Acórdão nº 563/06 de Tribunal Constitucional (Port, 17 de Outubro de 2006

Magistrado ResponsávelCons. Presidente
Data da Resolução17 de Outubro de 2006
EmissorTribunal Constitucional (Port

Processo nº 1/CCE

ACTA

Aos dezassete dias do mês de Outubro do ano de 2006, achando-se presentes o Excelentíssimo Conselheiro Presidente Artur Joaquim de Faria Maurício e os Ex.mos Conselheiros Gil Manuel Gonçalves Gomes Galvão, Maria João da Silva Baila Madeira Antunes, Vítor Manuel Gonçalves Gomes, Mário José de Araújo Torres, Carlos José Belo Pamplona de Oliveira, Maria Helena Barros de Brito, Maria Fernanda dos Santos Martins Palma Pereira, Rui Manuel Gens de Moura Ramos, Maria dos Prazeres Couceiro Pizarro Beleza, Paulo Cardoso Correia da Mota Pinto, José Manuel de Sepúlveda Bravo Serra e Benjamim Silva Rodrigues, foram trazidos à conferência os presentes autos de apreciação de contas da campanha eleitoral relativa às eleições para a Assembleia da República realizadas em 20 de Fevereiro de 2005.

Após debate e votação, foi ditado pelo Exmo. Presidente o seguinte

ACÓRDÃO N.º 563/06

I - Relatório

  1. A Lei n.º 19/2003, de 20 de Junho, que regula o financiamento dos partidos políticos e das campanhas eleitorais, veio substituir a Lei n.º 56/98, de 18 de Agosto (alterada pela Lei n.º 23/2000, de 23 de Agosto, e pela Lei Orgânica n.º 1/2001, de 14 de Agosto).

    Entre as inovações introduzidas pela Lei n.º 19/2003 com repercussões directas no presente processo salientam-se as seguintes:

    a) atribuição de competência ao Tribunal Constitucional para apreciar as contas das campanhas eleitorais (artigo 23.º, n.º 1), em substituição da Comissão Nacional de Eleições;

    b) criação da Entidade das Contas e Financiamentos Políticos (ECFP), com funções de coadjuvação técnica do Tribunal Constitucional na fiscalização das contas dos partidos políticos e das campanhas eleitorais, a quem compete, designadamente, a instrução dos processos que o Tribunal Constitucional aprecia (artigo 24.º, n.ºs 1 e 2).

    O novo regime da fiscalização das contas dos partidos políticos e das campanhas eleitorais foi concretizado pela Lei Orgânica n.º 2/2005, de 10 de Janeiro, estabelecendo este diploma a tramitação processual e a articulação entre as diversas entidades envolvidas nos processos de fiscalização em causa.

    Tanto a Lei n.º 19/2003 como a Lei Orgânica n.º 2/2005 começaram a produzir efeitos em 1 de Janeiro de 2005, sendo de realçar que esta última data de 10 de Janeiro.

    No que toca à tramitação processual e às entidades competentes, o novo regime (artigos 23.º a 33.º da Lei n.º 19/2003 e artigos 35.º a 47.º da Lei Orgânica n.º 2/2005) tem aplicação plena à apreciação e fiscalização das contas da campanha referente às Eleições Legislativas de 20 de Fevereiro de 2005. A regra da aplicação imediata da lei processual penal, contida no artigo 5.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, aplica-se ao presente processo, por estar em causa a apreciação de factos geradores de responsabilidade contra-ordenacional e o Regime Geral das Contra-Ordenações determinar a aplicação subsidiária dos preceitos reguladores do processo criminal (artigo 41.º, n.º 1, do Regime Geral das Contra-Ordenações, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro).

    No que toca ao regime substantivo do financiamento e contas das campanhas eleitorais, o novo regime (artigos 15.º a 22.º da Lei n.º 19/2003) concorre com o regime antigo (artigos 15.º a 21.º da Lei n.º 56/98, na redacção dada pela Lei n.º 23/2000 e pela Lei Orgânica n.º 1/2001). Isto porque, em termos económico-financeiros (percepção de receitas e realização de despesas por parte das candidaturas), a campanha eleitoral referente às Eleições Legislativas de 20 de Fevereiro de 2005 iniciou-se ainda no ano de 2004, ou seja, sob a vigência da Lei n.º 56/98.

    Com efeito, apesar de resultar do artigo 19.º, n.º 1, da Lei n.º 19/2003 que são elegíveis como despesas de campanha as realizadas nos seis meses anteriores ao acto eleitoral respectivo (marcando essa data o início do período de campanha eleitoral, em termos económico-financeiros), essa regra pressupõe que estejam em causa actos eleitorais ordinários e não antecipados.

    Uma vez que as eleições legislativas de 20 de Fevereiro de 2005 foram eleições antecipadas, considera-se, no caso, que o início da campanha, em termos económico-financeiros, coincide com a marcação da data do acto eleitoral pelo Presidente da República (que ocorreu em 22 de Dezembro de 2004, data da publicação do Decreto n.º 100-B/2004).

    A ECFP, no parecer a que se refere o artigo 42.º da Lei Orgânica n.º 2/2005, dá conta de que a maioria dos actos económicos praticados pelas candidaturas, no âmbito da campanha eleitoral, ocorreu já no ano de 2005. Por outro lado, na apresentação das contas (entre 18 de Março e 18 de Junho de 2005), as candidaturas regeram-se pelo disposto na Lei n.º 19/2003 e na Lei Orgânica n.º 2/2005, pois era esta a legislação em vigor à data. Em consonância, também a ECFP orientou o seu trabalho segundo as normas e procedimentos constantes do novo regime.

    Ainda assim, se o Tribunal se deparar com a necessidade de apreciar a responsabilidade contra-ordenacional por factos ocorridos antes de 1 de Janeiro de 2005, terá como parâmetro o regime definido na Lei n.º 56/98 (na redacção dada pela Lei n.º 23/2000 e pela Lei Orgânica n.º 1/2001), a não ser que o regime da Lei n.º 19/2003 seja mais favorável. Trata-se de dar cumprimento às regras de aplicação da lei no tempo previstas no artigo 3.º, n.ºs 1 e 2, do Regime Geral das Contra-Ordenações.

  2. No cumprimento do disposto no artigo 27.º, n.º 1, da Lei n.º 19/2003, de 20 de Junho, relativa ao financiamento dos partidos políticos e das campanhas eleitorais, e do artigo 35.º, n.º 1, da Lei Orgânica n.º 2/2005, de 10 de Janeiro, relativa à organização e funcionamento da Entidade das Contas e Financiamentos Políticos, vieram o Partido Socialista (PS), o Partido Popular (CDS-PP), o Partido Social Democrata (PPD/PSD), o Bloco de Esquerda (BE), o Partido Democrático do Atlântico (PDA), a Coligação Democrática Unitária (CDU), o Partido Comunista dos Trabalhadores Portugueses (PCTP/MRPP), o Partido Nacional Renovador (PNR), o Partido Humanista (PH), a Nova Democracia (PND) e o Partido Operário da Unidade Socialista (POUS) apresentar no Tribunal Constitucional, para apreciação por este, as contas da campanha eleitoral relativa às eleições para a Assembleia da República realizadas em 20 de Fevereiro de 2005.

    Através da consulta do mapa oficial dos resultados das eleições (publicado no Diário da República, n.º 47, I Série-A, de 8 de Março de 2005, e rectificado pela Declaração de rectificação n.º 14/2005, publicada no Diário da República, n.º 55, I Série-A, de 18 de Março de 2005), do qual constam todas as forças políticas candidatas, respectivos resultados e a que círculos eleitorais concorreram, verifica-se ser aquele o conjunto de forças políticas que concorreu às referidas eleições.

    Conclui-se, portanto, que todas as forças políticas concorrentes às Eleições Legislativas de 20 de Fevereiro de 2005 apresentaram no Tribunal Constitucional as contas da respectiva campanha eleitoral, inexistindo quaisquer situações de incumprimento da obrigação de entrega de contas sobre as quais o Tribunal tenha que se pronunciar, nos termos previstos no artigo 40.º da Lei Orgânica n.º 2/2005.

  3. A expressão sintética global dos resultados contabilísticos da campanha eleitoral levada a cabo por cada candidatura, tal como revelada pelos mapas de receitas e despesas que integram ou puderam extrair-se das demonstrações financeiras apresentadas à ECFP, é a seguinte:

    Partido Socialista (PS):

    Receitas € 4.600.000,00

    Despesas € 4.700.000,00

    Saldo negativo € 100.000,00

    Partido Popular (CDS-PP):

    Receitas € 2.200.000,00

    Despesas € 2.200.000,00

    Saldo € 0

    Partido Social Democrata (PPD/PSD):

    Receitas € 3.100.000,00

    Despesas € 4.700.000,00

    Saldo negativo € 1.600.000,00

    Bloco de Esquerda (BE):

    Receitas € 561.594,00

    Despesas € 561.594,00

    Saldo € 0

    Partido Democrático do Atlântico (PDA):

    Receitas € 3,641,50

    Despesas € 3,641,50

    Saldo € 0

    Coligação Democrática Unitária (CDU):

    Receitas € 927.761,00

    Despesas € 843.629,00

    Saldo positivo € 96.201,00

    Partido Comunista dos Trabalhadores Portugueses (PCTP/MRPP):

    Receitas € 6.049,00

    Despesas € 8.485,33

    Saldo negativo € 2.436,33

    Partido Nacional Renovador (PNR):

    Receitas € 1.225,00

    Despesas € 1.225,00

    Saldo € 0

    Partido Humanista (PH):

    Receitas € 795,00

    Despesas € 804,37

    Saldo negativo € 9,37

    Nova Democracia (PND):

    Receitas € 47.147,11

    Despesas € 60.221,44

    Saldo negativo € 13.074,33

    Partido Operário da Unidade Socialista (POUS):

    Receitas € 1.166,85

    Despesas € 1.166,85

    Saldo € 0

  4. Ao abrigo do disposto no artigo 38.º, n.º 1, da Lei Orgânica n.º 2/2005, a ECFP determinou a realização de uma auditoria - de que foram incumbidas as empresas especializadas PriceWaterhouseCoopers e Moore Stephens - às contas da campanha eleitoral em questão, auditoria essa circunscrita, no seu âmbito, objectivos e métodos, aos aspectos relevantes para o exercício da competência legalmente deferida ao Tribunal.

    A realização dessa auditoria permitiu evidenciar situações irregulares em todas as contas apresentadas. Com base nesses resultados, a ECFP elaborou um relatório contendo as questões suscitadas relativamente a cada candidatura, nos termos previstos no artigo 41.º, n.º 1, da Lei Orgânica n.º 2/2005.

    As alterações introduzidas pela Lei n.º 19/2003 e pela Lei Orgânica n.º 2/2005 não se limitam à reorganização das competências e da tramitação processual relativas à apreciação e fiscalização das contas dos partidos políticos e das campanhas eleitorais (das quais já se deu conta no ponto 1.), contemplando também a revisão das regras de financiamento e organização contabilística que os partidos e as candidaturas devem respeitar, com o objectivo fundamental de reforço da transparência das contas em questão.

    Neste contexto, e tendo em conta que é a primeira vez que o Tribunal aprecia a legalidade e a regularidade das contas da campanha eleitoral para a Assembleia da República, cumpre agora concretizar as infracções detectadas no âmbito da análise...

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