Acórdão nº 219/04 de Tribunal Constitucional (Port, 30 de Março de 2004

Magistrado ResponsávelCons. Maria dos Prazeres Beleza
Data da Resolução30 de Março de 2004
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 219/2004 Processo n.º 83/2004 3ª Secção

Relatora: Conselheira Maria dos Prazeres Pizarro Beleza

Acordam, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional:

  1. Pelo acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 23 de Junho de 2003, de fls. 163, foi decretada a extradição do cidadão ucraniano A.. Inconformado, o arguido recorreu para o Supremo Tribunal de Justiça. Nas alegações então apresentadas, a fls. 200, o mesmo arguido deu conta de que tinha pedido que lhe fosse concedido asilo político em Portugal e de que, de acordo com o disposto no n.º 2 do artigo 5º da Lei n.º 15/98, de 26 de Março, a pendência da respectiva apreciação implicava que ficasse suspensa “a decisão final a proferir” no processo de extradição.

    Por acórdão de 24 de Julho de 2003, de fls. 240, o Supremo Tribunal de Justiça anulou o acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, considerando verificada a nulidade prevista na al. a) do artigo 379º do Código de Processo Penal (falta de exame crítico das provas, exigida pelo artigo 374º, n.º 2, do mesmo Código), e determinando a sua reformulação de modo a indicar “de forma concisa, qual o valor que mereceu a prova apresentada”, determinação que veio a ser executada pelo acórdão de 8 de Agosto de 2003, de fls. 285, que decretou a extradição do arguido.

    O arguido recorreu novamente para o Supremo Tribunal de Justiça, voltando a colocar a questão da suspensão da decisão final a proferir no processo de extradição (cfr. alegações de fls. 295), por estar pendente um pedido de asilo (o pedido de reapreciação da decisão que o negou, e que veio a ser indeferido, como se pode verificar a fls. 254 e segs).

    O Supremo Tribunal de Justiça negou provimento ao recurso (acórdão de 8 de Setembro de 2003, de fls. 327). Para o que agora releva, o Supremo Tribunal disse que “E, por outro lado, não deverá aqui deixar passar-se em claro – cfr. fls. 259/283 – que também o pedido de asilo formulado pelo ora requerente em 02JUN03, com os mesmos fundamentos de natureza política, foi considerado ‘manifestamente infundado’ tanto pelo Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (em 18JUL03) como, em reapreciação, a pedido do interessado, pelo Comissariado Nacional para os Refugiados (em 5AGO03)”. Em nota, o mesmo acórdão referiu que “o extraditando requereu, no seu recurso de 20AGO03 (já depois de apreciado – e reapreciado – o pedido de asilo!) que ‘a decisão final a proferir neste processo ficasse suspensa enquanto o pedido de asilo estiver em apreciação (cfr. o n.º 2 do art. 3º da citada Lei 15/98)”.

    Deste acórdão, A. recorreu para o Tribunal Constitucional, Tribunal que, pelo acórdão n.º 564/2003, de fls. 354, decidiu não conhecer do recurso.

    O processo regressou ao Tribunal da Relação de Guimarães e foram emitidos os mandados necessários à execução da decisão de extradição, entretanto transitada em julgado.

  2. Pelo requerimento de fls. 425, de 18 de Dezembro de 2003, A. veio “requerer, nos termos do disposto no n° 2, do art. 5° da Lei 15/98, de 26 de Março, que essa decisão fique suspensa até ser proferida decisão final no processo de asilo político por si requerido, o qual se encontra pendente no Tribunal Administrativo do Círculo do Porto, com o nº 798.03 – 6° Juiz.”.

    O requerimento foi, porém, indeferido, pelo despacho de fls. 427, de 5 de Janeiro de 2004, nos seguintes termos: “A questão suscitada pelo requerente já foi objecto de apreciação e decisão pelo S.T.J. (cfr. fls. 332 e vº).

    No entanto, sempre se dirá que os presentes autos se encontram em fase de execução”.

    A. reclamou desse despacho, ao abrigo do disposto no n.º 3 do artigo 700º do Código de Processo Civil e no artigo 4º do Código de Processo Penal (cfr. reclamação de fls. 439), sustentando que o Supremo Tribunal de Justiça não tinha decidido tal pedido, apenas o tinha referido; e que, ainda que assim não fosse, o Tribunal da Relação de Guimarães não ficava impedida de suspender a decisão de extradição. Disse também que o processo relativo ao pedido de asilo ainda estava a correr, na fase judicial, e concluiu afirmando que “o Requerente entende que o n.º 2 do artº 5º da Lei 15/98, de 26 de Março, tem de ser interpretada no sentido de que a extradição não pode ser executada enquanto o pedido de asilo estiver pendente, quer na fase administrativa, quer na fase judicial. Outra interpretação, como a que parece ter sido acolhida pelo douto despacho em mérito, ofende, salvo melhor opinião, o n.º 7 do artº 33º [actual n.º 8] da CRP e é, por isso mesmo, inconstitucional”.

    Por acórdão de 24 de Janeiro de 2004, de fls. 496, o Tribunal da Relação de Guimarães decidiu não decretar a suspensão requerida, nos seguintes termos:

    A questão que o extraditado pretende ver esclarecida consiste no essencial em saber se a decisão de extradição, proferida nestes autos, transitada em julgado, deverá, ou não, ficar suspensa, enquanto o pedido de asilo formulado pelo extraditado se encontrar em apreciação quer na fase administrativa, quer na fase judicial.

    Posta a questão entremos na sua apreciação.

    Dispõe o n° 2 do artº 5° da citada Lei n° 15/98. de 26 de Março que "A decisão final sobre qualquer processo de extradição do requerente que esteja pendente, fica suspensa enquanto o pedido de asilo se encontre em apreciação quer na fase administrativa, quer na fase judicial".

    Será então que o teor de tal preceito legal consente a interpretação que lhe é dada pelo extraditado, isto é, de que a extradição não pode ser executada enquanto o pedido de asilo estiver pendente, quer na fase administrativa quer na fase judicial ?

    E o que desde já se dirá, é que a resposta a esta pergunta não pode, salvo o devido respeito, deixar de ser vincadamente negativa.

    Primeiro porque o legislador fala em decisão final e não em entrega ou remoção do extraditado.

    A nosso ver, se o legislador se tivesse querido exprimir no sentido proposto pelo extraditado, certamente que não se teria referido a decisão final, tanto mais que, como é óbvio, não...

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