Acórdão nº 134/01 de Tribunal Constitucional (Port, 27 de Março de 2001

Magistrado ResponsávelCons. Sousa Brito
Data da Resolução27 de Março de 2001
EmissorTribunal Constitucional (Port

Acórdão nº134/01

Proc. nº 54/98

  1. Secção

    Relator: Cons. Sousa e Brito

    Acordam, na 2ª Secção do Tribunal Constitucional:

    I – Relatório

    1. Por decisão do Tribunal Colectivo da Comarca de Caminha, foram os ora recorrentes JP, LP e o Município de Caminha condenados, respectivamente:

      1. os dois primeiros, como co-autores, pela prática:

        · de cinco crimes de fraude na obtenção de subsídio, um consumado e os demais tentados, previstos e punidos pelos artigos 36º, nº 1, alíneas a), b) e c), e nºs 2, e 5, alínea a), e 8 alínea a) do Decreto-Lei nº 28/84, de 20 de Janeiro, e 22º, 23º e 74º do Código Penal;

        · de três crimes de desvio de subsídio, previsto e punidos dois deles pelo artigo 37º, nºs 1 e 3 do Decreto-Lei nº 28/84, de 20 de Janeiro, e um deles apenas pelo nº 1 daquele preceito.

      2. o Município de Caminha, como autor material, pela prática de dois crimes de fraude na obtenção de subsídio, um consumado e outro tentado, e por um crime de desvio de subsídio, previstos e punidos pelos preceitos supra referidos.

        A final - efectuados os correspondentes cúmulos jurídicos e ponderado o perdão concedido pela lei nº 23/91, de 4 de Julho – foram os arguidos condenados:

        · o primeiro, na pena de 2 anos e cinco meses de prisão e sessenta dias de multa (com a alternativa de 40 dias de prisão);

        · o segundo, na pena de 1 ano e seis meses de prisão e 40 dias de multa (com alternativa de 26 dias de prisão);

        · o Município de Caminha, na pena de multa de 150 dias à razão diária de 10.000$00, num valor total de um milhão e quinhentos mil escudos.

    2. Inconformados com o teor do aresto supra referido os arguidos recorrerem para o Supremo Tribunal de Justiça. Nas alegações que apresentaram naquele Tribunal formularam, entre outras, as seguintes conclusões:

      "1ª - Ao condenar os recorrentes com fundamento na aplicabilidade do Decreto-Lei nº 24/84, de 20 de Janeiro, pelos crimes p.p., pelos artigos 36º e 37º deste diploma, o douto acórdão recorrido fez indevida aplicação das citadas normas legais e violou o princípio da legalidade/tipicidade plasmado no artigo 31º, nº1, da CRP;

  2. Tal diploma, todavia, é inaplicável aos factos arguidos nos autos;

  3. As únicas sanções legalmente previstas para os factos objecto dos autos eram as cominadas nos despachos ministeriais em vigor ao tempo da prática daqueles – v.g. o Despacho de 13/5/86, publicado no D.R., II série nº 125; e o Despacho Normativo nº 22/5/87, publicado no D.R., II série nº 143 de 25/6/87 – ou seja a reposição das verbas recebidas indevidamente, a suspensão, redução ou supressão das não recebidas e incluídas no pedido de pagamento de saldo que veio a ser accionada, mais tarde, através do Decreto-Lei nº 158/90, de 17 de Maio, alterado pelo Decreto-Lei nº 246/91, de 6 de Julho.

  4. A aplicação "in casu" das sanções penais cominadas no Decreto-Lei nº 28/84, envolve a violação dos princípios "non bis in idem" e da necessidade da tutela penal de que é corolário o princípio da proporcionalidade consagrado no art. 18º, nº 2, da CRP;

  5. Ao aplicar ao recorrente as penas cominadas nos artigos 36º e 37º do Decreto-Lei nº 28/84, o douto acórdão recorrido aderiu incondicionalmente à tese que considerava as comparticipações do FSE como subsídios, tal como são conceitualizados no art. 21º do mesmo diploma;

  6. Todavia as comparticipações do FSE não são subsumíveis ao conceito de subsídio definido no art. 21º do Decreto-Lei nº 28/84, seja por razões objectivas, seja porque a aplicação do Decreto-Lei nº 28/84 às comparticipações do FSE postula uma interpretação analógica do artigo 21º às situações - "rectius", às entidades, como no caso das accionadas nos autos à margem referenciados – a que não corresponde a natureza de "empresas" ou "unidades produtivas", com flagrante violação dos princípios da legalidade/tipicidade e nullum crimen sine lege ínsitos nos artigos 2º, 3º e 29º, nºs 1 e 3 da CRP, daí a sua inconstitucionalidade que se argui.

  7. As normas comunitárias reguladoras do FSE visam a promoção do emprego e a melhoria da qualidade de vida dos trabalhadores e não desenvolvimento económico – v.g. artigos 123º a 128º do Tratado de Roma e legislação complementar – de onde resulta a impropriedade da aplicação do conceito de subsídio recortado no artigo 21º do Decreto-Lei nº 28/84 às comparticipações do FSE;

  8. Fica assim excluída, no que se refere a tais comparticipações, a aplicabilidade da alínea b) do nº 2 do artigo 21º

  9. Assim como é igualmente de excluir em relação a tais comparticipações o pressuposto da alínea a) do mesmo nº 2 do artigo 21º, na parte em que alude à contraprestação em termos normais de mercado, uma vez que, no caso, tal contraprestação existe e consiste na realização das acções de formação profissional;

  10. Do texto das alíneas a) e b) do nº 2 do artigo 21º decorre assim a sua inaplicabilidade às comparticipações obtidas do FSE e, concomitantemente, a inaplicabilidade aos recorrentes das penas cominadas nos artigos 36º e 37º do Decreto-Lei nº 28/84;

  11. Assim, ao condenar os recorrentes com base nas referidas normas legais do Dec.Lei nº 28/84, o douto acórdão recorrido fez aplicação das mesmas e dos princípios constitucionais acima referidos, pelo que não pode subsistir na ordem jurídica.

  12. O crime tipificado no art. 36º do Dec.Lei nº 28/84 pressupõe que os actos descritos nas suas als a) a c) sejam contemporâneos da preparação e apresentação da candidatura (logo, anteriores à decisão de concessão ou atribuição do subsídio). Ora, os factos impugnados aos recorrentes tiveram lugar após a aprovação do pedido de candidatura e na fase do pedido de elaboração do pedido de pagamento do saldo, pelo que, na obtenção de subsídio, o douto acórdão fez incorrecta aplicação daquele art. 36º.

  13. Acresce que o legislador nacional tem adoptado soluções normativas que contendem com a aplicabilidade do Dec-Lei 158/90, de 17 de Maio, e o Dec-Lei 246/91, de 6 de Julho, que remetem exclusivamente para o domínio fiscal o mecanismo coercivo de restituição das prestações recebidas do FSE (v., diferentemente e para outros domínios, o regime da Lei 86/89, de 8 de Setembro (art. 49º, nº 1 e 3), da Lei 103/80, de 9 de Maio (art. 6º), e do Dec-Lei 118/83, de 25 de Fevereiro (art...

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