Acórdão nº 628/05 de Tribunal Constitucional (Port, 15 de Novembro de 2005

Magistrado ResponsávelCons. Fernanda Palma
Data da Resolução15 de Novembro de 2005
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 628/2005

Processo n.º 707/2005

  1. Secção

Relatora: Conselheira Maria Fernanda Palma

Acordam na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional

I

Relatório

  1. Nos presentes autos de fiscalização concreta da constitucionalidade, vindos do Supremo Tribunal de Justiça, A. foi condenado, pela 2ª Vara Criminal de Lisboa, como autor material de um crime de tráfico de estupefacientes, previsto e punível pelo artigo 21º, nº 1, do Decreto Lei nº 15/93, de 22 de Janeiro, na pena de seis anos de prisão.

  2. O arguido interpôs recurso da decisão condenatória, tendo o Tribunal da Relação de Lisboa, por acórdão de 23 de Junho de 2005, negado provimento ao recurso.

  3. A. interpôs recurso do acórdão de 23 de Junho de 2005 para o Supremo Tribunal de Justiça.

    O recurso não foi admitido por decisão com o seguinte teor:

    Recurso interposto pelo arguido A.

    Este arguido foi condenado na pena de 6 anos de prisão pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes.

    O acórdão proferido por esta Relação […] que conheceu do recurso por ele interposto, negou provimento ao mesmo, confirmando a decisão da 1ª instância.

    Por razões idênticas às atrás explanadas, e uma vez que lhe não pode ser aplicada pena superior a 6 anos de prisão pelo crime pelo qual foi condenado, não se admite o recurso interposto

    As razões “atrás explanadas”, referidas pelo Tribunal da Relação de Lisboa, constam da decisão que indeferiu um recurso interposto por outro arguido e são as seguintes:

    O arguido foi condenado, na 1ª Instância, nas penas de 6 anos de prisão, 1 ano de prisão e 7 meses de prisão pela prática, respectivamente, de um crime de tráfico de estupefacientes, um crime de detenção ilegal de arma de defesa e de um crime p. e p. no artigo 275º, nº 4, do C. Penal e, em cúmulo jurídico, na pena de 6 anos e seis meses de prisão.

    Esta Relação, conhecendo do recurso pelo mesmo interposto, negou provimento ao mesmo, confirmando inteiramente a decisão recorrida.

    Nos termos do disposto no artigo 400º, nº 1, alínea f) do CPP, não é admissível recurso de acórdãos proferidos, em recurso, pelas relações, que confirmem decisões da primeira instância, em processo por crime a que seja aplicável pena de prisão não superior a 8 anos, mesmo em caso de concurso de infracções.

    O mencionado preceito, ao reportar-se a pena aplicável, tem em vista a moldura penal abstracta correspondente ao crime ou crimes (em caso de concurso), mas há que respeitar os limites impostos pela proibição de “reformatio in pejus”, estabelecida no artigo 404º do CPP, de que resulta, no caso, não ser aplicável pena superior a 6 anos e 6 meses de prisão, em cúmulo jurídico, ao concurso de crimes.

    Assim, não se admite o recurso.

    O recorrente deduziu reclamação da decisão que não admitiu o recurso nos seguintes termos:

    1. - O arguido interpôs recurso da douta sentença condenatória de fls. dos autos por estar em tempo e deter legitimidade.

    2. - O recurso, bem como a respectiva motivação foram entregues em tempo e por quem para tal tinha legitimidade (o mandatário da arguida, devidamente e regularmente mandatado nos autos, mediante substabelecimento) ou seja, não cabendo, no caso, qualquer dos requisitos de rejeição de recurso, a que se refere o nº 2 do artº 414º do CPP.

    3. - E, muito menos, como se verá, não cabendo também “in casu” qualquer das causas de inadmissibilidade taxativa a que alude o artº 400º do CPR.

    4. - Na verdade, ao crime de tráfico de droga p. e p. pelo artº 21º DL 15/93 é aplicável (em abstracto) a pena de 4 a 12 anos de prisão.

    5. - Pelo que, sendo o máximo legal de 12 anos (a moldura em abstracto aplicável ao sobredito crime pelo qual indubitavelmente o recorrente foi condenado), falece por completo a argumentação aduzida no douto despacho reclamado de que o acórdão da Relação seria irrecorrível “uma vez que lhe não pode ser aplicada pena superior a 6 anos de prisão pelo crime pelo qual foi condenado” (douto despacho reclamado, a fls.239 verso, linhas 17 e 20).

    6. - Como resulta com clareza do texto da lei penal adjectiva (art. 400º alínea f) do CPP), não será admissível recurso “De acórdãos condenatórios proferidos, em recurso, pelas Relações, que confirmem decisão de primeira instância, em processo por crime a que seja aplicável pena não superior a 8 anos...”

    7. - O douto despacho recorrido parece, com o devido e merecido respeito, confundir a expressão “a que seja aplicável”, com a expressão “a que seja aplicada pena” ou “a que tivesse sido aplicada pena” de 8 anos de prisão, o que de facto sucedeu no caso concreto.

    8. - Mas - ainda com o muito e merecido respeito - não será esse o sentido do legislador. Atente-se que o sentido da lei é tornar irrecorríveis decisões de 1ª instância, mantidas pela Relação, em crimes a que em sede de moldura abstracta o limite máximo da pena de prisão não exceda os oito anos de prisão.

    9. - Sendo precisamente os casos limite aqueles que respeitam a crimes punidos com pena de prisão até 8 anos, o que não é, manifestamente, o caso dos autos.

    10. - Diversa interpretação restritiva da lei (como aquela que faz o douto despacho reclamado), constituiria, com o devido e merecido respeito, interpretação inconstitucional do citado preceito legal (o artº 400º alínea f) do CPP), ao impossibilitar o recurso para o Supremo Tribunal de Justiça em processo crime, num caso, como o dos autos, em que a moldura penal abstracta se mostra superior aos oito anos de prisão, violando-se assim de forma restritiva e não autorizada, quer o comando do artº 61º nº1 alínea h) do CPP quer – e fundamentalmente - o texto constitucional que possibilita o...

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