Acórdão nº 409/06 de Tribunal Constitucional (Port, 05 de Julho de 2006

Magistrado ResponsávelCons. Vitor Gomes
Data da Resolução05 de Julho de 2006
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 409/06

Processo n.º 60/06

Plenário

Relator: Conselheiro Vítor Gomes

Acordam, em Plenário, no Tribunal Constitucional

1. A Candidatura de Jerónimo de Sousa a Presidente da República, representada por Alexandre Miguel Pereira Araújo, mandatário financeiro dessa candidatura, interpôs recurso, ao abrigo do n.º 3 do artigo 46.º da Lei Orgânica n.º 2/2005, de 10 de Janeiro, da decisão da Entidades das Contas e Financiamentos Políticos (ECFP) de 12 de Janeiro de 2006 que, em procedimento de contra-ordenação, lhe aplicou uma admoestação, por violação do artigo 15.º da referida Lei n.º 2/2005.

Alega que não cometeu a aludida infracção pelo seguinte:

“A. As funções da Entidade das Contas e Financiamentos Políticos, que resultam da sua natureza, são as de coadjuvar tecnicamente o Tribunal Constitucional na apreciação e fiscalização das contas dos partidos político e das campanhas eleitorais para Presidente da República…

  1. A coadjuvação técnica passa por instruir os processos respeitantes às contas dos partidos políticos e das campanhas eleitorais.

  2. E também pela fiscalização da correspondência entre os gastos declarados e as despesas efectivamente realizadas.

  3. E, ainda, pela realização de inspecções e auditorias de qualquer tipo ou natureza e determinados actos, procedimentos e aspectos de gestão financeira das contas dos partidos políticos e das campanhas eleitorais.

  4. As competências da Entidade das Contas e Financiamentos Políticos, previstas na Lei, de instruir os processos respeitantes às contas, de fiscalizar a correspondência entre os gastos declarados e as despesas efectivamente realizadas e de realizar inspecções e auditorias a determinados actos, procedimentos ou aspectos da gestão financeira das contas, são as competências atribuídas pela Lei à ECFP que, claramente, só vigoram após a apresentação e na presença das contas respectivas.

  5. O conteúdo do ofício n.º 526/05, da Entidade das Contas e Financiamentos Políticos é contraditório.

  6. No pedido formulado no ofício n.º 526/05, da ECFP não é invocado qualquer preceito legal.

  7. O pedido formulado no ofício n.º 526/05, da ECFP é extemporâneo por falta de suporte legal.

    1. O pedido de aclaração do conteúdo do ofício 526/05 da Entidade das Contas e Financiamentos Políticos é legítimo.

  8. A candidatura de Jerónimo de Sousa a Presidente da República não violou o artigo 15º, da Lei 02/2005, de 10 de Janeiro.

    Nestes termos, e nos mais que esse Tribunal suprirá, deve dar-se provimento ao recurso, anulando-se a decisão de admoestação aplicada pela Entidade das Contas e Financiamentos Políticos ao Mandatário Financeiro Nacional da Campanha Eleitoral de Jerónimo de Sousa a Presidente da República.”

    2. O Ministério Público entendeu “circunscrever a sua intervenção à tomada de posição no sentido de se lhe afigurar que os autos estão em condições de ser apreciados e decididos pelo Tribunal Constitucional, sem necessidade de produção de prova quanto à matéria de facto, na medida em que apenas estão em causa questões de direito”.

    3. O relator proferiu despacho do seguinte teor:

    “Pode razoavelmente colocar-se a hipótese de não dever tomar-se conhecimento do objecto do recurso, por ilegitimidade do recorrente, tendo presente

    - Que a decisão contenciosamente impugnada consiste numa admoestação que, embora por factos praticados no exercício das funções de mandatário da candidatura de Jerónimo de Sousa a Presidente da República, é pessoalmente dirigida a Alexandre Miguel Pereira Araújo, a quem é imputada a contra-ordenação que, com essa medida, se sanciona;

    - Que o recurso, quer pela expressa identificação no seu intróito, quer pelo teor do respectivo requerimento inicial, não parece poder ser considerado como interposto pelo destinatário da medida, mas pela “Candidatura de Jerónimo de Sousa a Presidente da República”;

    - Que só tem interesse directo em impugnar a admoestação imposta em substituição da coima quem foi considerado infractor e, por isso, sujeito a uma medida de tal natureza.

    Assim, ao abrigo do n.º 3 do artigo 3.º do Código de Processo Civil, determino a notificação do recorrente para se pronunciar, querendo, sobre esta questão, no prazo de 10 dias.”

    A que a recorrente respondeu nos seguintes termos:

    “1. Do auto de notícia datada de 21 de Dezembro, de 2005, que deu origem ao processo de contra-ordenação n.º 1/PR-2006, cuja decisão está na base do recurso em análise nesse Tribunal Constitucional, consta como infractor a Candidatura de Jerónimo de Sousa (doc. N.º 1, que se junta e aqui se dá por inteiramente reproduzido).

    1. Daí a resposta deduzida, nos termos do artigo 50°, do decreto-lei n.º 433/82, de 27 de Outubro, ter sido apresentada pela Candidatura de Jerónimo de Sousa a Presidente da República, embora assinada pelo seu Mandatário Financeiro Nacional, como decorre da Lei.

    2. Por outro lado, na decisão no processo de contra-ordenação, confirmava-se a Candidatura de Jerónimo de Sousa como infractor, e no primeiro parágrafo afirmava-se que a ECFP solicitou “a 5 Candidaturas”, para abaixo, embora sem qualquer relevância para o processo de contra-ordenação, se voltar a referir “Todas as Candidaturas...”.

    3. Ou seja, em todo o processo o alegado infractor era a “Candidatura” e não o Mandatário Financeiro, ou o Candidato, que, como prevê o artigo 47º, da lei n.º 2/2005, apenas são referidos como sujeitos da aplicação concreta de eventual coima, em consequência de decisão de violação da Lei pela entidade que representam.

    4. Acresce que no cabeçalho do recurso, a Candidatura de Jerónimo de Sousa a Presidente a República não se conforma com a admoestação ao seu Mandatário Financeiro Nacional.

    5. Sendo que é este que subscreve o recurso, como resulta da Lei.

    6. Devendo, assim, considerar-se que o Mandatário, ao subscrever o recurso, com ele concorda e o acompanha.

    7. Pelo que deve ser considerado legitimamente interposto o recurso em apreciação, impedindo-se, assim, que uma mera questão de interpretação obvie à apreciação da questão de fundo ínsita no recurso.

    8. Efectivamente, e como o Tribunal Constitucional só aprecia questões concretas, o que se pretende com o recurso é saber se é correcta a interpretação que a ECFP faz do artigo 15° da Lei 2/2005, de 10 de Janeiro que esteve na origem do processo de contra-ordenação instaurado à Candidatura de Jerónimo de Sousa a Presidente da República e que culminou com a aplicação de uma admoestação por incumprimento do referido artigo 15°.

    9. Ou, de outro modo, se a Candidatura de Jerónimo de Sousa a Presidente da República violou a Lei e é legal a instauração do processo de contra-ordenação e, consequentemente, os seus ulteriores termos.

    10. Isto é, o recurso tanto interessa à “Candidatura” que o encabeça, como ao “Mandatário”, que o subscreve.

    11. Pelo que, ambas as entidades têm legitimidade na interposição do recurso.”

    4. Considera-se provada, por documento, a matéria de facto seguinte:

    1. A Entidade das Contas e Financiamentos Políticos remeteu a Mário de Oliveira Nogueira, na qualidade de “Mandatário Financeiro da Candidatura do Sr. Jerónimo de Sousa” [às eleições presidenciais de 2006] o ofício ECFP-526/05, de 6 de Dezembro de 2005, com o seguinte teor:

    “Tem essa candidatura afixado por todo o País cartazes com publicidade às próximas Eleições Presidenciais.

    Referimo-nos aos “out-doors” com “slogans” e outras menções anunciando e publicitando o vosso Candidato.

    Chamamos a vossa atenção para o facto dos custos respectivos, completos e bem discriminados, terem de ser considerados nas Contas da Campanha, tal como se refere nas nossas Recomendações.

    Lembramos que, tal como também aí se refere, os dados relativos aos cartazes e às estruturas onde são colocados, deverão ser comunicados à ECFP até ao dia 23/01/06 (30 dias após o envio do Orçamento de campanha).

    Pretendemos que essa informação seja discriminada do modo seguinte:

    - Apresentação do contrato com o(s) Prestador(es) de Serviços, donde resulte de forma explícita, a dimensão dos suportes utilizados discriminados por tipo de mensagem e acompanhado de suporte fotográfico digital, bem como a sua localização geográfica (Distrito, Concelho, Freguesia + localização).

    No entanto, tendo em vista um controlo mais eficaz por parte desta Entidade, desde já solicitamos, que esta última especificação – nº e localização bem precisa de cada estrutura com cartaz – nos seja remetida imperativamente até dia 15 de Dezembro p.f..”

    b) Por carta de 14 de Dezembro de 2005, a “Candidatura de Jerónimo de Sousa” esclareceu ser Alexandre Miguel Pereira Araújo – que assina a carta nessa qualidade - o mandatário financeiro da candidatura e solicitou a aclaração do último parágrafo do ofício referido na alínea anterior dizendo: “É que, além do termo “imperativamente” ser manifestamente desadequado, a Lei n.º 2/2005 de 10 de Janeiro, que rege essa Entidade, no seu n.º 4, do artigo 16º, estabelece expressamente que “o prazo para o cumprimento do dever de comunicação de acções de campanha eleitoral realizadas e dos meios nelas utilizados termina na data de entrega das respectivas contas”.

    c) Em 21 de Dezembro de 2005, a ECFP instaurou processo de contra-ordenação, com base em auto de notícia do seguinte teor:

    “A 6 de Dezembro de 2005, a Entidade das Contas e Financiamentos Políticos solicitou ao mandatário financeiro da Candidatura de Jerónimo de Sousa a indicação da localização das estruturas que suportam os cartazes de propaganda com vista à eleição do Presidente da República/2006.

    A Candidatura mencionada não satisfez o solicitado pela Entidade das Contas.

    A Candidatura de Jerónimo de Sousa tem sede na Rua Soeiro Pereira Gomes, nº 3, em Lisboa, e o seu mandatário financeiro nacional é Alexandre Miguel Pereira Araújo.

    Dispõe o artigo 15º da Lei 2/2005, de 10 de Janeiro, que “A Entidade pode solicitar a quaisquer entidades, públicas ou privadas, as informações e a colaboração necessárias para o exercício das suas funções.”

    Nos termos do artigo 9º, nº 3, do mesmo diploma...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT