Acórdão nº 507/07 de Tribunal Constitucional (Port, 15 de Outubro de 2007

Magistrado ResponsávelCons. Carlos Fernandes Cadilha
Data da Resolução15 de Outubro de 2007
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 507/2007

Processo n.º 702/07

  1. Secção

Relator: Conselheiro Carlos Fernandes Cadilha

Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional

I – Relatório

  1. A empresa A., SA impugnou perante o Supremo Tribunal de Justiça a deliberação da Comissão Nacional de Eleições (CNE) que lhe aplicara uma coima única no valor de onze mil euro pela prática de três contra-ordenações previstas e puníveis pelos artigos 49º e 212º da Lei Orgânica n.º 1/2001, de 14 de Agosto (Lei Eleitoral dos Órgãos das Autarquias Locais - LEOAL), por tratamento jornalístico discriminatório às diversas candidaturas no âmbito de uma eleição para os órgãos das autarquias locais.

    Nas conclusões da sua alegação, a recorrente invocou, na parte que interessa agora considerar, o seguinte:

    (…)

    II – As decisões da CNE são ilegais na medida em que o artigo 212° da LEOAL, em que se baseiam, apenas prevê infracções praticadas em empresas proprietárias de publicação informativa:

    1. E de acordo, tanto com a legislação da comunicação social, como com a legislação eleitoral (incluindo a Lei Eleitoral dos Órgãos das Autarquias Locais -LEOAL), como com o próprio artigo 212° é evidente que por esta expressão se refere imprensa escrita de carácter informativo;

    2. Pelo que não pode a referida disposição ser aplicada a empresas titulares de outros meios de comunicação social (como a rádio e a televisão), sob pena de se cair numa interpretação dos artigos 1° e 2° do RGCO de acordo com a qual é lícito incluir no âmbito de aplicação de uma norma sancionadora em matéria contra-ordenacional casos que estão para além do quadro significativo demarcado pelo seu teor literal, e apenas correspondentes a um rebuscado sentido etimológico, a fim de prover a uma lacuna punitiva, interpretação que viola o art. 29° da Constituição.

      (…)

      1. As decisões da CNE ora impugnadas são ilegais, na medida em que as decisões em matéria de selecção dos municípios objecto de debate e das candidaturas a convidar para os mesmos não traduzem um tratamento não igualitário:

    3. A igualdade não impõe só o tratamento igual do que é igual mas ainda o tratamento desigual, e em moldes de proporcionalidade, de situações desiguais – o que se aplica também à igualdade de tratamento das diversas candidaturas;

    4. É lícita, em função da necessidade de compatibilizar o princípio da igualdade de tratamento com outros valores constitucionais (como os princípios constitucionais da liberdade de imprensa e do direito à informação), a utilização de um critério jornalístico, não só no que respeita à selecção dos municípios objecto de debate, como ainda das candidaturas a convidar para os mesmos;

    5. E é-o especialmente em relação a programas televisivos e radiofónicos cuja natureza não seja estritamente informativa — estão neste caso os debates e entrevistas — que, para a própria CNE «gozam de uma maior liberdade e criatividade na determinação do seu conteúdo».

    6. Nos casos dos autos, não foram tomadas decisões individuais arbitrárias, mas antes assumido um critério jornalístico: o da representatividade das candidaturas nas autarquias a que os debates diziam respeito, medida pelos resultados nas eleições autárquicas anteriores (directamente, pela representação nas assembleias municipais, indirectamente, pela percentagem de votação obtida).

    7. Esse critério não é discriminatório, mas antes imposto pela necessidade de evitar:

    8. Que, pelo elevado número de intervenientes, se impossibilite um diálogo e exposição de posições de cada um deles, de forma minimamente ordenada e elucidativa inutilizando as virtualidades esclarecedoras dos debates e pondo em causa, não só a liberdade de imprensa, como o direito à informação (a informar e – também – a ser informado).

      ii. Uma conflitualidade previsível, o que determina que ele se meça por critérios objectivos indiscutíveis, de maneira a ser transparente e controlável, e se possa manter completamente inalterável em relação a todas as autarquias municipais seleccionadas para a realização de debates.

    9. Que assim é decorre, para além de toda a possível dúvida, do facto de a própria lei, quando colocada perante um problema análogo – o da subvenção a atribuir nos termos da Lei do Financiamento dos Partidos Políticos e das Campanhas Eleitorais (Lei n° 19/2003 de 20 de Junho) — o resolver de forma em tudo semelhante (cfr,. arts. 17°, n°s 3 e 4), em solução perfeitamente compatível com o princípio da igualdade de tratamento das candidaturas.

    10. O entendimento oposto da CNE significa uma violação:

    11. Da liberdade de imprensa e do direito à informação (arts. 37° e 38° da Constituição), e tanto na perspectiva do direito a informar como na do direito a ser informado;

      ii. Do princípio legal (arts. 40° e 49° LEOAL) e constitucional da igualdade (arts. 13° e 113°, n°3, al. b), da Constituição) de tratamento das candidaturas, na medida em que este impõe um «tratamento em moldes de proporcionalidade das situações desiguais» e, designadamente, não só permite como impõe que apenas se dê um tratamento jornalístico semelhante às situações dotadas de «um relevo jornalístico semelhante, atendendo aos diversos factores que para o efeito se tem de considerar)).

      Por acórdão de 6 de Julho de 2006, O Supremo Tribunal de Justiça concedeu parcial provimento ao recurso, diminuindo o montante da coima aplicável para seis mil euro, mas apenas com base em considerações relacionadas com a medida da pena, julgando improcedentes todos os demais fundamentos do recurso.

      Na parte respeitante à suscitada questão do âmbito normativo do artigo 212º da LEOAL, o citado aresto manifestou concordância com o entendimento expresso pela CNE, aduzindo, entre outros considerandos, o seguinte:

      Como se viu, criou-se um dever de imparcialidade aplicável a todas as entidades públicas e privadas, salvas as excepções da própria lei. E afinando-se esse dever, em função da especial natureza dessa entidades, criou-se para todos os órgãos de comunicação social, um especial dever de tratamento jornalístico igualitário para todas as candidaturas, com a já falada excepção das faladas «publicações doutrinárias».

      É assim claro no contexto do art. 49.º que o mesmo considera os órgãos de comunicação social como compostos por «publicações informativas», às quais se aplica o dever que prescreve (n.º 1) e «publicações...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT