social a competência para proferir decisão administrativa sobre a matéria, impugnável, no caso de indeferimento, para os tribunais judiciais (art.º 29.°).

    Assim, no que respeita ao réu ou requerido na acção, se não houver ainda decisão administrativa no momento em que deva ser efectuado o pagamento das custas e encargos do processo, fica suspenso o respectivo prazo, até que a decisão seja comunicada ao requerente – art.º 31.º, n.º 5, al. b).

    No entanto, se já houver decisão negativa do serviço de segurança social, o pagamento é devido desde a data da sua comunicação ao requerente do apoio judiciário, de acordo com o disposto no Código das Custas Judiciais, sem prejuízo do posterior reembolso das quantias pagas no caso de procedência do recurso interposto daquela decisão – art.º 31.°, n.º 5, al. b).

    Também o n.º 2 do artigo 486.°-A do CPC determina que o réu proceda ao pagamento da taxa de justiça inicial no prazo de 10 dias a contar da notificação da decisão que indefira o pedido de apoio judiciário.

    Na falta de pagamento, é condenado em multa, de acordo com os n.ºs 3, 4 e 5 do art.º 486.°-A, sendo depois mandada desentranhar a contestação, se persistir na omissão do pagamento (n.º 6).

    No caso em apreciação, a agravante não liquidou a taxa de justiça inicial no prazo do n.º 2 do art.º 486.°-A do CPC, nem a multa, procedendo apenas ao pagamento da taxa de justiça inicial após a decisão do Tribunal que lhe concedeu o beneficio judiciário na modalidade de dispensa parcial (50%) do pagamento da taxa de justiça e demais encargos.

    Por isso, a questão do desentranhamento da oposição, no processo de falência, não chegou a colocar-se.

    No entanto, a conjugação do regime do art.º 31.°, n.º 5, al. b), da Lei n.º 30-E/2000, de 20 de Dezembro, com o regime impositivo do n.º 2 do art.º 486.º-A do CPC, na redacção do Dec.-Lei n.º 324/2003, de 27 de Dezembro, ao tornar exigível o pagamento da taxa de justiça inicial antes de julgado o recurso judicial do despacho administrativo que indeferiu o pedido de apoio judiciário relativo à dispensa total de taxa de justiça e demais encargos, viola de modo intolerável o disposto no artigo 20.º, n.º 1, da Constituição, que enuncia o princípio do acesso ao direito e aos tribunais, impedindo a denegação de justiça por insuficiência de meios económicos.

    O que obsta a que seja aceitável que a decisão dos serviços da segurança social, não definitiva, obrigue o requerente do apoio judiciário, carenciado economicamente para fazer face às despesas do processo, a despender o montante da taxa de justiça inicial nos 10 dias subsequentes à comunicação do indeferimento da decisão administrativa, impossibilitando ou dificultando em grau intolerável o efectivo acesso ao tribunal.

    Por outro lado, o direito ao reembolso das quantias pagas no caso de procedência do recurso interposto da decisão administrativa que denegou o apoio judiciário (art.º 31.º, n.º 5, al. b), parte final), não constitui solução adequada ou, sequer, satisfatória, pois não pode exigir-se a quem invoca insuficiência económica que pague em momento anterior à da apreciação definitiva do recurso da decisão administrativa.

    Assim, acorda-se em desaplicar, por inconstitucionalidade material, as normas dos artigos 31.°, n.º 5, al. b), da Lei n.º 30-E/2000, de 20 de Dezembro, e 486.°-A, n.º 2, do Código de Processo Civil, no segmento em que se determina que, havendo decisão negativa do serviço de segurança social, o pagamento da taxa de justiça inicial deve efectuar-se no prazo de 10 dias a contar da notificação dessa decisão.

    E, em consequência, conceder provimento ao agravo, embora por razões distintas das alegadas, revogando-se o despacho que determinou o pagamento da taxa de justiça inicial antes da decisão do recurso judicial e condenou a agravante em multa.

    Não são devidas custas (art.º 2.°, n.º 1, al. g), do CCJ).

    Dessa decisão interpôs o Ministério Público recurso para o Tribunal Constitucional, previsto na alínea a) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional, para obter a reapreciação da conformidade constitucional daquela norma.

    AUTONUM 2.Admitido o recurso, foi determinada a produção de alegações que o representante do Ministério Público junto do Tribunal Constitucional encerrou desta forma:

    1 – O direito de acesso à justiça e aos tribunais constitui direito fundamental que não pode ser afectado, na sua plenitude e efectividade, por uma situação de carência económica do interessado, cabendo sempre ao tribunal – e não a uma entidade administrativa – a ‘última palavra’ sobre a verificação dos pressupostos do apoio judiciário pretendido pelo requerente que se não conforme com a decisão negativa dos serviços de Segurança Social.

    2 – É inconstitucional, por violação do n.º 1 do artigo 20.º da...

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