Acórdão nº 571/05 de Tribunal Constitucional (Port, 25 de Outubro de 2005

Magistrado ResponsávelCons. Gil Galvão
Data da Resolução25 de Outubro de 2005
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 571/2005

Processo n.º 516/05

  1. Secção

Relator: Conselheiro Gil Galvão

Acordam, em conferência, na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional

I – Relatório

  1. O A., ora recorrente, intentou contra B. e outros, acção declarativa pedindo a declaração de nulidade do registo de uma hipoteca a favor dos RR, incidente sobre fracções autónomas de prédio urbano, identificado nos autos, anteriormente adquiridas pelo A. Por decisão do Tribunal de Círculo do Barreiro, de 15 de Setembro de 1997, foi a acção julgada improcedente e, em consequência, foram os RR absolvidos do pedido.

  2. Inconformado com esta decisão o A. recorreu dela para o Tribunal da Relação de Lisboa que, por acórdão de 27 de Maio de 1999, julgou o recurso improcedente.

  3. Novamente inconformado o A. recorreu para o Supremo Tribunal de Justiça que, por acórdão de 17 de Fevereiro de 2000, considerando que, “na pendência desta acção, foi proferido acórdão uniformizador de jurisprudência em sentido contrário ao que baseou as decisões das instâncias”, estabeleceu que “no caso de não se ter por existente má fé, prevalece o registo da hipoteca, porque efectuado antes do registo de aquisição das fracções autónomas pela autora. No caso contrário, ficará afectada a hipoteca, na parte que abrange as referidas fracções.” Assim sendo, concedeu, em parte, provimento à revista, ordenando a “remessa dos autos à Relação para ampliação da matéria de facto no que diz respeito à questão suscitada pelo autor, de má fé na celebração da hipoteca e consequente registo”.

  4. Em cumprimento deste acórdão, o Tribunal da Relação de Lisboa, considerando que o apuramento da matéria em causa “pressupunha a necessária produção de prova”, da competência da 1ª instância, para aí ordenou a remessa dos autos. Foi, então, elaborado o respectivo quesito, que obteve resposta negativa, vindo a acção a ser novamente improcedente, por decisão de 3 de Janeiro de 2002.

  5. Mais uma vez inconformado o A. recorreu para o Tribunal da Relação de Lisboa que, por acórdão de 20 de Janeiro de 2004, voltou a julgar a apelação improcedente.

  6. Desta decisão foi interposto recurso de revista. Já no Supremo Tribunal de Justiça, o relator do processo, considerando não ser possível conhecer do objecto do recurso proferiu parecer nesse sentido. Na parte ora relevante, é o seguinte o seu teor:

    “[...] Por este STJ foi proferido acórdão em que foi ordenada a ampliação da matéria de facto, com expressa indicação do concreto ponto a indagar e da finalidade do suprimento da insuficiência, bem como da definição do direito e solução jurídica a adoptar consoante ficasse ou não demonstrado o facto cuja apreciação fora omitida.

    Tratou-se da situação contemplada e excepcionalmente admitida e regulada nos arts. 729°-3 e 730°-1 C PC - o Supremo está em condições de definir já o direito aplicável, por a matéria de para tanto se revelar suficiente, apesar da deficiência, mas o apuramento do facto omitido mostra-se necessário à concretização decisória.

    No caso, decidido que a pretensão do A. procederia se se viesse a provar a má fé e improcederia no caso contrário só haveria que apurar esse facto e declará-lo em conformidade nas instâncias.

    Quando tal hipótese se verifica o julgamento da causa "resultará, a final, da combinação dos arestos dos tribunais de revista e de apelação ou da decisão da 1.ª instância. Na perspectiva da finalidade do recurso, é o sistema intermédio o concretizado (AMÂNCIO FERREIRA, "Manual dos Recursos...” 4ª ed., 257).

    Cumprida pelas Instâncias a ampliação da matéria de facto e aplicado o regime jurídico definitivamente fixado pelo Supremo, a decisão da Relação não admite recurso, como resulta do disposto no art. 730° citado e é facilmente compreensível.

    Consequentemente, à luz do regime invocado, que é o aplicável, o recurso interposto não é admissível.

  7. - Ocorre, porém, que o Recorrente funda a pretensão recursiva na violação da lei substantiva, enquanto fixa a força probatória da confissão como meio de prova, colocando-se, desse modo, a coberto da excepção prevista no último segmento do n.º 2 do art. 722° CPC, que, por regra, veda ao STJ a intromissão na matéria de facto quanto à sua fixação e à valoração das provas.

    Cabe, então, averiguar se, por isso, excepcionando a limitação acolhida pelo art. 730°, o recurso deve ser admitido.

    Entende-se que a resposta continua a ser negativa.

    A lógica e coerência do sistema não comportam outra solução.

    Na verdade, o acórdão que julgou a revista e mandou averiguar o concurso da má fé pelas instâncias fê-lo - e apenas o poderia ter feito - por não dispor o STJ do facto omitido, quer no elenco do factos assentes pela Relação, quer demonstrado por documento ou outro meio de prova com força probatória plena.

    Por isso, e apenas por isso, deferiu às instâncias o respectivo apuramento, cabendo à Relação a última palavra na valoração das provas e fixação dos factos em função das mesmas (arts. 722° e 729°).

    O Recorrente alegara já, naquele recurso para o Supremo, o concurso do requisito má fé, justamente a extrair dos factos articulados e dos documentos - em termos próximos dos que ora vem repor - e, subsidiariamente, a ampliação da matéria de facto "com a consequente prova", ou seja, para sobre ela ser produzida a necessária prova.

    O STJ. acolheu esta pretensão subsidiária, do mesmo passo que afastou a principal - a de se poder ter por demonstrada a má fé com base no alegado nos articulados e nos documentos não impugnados ( a invocada confissão) -, como se colhe da circunstância de ter considerado que a má fé atribuída pelo A. aos RR. «é contrariada na contestação» para, de seguida, na procedência parcial das conclusões, ordenar a ampliação que, doutro modo, seria de todo desnecessária.

    A mesma linha, sem impugnação, seguiu o acórdão da Relação ao julgar a averiguação do facto omitido à produção de prova em julgamento da matéria de facto na 1ª instância.

    E, ainda no seguimento do caminho traçado pelo próprio Recorrente, foi elaborado um quesito, coisa que a lei proíbe quando o facto a que o mesmo se reporta esteja provado por documento ou por confissão. Se o facto já estava provado (o que fora rejeitado) não poderia ser quesitado nem respondido, o que vale por dizer que não poderia ser submetido à prova e julgamento (arts. 508°~A-1-e), 511°-1 e 646°-4, todos do CPC).

    Nunca antes, nomeadamente até ao referido acórdão deste Supremo, suscitou o Recorrente a desconsideração nas decisões de mérito de "factos provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito" em violação do imperativo dirigido ao julgador pelo n.º 3 do art. 659° C PC.

    Não houve, entretanto, qualquer alteração da causa de pedir ou do pedido no sentido da apreciação da invalidade (anulabilidade) do negócio hipotecário - que, salvo melhor opinião, consistiria em eventual ineficácia em relação ao representado (arts. 268° e 269° C. Civil) - e da subsequente invalidade e cancelamento do registo.

  8. - Consequentemente, tem de concluir-se que as questões suscitadas não escapam ao objecto e limites do que ficou definitivamente decidido pelo acórdão deste Tribunal de 17/2/2000, encontrando-se completamente precludido o conhecimento de questões nele não expressa, porque já excepcionalmente definidas.

    Porque novas e extravagantes relativamente aos contornos fixados por aquele aresto ou porque nele decididas - como sucede com o afastamento, da tese da aquisição do facto má fé dos RR. com base no alegado na contestação e nos documentos que a instruem -, as questões suscitadas no recurso ora em apreciação já se encontram decididas ou são inidóneas para afastar a regra mencionada regra da inadmissibilidade de novo recurso para o STJ, ficando, nessa medida, um tal recurso sem objecto.

    De igual modo, enquanto fundamento acessório, a apreciação de nulidades, seja qual for a espécie de recurso, só pode ter lugar se este for admissível - arts. 721°-2,722°-1 e 754° CPC.

    Do que se deixa exposto manifesta-se o entendimento de que não é possível conhecer do objecto do recurso, por vedado pelo art. 730°- 1 e 2, a contrario.”

  9. Notificadas as partes para, querendo, se pronunciarem sobre o conteúdo deste parecer, disse o ora recorrente, para o que agora importa, o seguinte:

    “1. A questão prévia, suscitada no citado despacho, da impossibilidade de conhecimento do objecto do recurso de revista ora interposto pelo A., de modo àquele ser julgado findo, sem mais, conforme previsto na 2ª parte da alínea e) do n.º1 do art. 700° do mesmo Código, merece - só pode merecer, conforme razões que se alinharão infra - a mais profunda discordância e censura da parte do Recorrente, para mais, competindo, como compete aos Tribunais, administrar a justiça (art. 156° do CPC);

    [...]

  10. Chegados aqui, passemos, então, a elencar as razões que nos fazem discordar, total e absolutamente, do entendimento manifestado no despacho, de v. Exa., de 2005.01.12, "de que não é possível conhecer do objecto do recurso, por vedado pelo art. 730°- 1 e 2, a contrario", ou seja, da 2ª revista;

  11. Com efeito, não é verdade, afirmar-se, como se afirma, no citado despacho, dever "concluir-se que as questões suscitadas não escapam ao objecto e limites do que ficou definitivamente decidido pelo acórdão deste tribunal de 17/2/2000, encontrando-se completamente precludido o conhecimento de questões nele não expressa(s), porque já excepcionalmente definidas" e "Porque novas e extravagantes relativamente aos contornos fixados por aquele aresto ou porque nele decididas - como sucede com o afastamento da tese da aquisição do facto má fé dos RR. com base no alegado na contestação e nos documentos que a instruem -, as questões suscitadas no recurso ora em apreciação já se encontram decididas ou são inidóneas para afastar a regra mencionada regra da inadmissibilidade de novo recurso para o STJ, ficando, nessa medida, um recurso sem objecto".

  12. Senão vejamos!;

  13. Salvo o devido respeito, esquece-se v. Exa., Senhor Juiz Conselheiro, que as aludidas questões...

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