Acórdão nº 515/03 de Tribunal Constitucional (Port, 28 de Outubro de 2003

Magistrado ResponsávelCons. Mota Pinto
Data da Resolução28 de Outubro de 2003
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 515/2003 Processo n.º 332/01 2ª Secção

Relator ? Cons. Paulo Mota Pinto

Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional,

  1. Relatório

    AUTONUM 1. No âmbito do processo executivo n.º 517/95, instaurado pela Câmara Municipal de Sintra, a correr termos no Tribunal Tributário de 1ª Instância de Lisboa A., veio, em 18 de Setembro de 1995, deduzir oposição invocando que as taxas exigidas estavam ?feridas de ilegalidade?, por a autarquia ter criado, ?sob a designação de taxa, um verdadeiro imposto?, com isso violando a Constituição da República (artigo 168º, alínea i), na versão então vigente), ?uma vez que não foi determinada pelo critério da área de ocupação das instalações na via pública?.

    Nas suas alegações, a executada manteve a anterior argumentação e, invocando um aumento de 900% nas taxas cobradas pelo funcionamento de um posto de abastecimento de combustíveis na via pública, concluiu que

    ?a questão que nos presentes autos está sob análise é se, revelando-se ter havido um aumento elevadíssimo, de um ano para o outro, mantendo-se a contrapartida da utilização dos mesmos bens do domínio público, não estamos perante a imposição de um imposto que deveria, então, ser tratado pela Assembleia da República e não pela Assembleia Municipal da Câmara Municipal de Sintra.?

    Por sentença de 21 de Abril de 1997, do 2º Juízo do Tribunal Tributário de 1ª Instância de Lisboa, foi afastada a excepção de incompetência desse Tribunal suscitada pela Câmara Municipal de Sintra, e também a aferição do invocado (pela empresa executada) aumento desproporcionado de uma taxa administrativa, não porque não pudesse o tribunal fazê-lo em abstracto, mas porque não podia fazê-lo em concreto, tendo em conta que ?a oponente nada concretizou sobre ?aquilo? que lhe proporciona o Município de Sintra, mediante a concessão da licença?. Em contrapartida, entendeu-se que a (denominada) taxa cobrada pelo município sintrense era, na verdade, um imposto, não porque nela não fosse divisável um ?vínculo sinalagmático?, de uma ?contraprestação específica?, ?de algo dado em troca? ? que considerou verificar-se ?, mas porque ?no cálculo da taxa ? para que esta o seja realmente ?, se não pode prescindir do pressuposto de facto do tributo e adoptar critério não relacionado com ele.? Por isso, e na medida em que o elemento determinante da taxa era o número de postos de abastecimento ? ?o critério da mangueira? ?, concluiu que tal era ?incompatível com a natureza da taxa exigida?, conferindo ?ao tributo as características de um verdadeiro imposto? (aqui citando Ramon Valdés Costa, Curso de Derecho Tributário, p. 164), pelo que, tendo o tributo em causa sido criado por mero regulamento municipal, tal implicaria ?violação das disposições combinadas dos artigos 106º, n.ºs 2 e 3, e 168º, n.º 1, alínea i), da Constituição? e ainda ?violação do princípio da prévia inscrição no Orçamento do Estado, exigido pelo artigo 17º, n.º 1, da Lei n.º 6/91, de 20 de Fevereiro (Lei do Enquadramento do Orçamento do Estado).?

    AUTONUM 2. A Câmara Municipal de Sintra recorreu para a Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, mas o Magistrado do Ministério Público suscitou a excepção de incompetência hierárquica, nos termos dos ?artigos 32º, n.º 1, alínea b), e 41º, n.º 1, alínea a) do ETAF e artigo 167º do Código de Processo Tributário?, por o recurso não ter por fundamento ?exclusivamente matéria de direito?.

    Por acórdão de 10 de Dezembro de 1997, a 2ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo veio a considerar-se incompetente, em razão da hierarquia, como preconizado pelo Ministério Público.

    Foi então o recurso remetido para o Tribunal Central Administrativo ? Secção de Contencioso Tributário, a requerimento da Câmara Municipal de Sintra.

    Por acórdão de 6 de Julho de 1999, este Tribunal decidiu, com um voto de vencido, revogar a sentença recorrida e julgar a oposição improcedente por ter entendido que o

    ?critério que o sr. Juiz recorrido erigiu como determinante para qualificar as prestações exigidas à oponente ? o método presuntivo de cálculo do tributo ? não [é] um elemento essencial típico do imposto mas antes um aspecto relativo à liquidação deste.

    Razão porque se entende ser mais correcta a qualificação de ?taxa? para a questionada prestação.

    (...) taxa que se encontra devidamente prevista nos artigos 42º e 43º da tabela de Licenças e Taxas, aprovada em 20 de Outubro de 1989 e em vigor nessa autarquia desde 2 de Dezembro, do mesmo ano, tendo a liquidação da questionada taxa plena cobertura legal na alínea o) do artigo 11º da Lei n.º 1/87, de 6 de Janeiro.?

    AUTONUM 3. Foi a vez de A. interpor recurso para a Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, iniciando as suas alegações com a delimitação da questão jurídica a decidir:

    ?Trata-se de saber se determinada taxa liquidada pela Câmara Municipal de Sintra é juridicamente uma verdadeira taxa ou se antes se trata de um imposto oculto e inconstitucional por não ter tido na sua génese autorização parlamentar.?

    Nas conclusões do recurso, a recorrente declarou que ?desde sempre disse que o que ?recebe? é a possibilidade de utilizar o domínio público e que essa área de domínio público tem sido sempre a mesma desde antes de 1989, ou seja desde antes de se terem verificado os aumentos que considera injustificados?, pelo que o que teria de ser apreciado no processo era saber ?se os aumentos são ou não injustificados e intoleráveis e se, nessa medida, perdem a sua natureza de taxa e devem ser considerados impostos?, já que ?no caso em apreço ficou demonstrado que a Recorrida aumentou de um ano para o ano seguinte e em mais de 900% as taxas devidas pela utilização do domínio público municipal.? Assim, ?[u]m aumento de tal modo desmesurado, sem qualquer outra contrapartida para além da referida e que já existia anteriormente, leva que se devam considerar tais taxas verdadeiros impostos com as consequências legal e constitucionalmente decorrentes.?

    Contra-alegou a Câmara Municipal de Sintra no sentido de que ?o alcance da decisão recorrida ? tomar posição sobre a idoneidade do critério utilizado para a qualificação jurídica do tributo em causa e não mais? ? implicava que ?não deve ser conhecida a matéria vertida nas alegações da Recorrente que ultrapasse esse âmbito, designadamente a referente à questão de saber se o aumento verificado no montante das taxas a partir de 1989 é desproporcionado e configura, nessa medida um imposto inconstitucional.? Acrescentou, todavia, razões para uma tal actualização de taxas: ?a inflação, a ponderação do factor de desgaste ambiental no domínio público decorrente da natureza dessas instalações [de abastecimento de combustíveis] e os custos inerentes à adaptação da estrutura e serviços prestados por esse facto, bem como o princípio do poluidor-pagador.?

    Por acórdão de 11 de Outubro de 2000 da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, foi negado provimento ao recurso, confirmando-se o aresto recorrido, e escrevendo-se, designadamente:

    ?o acima referido e alegado ?aumento desmesurado? da taxa não pode alterar-lhe a sua natureza, para converter o tributo num imposto, podendo então brigar, em termos de constitucionalidade, com os princípios da proporcionalidade e da justiça, mas tal questão nem sequer vem levantada, em tal perspectiva, pelo recorrente.?

    A...

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