Acórdão nº 14/00 de Tribunal Constitucional (Port, 11 de Janeiro de 2000

Magistrado ResponsávelCons. Bravo Serra
Data da Resolução11 de Janeiro de 2000
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 14/2000

Procº nº 209/99

  1. Secção.

Relator:- BRAVO SERRA.

I

1. V. & C. - Comércio de Importação e Exportação, Ldª, intentou pelo Tribunal de comarca de Santo Tirso e contra C. - Comércio, Importação e Exportação, Ldª, N. O., A. O., C. Q. e J. J., execução para pagamento de quantia certa, seguindo a forma de processo ordinário, com vista a obter o pagamento da quantia de Esc. 4.077.870$00, acrescida de juros vincendos.

Tendo à exequente sido devolvido o «direito de nomeação de bens à penhora», requereu a mesma que esta recaísse sobre um prédio urbano da propriedade do executado N. O., solicitando, do mesmo passo, a citação do cônjuge deste, M. L., nos termos e para os efeitos dos artigos 10º do Código Comercial e 825º do Código de Processo Civil (números 2 e 3, na redacção anterior à emergente dos Decretos-Leis números 329-A/95, de 12 de Dezembro, e 180/96, de 25 de Setembro - cfr. artº 26º, nº 2 do primeiro daqueles diplomas, na redacção conferida pelo segundo).

Prosseguindo os autos seus termos, foi designada data para a abertura de propostas de adjudicação do prédio penhorado por preço superior ao oferecido pela exequente.

Aquando da realização dessa diligência, que teve lugar no dia 21 de Novembro de 1997, a mandatária da ora recorrente M. L. ditou para a acta requerimento por intermédio do qual peticionou que fosse "lavrado protesto nos termos e para os efeitos do disposto no artº 910º do C.P.C., reivindicando para si a propriedade do imóvel" penhorado.

O mencionado Juiz, todavia, indeferiu o solicitado com fundamento em que se não verificaria, no caso, a invocação de um direito próprio incompatível com a transmissão da coisa, o que motivou a recorrente M. L. a, do assim decidido, agravar para o Tribunal da Relação do Porto, o qual, por acórdão de 11 de Maio de 1998, negou provimento ao agravo.

2. De novo inconformada, agravou a recorrente para o Supremo Tribunal de Justiça, tendo, na alegação que produziu, concluído, inter alia:-

".......................................................................................................................................................................................................................................................................................

V

Ou seja, salvo sempre o devido respeito por melhor opinião, tendo em conta a natureza dos título ajuizados, nunca poderia ser ordenada a penhora em bens comuns do casal composto pela recorrente e pelo executado Norberto da Costa Oliveira, mas sim a meação do mesmo (o que não aconteceu) pois resulta claramente do presente processo que a dívida em causa não reveste a natureza comercial.

VI

Os meios de reacção contra tal penhora, por parte da recorrente, enquanto cônjuge do executado Norberto da Costa Oliveira, eram a dedução de embargos de terceiro ou a interposição de uma acção de reivindicação do imóvel penhorado.

VII

Isto porque, quer numa, quer noutra situação, a recorrente revestia sempre a qualidade de terceiro.

VIII

Era-lhe, por isso, legítimo invocar essa qualidade e lavrado protesto pela reivindicação previsto no artº. 910º do Cód. Proc. Civil, o que fez.

..........................................................................................................................................................................................................................................................................................

XL

Ora, como supra se viu, resulta claro que a penhora realizada nos presentes autos é ilegal, bem como que a recorrente é proprietária do imóvel objecto daquela (artº. 1404º do Cód. Civil).

XLI

Logo, o seu direito de propriedade, por ser anterior ao registo da penhora, foi ofendido por esta, podendo por isso a recorrente reagir contra a mesma.

XLII

Ao não entender assim, violou o Meritíssimo Tribunal ‘a quo’ o disposto nas disposições conjugadas dos artºs. 351º, 355º e 910º, do Cód. Proc. Civil, e, 1404º, 1405º, nº 2, e 1311º, estes do Cód. Civil.

XLIII

Se tal não for entendido por V. Exªs., então Exmºs. Senhores Conselheiros, a norma do artº. 910º do Cód. Proc. Civil é inconstitucional.

XLIV

Isto porque, não permite que os cônjuges dos executados, naqueles casos em que os bens penhorados fazem parte integrante da comunhão, possam protestar em sede processual pela reivindicação dos mesmos, apesar de poderem, na dita sede, embargar de terceiro.

XLV

Tal situação configura uma dualidade de critérios para idênticas situações já que, v.g., os terceiros proprietários que não sejam cônjuges dos executados, gozam do direito de embargar e de reivindicar, podendo lavrar protesto pela reivindicação da sua propriedade, circunstância que configura uma melhor defesa do seu direito de propriedade.

XLVI

Existe, assim, uma flagrante violação do disposto no disposto nº 2 do artº. 13º e do nº 2 do artº. 18º, ambos da C.R..P., directamente aplicável à situação ‘sub judice’, por força do estipulado no artº. 204º do aludido diploma constitucional".

O Supremo Tribunal de Justiça, por acórdão de 9 de Fevereiro de 1999, negou provimento ao recurso, tendo concluído que "[o] cônjuge do executado que, citado para a execução nos termos do artº 825º do Cod. P. Civil, depois de penhorado bem comum do casal, não tiver deduzido qualquer oposição de modo oportuno e eficaz, não goza de legitimidade, na altura da venda, para o incidente de protesto pela reivindicação, previsto no artº 910º, nº 1, do cit. Código".

E, à guisa de fundamento daquela conclusão, disse-se em tal aresto:-

"........................................................................................................................................................................................................................................................................................

No caso presente, a mulher do executado Norberto não usou, oportunamente ou de modo eficaz, de algum dos meios de reacção que a lei lhe facultava contra a penhora de bem comum do casal.

Ficou assim excluída a possibilidade de discussão sobre a natureza da dívida exequenda ou a legalidade da penhora e, além disso, tratando-se de bem comum, não havia lugar à acção de reivindicação, o que, aliás, seria incompatível com o prosseguimento da execução previsto no nº 3 do cit. artº 825º.

Isto implicava, desde logo, o indeferimento do protesto pela reivindicação, uma vez que ele pressupunha, necessariamente, a possibilidade da respectiva acção.

Acresce que a recorrente, cônjuge do executado, era ‘terceiro’, em relação à penhora, tal como se prevê no artº 1037º nº 2 do Cod. P. Civil (na redacção anterior a 1995/6) ou nos seus artºs 351º e seg (na redacção actual), mas já não assumia essa qualidade na data em que pretendeu lavrar o protesto; na verdade, com a sua citação para a sua execução e possível intervenção nesta para defesa dos seus interesses, ela passou a poder interferir, directa e pessoalmente, na relação jurídica processual, adquirindo assim a qualidade de ‘parte’ em relação aos actos posteriores ao seu chamamento (...).

........................................................................................................................................................................................................................................................................................"

É deste acórdão que vem interposto o vertente recurso, estribado na alínea b) do nº 1 do artº 70º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, visando-se por seu intermédio a apreciação da (in)constitucionalidade da interpretação nele sufragada reportadamente ao artº 910º do Código de Processo Civil.

Determinada a feitura de alegações, concluiu a recorrente a por si formulada do seguinte modo:-

"I

Subsistem dúvidas sobre se a comunhão conjugal consubstancia um verdadeiro património colectivo ou se, pelo contrário, para além das características típicas daquele património, este tipo de comunhão terá outras, susceptíveis de a transformar numa figura um pouco híbrida.

II

Isto porque, ao permitir que nos simples regimes de comunhão, qualquer dos cônjuges possa requerer a simples separação judicial de bens quando estiver em perigo de perder o que é seu pela má administração do outro (artº. 1767º do Código Civil), o legislador consagrou algo que não se coaduna com a inexistência de quotas, típica dos patrimónios colectivos.

III

O instituto da Simples Separação Judicial de Bens permite ao cônjuge lesado não só acabar com a comunhão, como também, e principalmente, defender aquilo que é seu, isto é, a sua meação nos bens.

IV

E, embora a aludida quota não seja passível de circulação em termos de comércio jurídico, a verdade é que a mesma deverá gozar de idênticos meios de defesa substantivos e processuais, relativamente às quotas inerentes a quaisquer outras situações de comunhão.

V

Por força do disposto no artº. 825º do Código de Processo Civil, mediante de um simples requerimento de citação do cônjuge do executado o credor pode, sem mais, agredir a esfera jurídica deste, de forma concreta e única no nosso ordenamento jurídico.

VI

Assim, embora a dívida exequenda seja apenas da responsabilidade de um dos cônjuges, o credor pode desde logo nomear à penhora bens comuns do casal, sendo essa nomeação legitimada pelo facto de, simultaneamente, pedir a citação do cônjuge do executado para requerer a separação de bens.

VII

Quer isto dizer que, à luz do regime constante no artº. 825º do Cód. Proc. Civil, o credor de um dos cônjuges, poderá ver o seu crédito satisfeito pela venda de bens que não pertencem na totalidade ao seu devedor, à revelia do disposto nos artºs. 601º e 817º do Código Civil.

VIII

No nosso ordenamento...

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