Acórdão nº 451/02 de Tribunal Constitucional (Port, 30 de Outubro de 2002

Magistrado ResponsávelCons. Maria dos Prazeres Beleza
Data da Resolução30 de Outubro de 2002
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 451/02

Processo n.º 30/02

  1. Secção

Relatora: Maria dos Prazeres Pizarro Beleza

Acordam, na 3ª Secção

do Tribunal Constitucional:

1. A., deduziu impugnação judicial (parcial) contra o acto de liquidação de IRC, derrama e juros compensatórios relativo ao ano de 1991, no montante de Esc. 89.974.049$00. Para o que agora releva, a impugnante veio sustentar que não devia considerar-se como relativos a um "avião de turismo" os encargos correspondentes a um contrato de locação financeira que celebrou com a finalidade de utilizar tal meio de transporte no exercício da sua actividade, bem como as demais despesas realizadas para a respectiva utilização (al. f) do nº 1 do artigo 41º e al. f) do nº 1 do artigo 32º do Código do IRC).

Por sentença do Tribunal Tributário de 1ª Instância do Porto, de 30 de Junho de 2000, de fls. 149 e seguintes, julgou-se a impugnação procedente na parte relativa ao acréscimo de Esc. 213.292$00 que a Administração Fiscal efectuara ao valor do lucro tributável que havia sido declarado, do que resultou também a anulação correspondente dos juros compensatórios e da derrama liquidadas em razão desta importância, e improcedente na parte restante.

Inconformada, a impugnante recorreu para a 2ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo que, por Acórdão de 7 de Novembro de 2001, de fls. 199 e seguintes, negou provimento ao recurso e confirmou a sentença recorrida.

No seu Acórdão de 7 de Novembro de 2001, pronunciando-se sobre a questão da inconstitucionalidade, aliás já suscitada perante o Tribunal Tributário de 1ª Instância do Porto, das normas dos artigos 32º, n.º 1, alínea f), e 41º, n.º 1, alínea f), do Código do IRC, na redacção vigente à data do exercício de 1991, por violação dos artigos 106º, n.º 2, 107º, n.º 2, 164º e 168º, n.º 2, da Constituição, na redacção ao tempo em vigor, o Supremo Tribunal Administrativo julgou-a improcedente.

Em síntese, o Supremo Tribunal Administrativo entendeu que "a ideia que domina os artºs 32º, n.º 1, alínea f), e 41º, n.º 1, alínea f), do CIRC, vigente ao tempo (1991), foi a de não se aceitarem fiscalmente custos excessivos", sustentando que "as normas em causa não são inconstitucionais", designadamente na interpretação e aplicação que delas fez a sentença do Tribunal Tributário de 1ª Instância do Porto.

Com efeito, pode ler-se neste acórdão o seguinte:

Em 1991, o artº 32º, n.º 1, al. f), do CIRC, no que agora interessa, rezava o seguinte: não são aceites como custos as reintegrações das viaturas ligeiras de passageiros na parte correspondente ao valor da aquisição excedente a 4.000.000$00, bem como os barcos de recreio e aviões de turismo e todos os encargos com estes relacionados, desde que tais bens não estejam afectos a empresas exploradoras de serviços públicos de transportes ou não se destinem a ser alugados no exercício de actividade normal da empresa sua proprietária.

Por sua vez, o artº 41º, n.º 1, al. f), do CIRC, vigente em 1991, prescrevia o seguinte: não são dedutíveis para efeitos de determinação do lucro tributável os seguintes encargos, mesmo quando contabilizados como custos ou perdas de exercício: as rendas de locação financeira de viaturas ligeiras de passageiros e de barcos de recreio e de aviões de turismo na parte em que não seja aceite reintegração nos termos da alínea f) do n.º 1 do citado artigo 32º.

(...)

Na sentença recorrida, a Mª Juíza a quo não acolheu a qualificação do avião, feita pela recorrente, como "avião próprio para viagens de negócios (Executive)". Pelo contrário, no entender da Mª Juíza, "o conceito de avião de turismo deve ser encontrado por contraposição aos aviões de carga ou de transporte de mercadorias, isto é, por reporte a uma destinação essencialmente de transporte de pessoas". Dito de outro modo, na sentença recorrida entendeu-se que avião de turismo é o que se destina ao transporte de pessoas e não de carga ou de mercadorias. Logo, o avião em causa é avião de turismo.

Nas suas alegações, a recorrente entende que não estamos perante um avião de turismo pelo facto de o mesmo ser absolutamente necessário ao exercício da sua actividade e não destinado a lazer. Por outro lado, a recorrente insiste no facto de o avião não ser da sua propriedade, mas estar em regime de leasing.

Vejamos esta questão.

A lei fiscal alude por duas vezes a "avião de turismo", mas não dá uma definição desse conceito.

Após buscas na legislação aeronáutica, não encontramos qualquer diploma legal que nos dê a classificação dos aviões ou aeronaves. Nos termos do artº 49º, n.º 1, do Código de Registo de Bens Móveis aprovado pelo Decreto-Lei nº 277/95, de 25 de Outubro, considera-se "aeronave qualquer aparelho que se mantenha na atmosfera, pelos adequados meios propulsores próprios e que esteja no comércio jurídico". O nº 2 refere que não estão sujeitas a registo as aeronaves militares.

O artº 4º do Decreto-Lei nº 274/77, de 4 de Julho, procede à classificação do voo dos aviões, mas não classifica estes. Assim, quanto os objectivos determinantes da sua realização, os voos não regulares classificam-se em "voos de emergência", "voos de táxi", "voos para uso próprio" e "voos para viagens turísticas".

Os voos para uso próprio" (nº 2 al. c)) são os que se efectuam quer em regime de fretamento de toda a capacidade da aeronave por conta de uma mesma pessoa singular ou colectiva, quer por conta do próprio transportador, para o transporte:

1. Do seu pessoal ou das suas mercadorias;

2. De pessoas associadas ao fretador;

E em que prevaleça o carácter ocasional, nenhuma parte da capacidade seja revendida, os passageiros não partilhem entre si preço de fretamento e não haja arranjos de natureza comercial para o pagamento total ou parcial, directo ou indirecto, do custo do voo por outras pessoas que não sejam o fretador ou proprietário da aeronave, sem prejuízo de, no que se refere aos voos de carga, o fretador poder reaver da pessoa ou pessoas a quem as mercadorias se destinam efectivamente a totalidade ou parte do custo do transporte como parte integrante do preço de mercadorias.

Nos temos do artº 4º, n.º 2, al. d), os "voos para viagens turísticas" são os que se efectuem em regime de fretamento de toda a capacidade da aeronave por conta de uma ou mais pessoas, singulares ou colectivas (organizadores), para viagens turísticas ou abertas ao público em geral ou reservadas a indivíduos ligados entre si por afinidades associativas e organizadas, em ambos os casos, de acordo com requisitos especiais, com vista à deslocação de pessoas, individualmente ou em grupo, quer para seu aprazimento, em razão do itinerário ou do local de destino, quer para participar em manifestações culturais, religiosas profissionais, desportivas ou outras.

Estas classificações dos voos não regulares vieram a ser repetidas pela Portaria n.º 313/84, de 25 de Maio.

Reduzida a distinção à sua expressão mais simples, são voos para uso próprio os que se destinam ao transporte do pessoal ou das mercadorias de uma pessoa ou do transportador ou de pessoas associadas ao fretador, e são voos para viagens turísticas os que se efectuem...

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