Acórdão nº 108/99 de Tribunal Constitucional (Port, 10 de Fevereiro de 1999

Magistrado ResponsávelCons. Messias Bento
Data da Resolução10 de Fevereiro de 1999
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 108/99

Processo n.º 469/98

Conselheiro Messias Bento

Acordam na 3ª Secção do Tribunal Constitucional:

  1. Relatório:

    1. R... interpõe o presente recurso, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, do acórdão do Supremo Tribunal Militar (de 16 de Abril de 1998), que, no recurso interposto da decisão da 1ª instância, o condenou como autor de dois crimes de insubordinação - um deles, previsto e punível pelo artigo 72º, n.º 1, alínea d), do Código de Justiça Militar; e o outro, pelo artigo 79º, n.º 1, alínea a), do mesmo Código -, nas penas, respectivamente, de dois meses de prisão militar e seis meses e meio de presídio militar, e, em cúmulo jurídico, na pena única de sete meses de presídio militar.

      No requerimento de interposição de recurso, o recorrente disse pretender que este Tribunal apreciasse a constitucionalidade das seguintes normas:

      (a). a do artigo 4º do Código de Justiça Militar;

      (b). a do artigo 79º, n.º 1, alínea a), do mesmo Código;

      (c). as dos artigos 24º, 25º, 26º, 27º, 28º e seguintes até 52º, do mencionado Código - recte, "todo o sistema de penas previsto no capítulo III do título I do referido Código"; e

      (d). as dos artigos 24º, n.º 1, alínea b), 26º, alínea 4ª, e 30º, n.º 1, do mesmo Código.

      Neste Tribunal, o recorrente, no que aqui importa, concluiu assim as suas alegações:

    2. As normas sobre suspensão da execução da pena do Código Penal são aplicáveis ao direito penal militar.

    3. O condenado em direito penal militar que preencha os pressupostos de facto para a suspensão da pena que não venha a ser decretada em virtude da interpretação dada ao artigo 4º do Código de Justiça Militar, encontra-se numa situação de desigualdade em comparação com outro condenado por prática de crime de direito penal comum, pois tanto aquele, assim como a sua família são obrigados a sofrer o ónus resultantes da prisão efectiva quando em comparação com este.

    4. É inconstitucional, por violação do princípio da igualdade previsto no artigo 13º da Constituição da República Portuguesa, a interpretação dada ao artigo 4º do Código de Justiça Militar (por lapso, escreveu-se RDM), com o sentido que não são aplicáveis ao direito penal militar as normas previstas no artigo 48º do Código Penal relativas à suspensão da execução da pena (hoje, é o artigo 50º).

    5. Os condenados por cometimento de crime essencialmente militar, caso se aceite que, preenchidos os pressupostos de facto para a suspensão da pena, esta não pode ser decretada ex lege em virtude de o direito penal militar o não admitir, e por motivo de tal interpretação, estão sujeitos a restrições para além do necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses legítimos da instituição militar, nomeadamente a disciplina.

    6. Em conformidade com a interpretação dada acima, o artigo 4º do Código de Justiça Militar também infringe o disposto no artigo 18º, n.º 2, da Constituição da República.

    7. O artigo 79º, n.º 1, alínea a), do Código de Justiça Militar sanciona o crime de ameaças com intenção de criar medo com uma pena mínima e máxima várias vezes mais gravosa do que o correspondente artigo 155º, nºs 1 e 2, do Código Penal (erradamente, nas conclusões, escreveu-se artigo 115º, nºs 1 e 2), não se descortinando nem na sua letra nem nos valores protegidos razão bastante para tal discrepância.

    8. Por outro lado, ainda que se possa afirmar que as situações referidas respeitam a situações de facto diferentes na sua essência, dúvidas não restam que a pena de quatro a seis anos estatuída pelo artigo 79º, n.º 1, alínea a), do Código de Justiça Militar é uma pena desproporcionada em relação aos bens jurídicos que visa proteger.

    9. Em conformidade, o artigo 79º, n.º 1, alínea a), do Código de Justiça Militar viola o disposto no artigo 18º, n.º 2, 2ª parte, e no artigo 13º da Constituição da República Portuguesa, quando interpretados conjuntamente.

    10. Acresce que os crimes previstos no artigo 79º, n.º 1, alínea a), do Código de Justiça Militar só podem ser cometidos por militar contra superior, e não por militares contra patente inferior ou da mesma patente ou até a ameaça de civis contra militares.

    11. Ora, sendo que qualquer ameaça contra militares por motivo de suas funções ofende igualmente a disciplina, o artigo 79º, n.º 1, e a correspondente alínea a) consagra uma discriminação não baseada em circunstâncias de facto relevantes, que viola o princípio da igualdade, estabelecido no artigo 13º da Constituição da República Portuguesa.

      Nestes termos, devem os artigos e 79º, n.º 1, alínea a), do Código de Justiça Militar acima referidos, e com as interpretações dadas, ser julgados inconstitucionais, com todas as consequências legais.

      O Procurador-Geral Adjunto em funções neste Tribunal - depois de dizer que "não pode considerar-se suscitada, de modo idóneo e adequado, a questão da pretendida inconstitucionalidade de ‘todo o sistema de penas’ do Código de Justiça Militar", acrescentando que "não há qualquer utilidade em apreciar a questão que vem reportada à norma do artigo 4º do Código de Justiça Militar, interpretada em termos de não permitir a aplicação, em direito penal militar, do instituto da suspensão da pena", devendo, por isso, o objecto do recurso considerar-se "circunscrito à apreciação da questão de constitucionalidade da norma incriminadora, constante do artigo 79º, n.º 1, alínea a), do Código de Justiça Militar" - concluiu assim as suas alegações.

    12. A norma constante do artigo 79º, n.º 1, do Código de Justiça Militar, ao sancionar o crime de insubordinação com uma pena sensivelmente superior à prevista no direito penal comum para as ameaças e injúrias, não viola o princípio da proporcionalidade, dado que aquele preceito visa tutelar específicos e essenciais bens jurídicos militares - a disciplina e a hierarquia - sem os quais não poderiam existir e funcionar as Forças Armadas.

    13. Não viola o princípio da proporcionalidade a cominação ao arguido, acusado de tal crime, de uma pena, especialmente atenuada, de 10 meses de presídio militar.

    14. Termos em que deverá improceder o recurso interposto.

      O recorrente, ouvido sobre a falta de utilidade no conhecimento da questão de...

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