Acórdão nº 223/07 de Tribunal Constitucional (Port, 28 de Março de 2007

Magistrado ResponsávelCons. Mota Pinto
Data da Resolução28 de Março de 2007
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 223/2007 Processo n.º 439/06 2.ª Secção

Relator: Conselheiro Paulo Mota Pinto

Acordam, em conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional:

  1. Relatório

    1. O representante do Ministério Público junto do Tribunal Constitucional, vem reclamar para a conferência, ao abrigo do disposto no n.º 3 do artigo 78.º-A da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional, da decisão sumária de 29 de Janeiro de 2007, que decidiu não tomar conhecimento do recurso interposto ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei do Tribunal Constitucional, por não se acharem preenchidos os pressupostos necessários a tanto, designadamente por a decisão recorrida não ter assentado, como ratio decidendi, na recusa de aplicação, pelo tribunal recorrido, de qualquer norma legal com fundamento em inconstitucionalidade. Tal decisão sumária teve o seguinte teor:

    « AUTONUM 1.Notificado do acórdão do Tribunal da Relação do Porto datado de 18 de Abril de 2006, proferido nos autos de recurso de apelação em que é apelante IEP – Instituto de Estradas de Portugal (actual E.P. – Estradas de Portugal, E.P.E.) e são apelados A. e esposa, B., veio a magistrada do Ministério Público junto daquele tribunal interpor o presente recurso de constitucionalidade, ao abrigo do disposto nos artigos 70.º, n.º 1, alínea a), e 72.º, n.ºs 1, alínea a), e 3, da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (Lei do Tribunal Constitucional), dizendo, no que ora interessa, o seguinte:

    «[…]

    1. O douto acórdão recorrido, ao confirmar a sentença de 1ª instância, nos termos do n.º 5 do art. 713.º do CPC,

    2. Maxime, na parte em que, para o cálculo da indemnização devida pela expropriação, se classificaram as parcelas de terreno expropriado como solo apto para a construção, embora considerando-se assente que, à excepção da sub parcela n.º 64.4, a fls. 361, as demais se inserem em área da RAN segundo o PDM em vigor à data da expropriação (al. f), a fls. 361 e facto provado 6.º do douto acórdão recorrido, a fls. 447 dos autos),

    3. Recusou, implicitamente, aplicar as normas dos arts. 23.º e 25.º, n.º 3, do Código das Expropriações, aprovado pela Lei n.º 168/99, de 18/09,

    4. Com o fundamento de que, para fixar a justa indemnização em caso de expropriação, conforme prescreve o art. 62.º, n.º 2, da CRP, em relação aos terrenos integrados em área de RAN, não desafectados e expropriados para neles se construírem vias de comunicação, ter-se-ão de classificar esses terrenos como “solo apto para a construção”, desde que eles reúnam algumas das características previstas no art. 25.º, n.º 2, do Código das Expropriações de 1999, sob pena de, se assim se não procedesse, se violar o princípio da igualdade, consignado no art. 13.º da Constituição porque o art. 26.º, n.º 12, do mesmo Código das Expropriações permite que a indemnização devida pela expropriação de outros solos em situação semelhante — os classificados em PDM em vigor como zona verde, de lazer ou para a instalação de infra-estruturas ou equipamentos públicos — seja calculada de acordo com os critérios legais previstos para o “solo apto para a construção” — cf. 368 e ss.

    5. Todavia, o Tribunal Constitucional, no douto Acórdão n.º 275/2004, in DR, II, n.º 134, de 08/06/2004, decidiu:

    julgar inconstitucional, por violação do princípio da igualdade, consagrado no artigo 13.° da Constituição, as normas contidas no n.° 1 do artigo 23.° e no n.° 1 do artigo 26.° do Código das Expropriações (1999), quando interpretadas no sentido de incluir na classificação de “solo apto para a construção” e, consequentemente, de como tal indemnizar, o solo, integrado na Reserva Agrícola Nacional, expropriado para implantação de vias de comunicação.

    […].»

    O acórdão recorrido tem a seguinte fundamentação de direito:

    A questão fulcral a decidir no presente recurso é a fixação da indemnização devida pelo expropriante aos expropriados.

    Os Ex.m.ºs Peritos nomeados pelo Tribunal e pelos expropriados, cujo critério de avaliação veio a merecer acolhimento na sentença recorrida, entenderam que o valor da parcela expropriada era de € 122.162.07, a que fizeram acrescer, todavia, a quantia de € 14.586,25, a título de benfeitorias, quantia esta que a sentença recorrida considerou não ser devida. Esta parte da sentença não vem impugnada, já que os expropriados não recorreram, pelo que a questão das benfeitorias está definitivamente decidida e não é objecto do presente recurso.

    O que aqui está em causa é saber se a indemnização deve descer para o valor encontrado pelo Ex.m.º Perito do expropriante, fazendo tábua rasa do relatório dos Ex.m.ºs Peritos que subscreveram o laudo maioritário e no qual, como se disse, a sentença recorrida se estribou.

    Ora, tendo em conta os factos dados como provados, não restam dúvidas de que a sentença não merece qualquer reparo.

    O apelante defende que a justa indemnização a pagar ao expropriado deve ser fixada em valor que nada tem a ver com o que foi encontrado por quatro dos cinco peritos nomeados, onde se incluem aqueles que foram nomeados pelo Tribunal.

    Salvo o devido respeito, não acompanhamos o apelante, o qual naturalmente defende a posição do Perito por si indicado.

    A sentença recorrida mostra-se bem fundamentada, em todos os seus aspectos, tendo seguido, como se disse, o laudo dos Senhores Peritos nomeados pelo Tribunal.

    Ora, tem sido jurisprudência uniforme dos nossos tribunais superiores que a indemnização por expropriação se deve fundamentalmente basear, em caso de divergência, nos valores dados nos laudos dos peritos nomeados pelo tribunal, não só pelas melhores garantias de imparcialidade que oferecem, como pela existência de competência técnica que o julgador, ao escolhê-los, lhes reconhece (v., por todos, Ac. desta Relação de 6/06/91, C. J., ano 16.º, 3.º, 252; Ac. da R. de Lisboa de 12/04/94, C. J., ano 19.º, 2.º, 109; e Ac. da R. de Évora de 11/1/77, C. J., 1977, 1º, 185; e Acs. proferidos nos Recursos n.ºs 221/99 e 895/2000, que tiveram o mesmo relator destes autos).

    Assim, sem necessidade de mais longas considerações, a decisão recorrida, bem como os respectivos fundamentos, face aos factos dados como provados, merecem total unanimidade por parte deste Tribunal no sentido da sua bondade, pelo que, nos termos do n.º 5 do art.º 713.º do C. de Proc. Civil, remete-se para os fundamentos da sentença da 1ª instância.

    Improcedem, assim, as conclusões da alegação do apelante, pelo que a douta sentença recorrida tem de se manter.

    O recurso foi admitido por despacho exarado a fl. 445 dos autos.

    Cumpre decidir.

  2. Fundamentos

    AUTONUM 2.O presente recurso foi admitido, mas tal decisão não vincula o Tribunal Constitucional (artigo 76.º, n.º 3, da Lei do Tribunal Constitucional), e, analisados os autos, verifica-se que não se pode tomar conhecimento do recurso, pelo que é caso de proferir decisão sumária, nos termos do artigo 78º-A, n.º 1, da Lei do Tribunal Constitucional.

    AUTONUM 3.Como se sabe, constituem requisitos específicos do recurso interposto ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1, alínea a), da Lei do Tribunal Constitucional, que o Tribunal a quo haja rejeitado, como ratio decidendi da decisão proferida, a aplicação de uma norma ao caso concreto com fundamento em inconstitucionalidade.

    Ora, no caso concreto, não houve recusa de aplicação, pelo tribunal recorrido, de qualquer norma legal com fundamento em inconstitucionalidade, nem expressa nem implicitamente.

    A decisão do Tribunal Judicial de Castelo de Paiva que era objecto do recurso em que foi proferido o acórdão ora recorrido, do Tribunal da Relação do Porto (e para a qual este remeteu), assentou, não em qualquer recusa de aplicação das normas dos artigos 23.º e 25.º, n.º 3, do Código das Expropriações aprovado pela Lei n.º 168/99, de 18 de Setembro (sendo que esta última norma, do artigo 25.º, n.º 3, define, negativamente, os solos considerados aptos para outros fins que não a construção) com base num juízo de inconstitucionalidade de tais normas, mas simplesmente numa subsunção dos factos do caso ao disposto nos artigos 25.º, n.º 2, alínea a), e 26.º, n.º 12, do mesmo diploma.

    Nessa decisão da 1.ª instância considerou-se o seguinte:

    […]

    Assim, não pode deixar de concluir-se que, para efeitos indemnizatórios, é suficiente para classificar um solo como apto para a construção, ainda que integrado em zona de R.A.N. e/ou R.E.N., a circunstância de se verificar a existência de algum dos elementos aludidos nas diversas alíneas do n.º 2 do art. 25.º.

    Em suma: a integração dos solos na R.A.N. ou na R.E.N. não impede que sejam classificados como solos aptos para a construção, desde que se verifiquem os requisitos de que o Cód. das Expropriações faz depender a inclusão nesta categoria.

    Logo, não obsta à qualificação de um terreno como solo apto para a construção a circunstância de a parcela expropriada estar inserida em zona de R.A.N. e/ou de R.E.N., desde que a sua capacidade edificativa resulte quer do facto de estar dotada das infra- estruturas aludidas no art. 25.º, n.º 2, al. a), quer do facto de se destinar a equipamentos públicos, nos termos do n.º 12 do art. 26.º (cfr., entre muitos, os Acs. da RG de 24/09/2003, CJ, XXVIII, 4.º, pág. 274, de 14/04/2004, Apelação nº 530/2004 — 2ª Secção (Relatora : Exma Desembargadora Rosa Tching), e de 11/10/2004, Proc. n.º 890/04 — 2ª Secção (Relatora: Exma Desembargadora Rosa Tching), in www.dgsi.pt; da RP de 06/11/2003, n.º convencional JTRP00035650 (Relator : Exm.º Desembargador Fernando Baptista), in www.dgsi.pt, de 13/11/2003, Proc. n.º 5210/03 (Relator: Exm.º Desembargador Fernando Baptista), de 13/01/2005, nº convencional JTRP00037574 (Relator: Exmº Desembargador Gonçalo Silvano), in www.dgsi.pt, e de 11/04/2005, Proc. n.º 671/05 (Relator: Exm.º Desembargador Pinto Ferreira), e da RC de 16/12/2003, CJ, XXVIII, 5.º, pág. 36, e de 22/06/2004, CJ, XXIX, 3.º, pág. 30; apesar do entendimento contrário recentemente preconizado pelo...

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