Acórdão nº 173/05 de Tribunal Constitucional (Port, 31 de Março de 2005

Magistrado ResponsávelCons. Mota Pinto
Data da Resolução31 de Março de 2005
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃ0 N.º 173/2005 Processo n.º 722/04 2.ª Secção

Relator: Conselheiro Paulo Mota Pinto

Acordam na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional

  1. Relatório AUTONUM 1.Em 17 de Novembro de 2003, A. interpôs recurso para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença do Juiz do Tribunal Tributário de 1ª Instância de Lisboa, datada de 6 de Outubro de 2003, que julgou improcedente a impugnação da liquidação de imposto sobre o rendimento das pessoas singulares (IRS) relativo ao ano de 2001. Nas suas alegações, formulou as seguintes conclusões:

    “. Com a entrada em vigor do Código do IRS, o Legislador criou uma discriminação qualitativa entre alguns tipos de rendimentos, entre eles os rendimentos da Categoria A e da Categoria H;

    . Pretendendo o Legislador, à data, tributar de uma forma mais favorável os rendimentos derivados de pensões;

    . Contudo, apesar de essa ser a intenção do legislador, a verdade é que, pela introdução do n.º 5 do artigo 53.º do Código do IRS, alguns rendimentos de pensões, os abrangidos por esta norma, passaram a ser tributadas de uma forma mais gravosa do que aquela que teria sido pretendido pelo legislador;

    . Desta forma, violam-se alguns dos mais elementares princípios constitucionais do direito fiscal:

    . Assim, é violado o princípio da progressividade do Código do IRS, uma vez que a progressividade deve ser atingida através de taxas progressivas e não pela eliminação da dedução específica;

    . É violado o princípio da capacidade contributiva, já que com a eliminação/redução da dedução específica deixa de se ter em conta o mínimo de encargos necessários à obtenção dos rendimentos do sujeito passivo. Porquê é que não se passa o mesmo na Categoria A ?

    . É, ainda, violado o princípio da igualdade, uma vez que um sujeito passivo com igual capacidade contributiva no activo e na reforma têm uma tributação completamente diferente, sendo tributado mais gravosamente na reforma que no activo, quando era precisamente o contrário que o legislador pretendia;

    . Mais, viola-se o princípio da tributação pelo rendimento líquido, uma vez que nos casos em que existe uma eliminação da dedução específica, a taxa incide directamente sobre o rendimento bruto, tal não foi a intenção do legislador;

    . O único caso em que essa foi a intenção do legislador foi [o d]os rendimentos de capitais, o que se compreende dada a natureza dos mesmos, mas por esse facto, para a maioria desses rendimentos o legislador criou taxas de tributação liberatórias, que nunca, por nunca ser, atingem os 40%;

    . Contudo, um pensionista que pare de ter direito à dedução específica, por aplicação do n.º 5 do artigo 53.º do Código do IRS, vê os seus rendimentos serem sujeitos a uma taxa de tributação de 40%. Onde é que está a discriminação qualitativa que o legislador quis criar para esta categoria de rendimentos?

    . Mas mais, esta norma cria uma incoerência no sistema fiscal português, uma vez que o artigo 1.º do Código do IRS dispõe que os rendimentos sejam sujeitos à taxa depois de se proceder à dedução específica, e o n.º 5 do artigo 53.º do Código do IRS dispõe que se aplique a taxa sem que primeiro se proceda à realização da dedução específica, sem que qualquer razão objectiva esteja subjacente a este normativo:

    . Para finalizar, o n.º 5 do artigo 53.º do Código do IRS viola o princípio da segurança jurídica na modalidade do princípio da confiança:

    . Ora, foi criada a convicção ao Recorrente, e aos pensionistas em geral, que aquando da reforma ficariam sujeitos a um regime de tributação mais favorável do que aquele a que se encontravam sujeitos, enquanto sujeitos passivos enquadrados na Categoria A;

    . Diga-se, expectativa essa, criada pelo próprio legislador, pelo que consubstancia um direito adquirido ou a aquisição de um verdadeiro direito subjectivo público, oponível ao próprio legislador, que se encontra assim assente no Estado de direito democrático;

    . Face ao exposto, conclui-se que a norma em apreço viola os mais elementares princípios de direito fiscal constitucional, sendo por isso materialmente inconstitucional.”

    Por parte da Fazenda Pública, não foram apresentadas contra-alegações. O Procurador-Geral Adjunto junto do Supremo Tribunal Administrativo concluiu no seu parecer pela confirmação do julgado, “negando-se, consequentemente, provimento ao recurso”, dizendo:

    “O Recorrente aufere rendimentos da categoria H (pensões) de valor anual superior ao vencimento base anualizado do Primeiro Ministro.

    Entende o Recorrente ter direito, no que toca às deduções específicas, ao tratamento previsto no n.º 2 do art.º 53.º do CIRS: que ao seu rendimento seja deduzido o valor de €7596,69. Ora, como a regra do n.º 5 daquele art.º 53.º lhe reduz o valor da dedução a €249,41, imputa (como se pode ver no resumo final que faz das conclusões das suas alegações) a esta norma a violação dos princípios constitucionais da igualdade, da generalidade, da capacidade contributiva, da progressividade do imposto, da justiça, da tributação pelo rendimento líquido e da confiança.

    *

    Importa dizer desde já que o julgado é de confirmar, porque o Mm.º Juiz a quo fez uma boa interpretação e aplicação da lei, perspectivando bem a função das deduções específicas. Vejamos.

    Dar tratamento fiscal desigual a rendimentos de montantes tão desiguais (€7.596.69/ €91.213,66) não viola o princípio da igualdade; antes pelo contrário, sabido que tal princípio só se realiza quando se trata de forma igual o que é igual e de forma desigual o que é desigua1 (igualdade horizontal/igualdade vertical).

    O princípio da generalidade da tributação significa, a traços largos, que quem tem capacidade contributiva deve pagar impostos; ora, não se alcança, no caso do Recorrente, a violação daquele princípio, uma vez que revela capacidade contributiva acima da média das pessoas singulares.

    O princípio da capacidade contributiva, por sua vez, significa que só deve ser sujeito à tributação quem pode pagar e na medida da sua capacidade; ora, no caso do Recorrente, não se alcança a medida da violação deste princípio: revela capacidade contributiva e o tributo liquidado cai dentro da medida da sua capacidade.

    O princípio da progressividade significa que o sistema fiscal deve realizar uma repartição justa dos rendimentos; ora, no caso do Recorrente também não se alcança a violação daquele princípio; pelo contrário, na medida em que a dedução é baixa para rendimento alto, o que permite que, para rendimentos mais baixos, a dedução seja mais alta.

    O princípio da tributação pelo rendimento líquido significa que a tributação deve incidir sobre o rendimento subtraído da despesa necessária à sua formação; ora, no caso do Recorrente, esse princípio não se mostra, igualmente, violado: é sabido que nos rendimentos de pensões não há, em regra, como há nos rendimentos do trabalho, despesa necessária à formação do rendimento.

    E o princípio da justiça (invocado a propósito da diferença de tratamento entre rendimentos da categoria A e da categoria H) também não resulta violado, pelas razões acabadas de invocar; os contribuintes de rendimentos do trabalho têm custos que não têm os contribuintes de rendimentos de pensões.

    Finalmente, quanto ao invocado princípio da confiança importa dizer que, ao editar o n.º 5 do art.º 53.º do CIRS, o legislador ordinário usou, de forma que não se pode considerar intolerável, a sua liberdade de conformação.”

    O Supremo Tribunal Administrativo decidiu confirmar a sentença impugnada, negando provimento ao recurso, pelos seguintes fundamentos:

    “Nestes autos de recurso jurisdicional, interposto da sentença, a fls. 45 e seguintes, do T.T. de 1ª instância de Lisboa, em que é recorrente A. e recorrida a F.P., fazendo apelo ao disposto nos art.ºs 713.º, n.º 5, e 726.º do C.P.Civil e tendo presente o texto do art.º 8.º, n.º 3, do C. Civil, pelos fundamentos da decisão recorrida que, do mais, se encontram em sintonia com o decidido no Ac. do S.T.A. de 31-03-2004, rec. 2059/03, tirado a propósito de um quadro conclusivo que é, ipsis verbis, exactamente igual ao ora traçado, acorda-se em negar provimento ao recurso.”

    Pode ler-se no referido acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 31 de Março 2004 (de que se juntou cópia nos autos):

    (...)

    3.2. Sabe-se que os rendimentos auferidos a título de pensões não eram, antes do CIRS, tributados em qualquer cédula parcelar, relevando, só, em sede de imposto complementar.

    Essa, reconhecidamente, a razão por que o legislador do CIRS se preocupou com aligeirar o impacto da tributação que pela primeira vez introduzia, estabelecendo um regime próprio, favorável, de dedução específica para os rendimentos oriundos de pensões.

    Assim, na versão original do CIRS, os rendimentos do trabalho dependente, por exemplo, gozavam de uma dedução específica de 65% do seu valor, com o limite de 250.000$00, ou com o limite das contribuições obrigatórias para a protecção social, se superior. Enquanto que aos rendimentos oriundos de pensões, se não superiores a 400.000$00, deduzia-se a totalidade, e aos superiores a esse montante eram deduzidos os mesmos 400.000$00, mas acrescidos de metade do excedente, com o limite de 1.000.000$00.

    Porém, este tratamento benevolente dado aos rendimentos provenientes de pensões não correspondia a qualquer imperativo constitucional, que exigisse ao legislador ordinário o...

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