Acórdão nº 247/99 de Tribunal Constitucional (Port, 29 de Abril de 1999

Magistrado ResponsávelCons. Maria dos Prazeres Beleza
Data da Resolução29 de Abril de 1999
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 247/99

Processo nº 103/96

  1. Secção

Relatora: Maria dos Prazeres Beleza

Acordam, na 2ª Secção do

Tribunal Constitucional:

  1. Por despacho de 16 de Julho de 1993 do Juiz do 9º Juízo do Tribunal Cível de Lisboa, de fls. 2561, foi parcialmente indeferido o pedido de apoio judiciário formulado por J..., um dos réus na acção proposta pela C..., A.S., em liquidação, no âmbito da qual foi interposto o presente recurso, acima identificado, por entender que ele tinha "uma situação económica desafogada, não preenchendo, obviamente, o padrão daqueles que podem beneficiar na totalidade da dispensa do pagamento de preparos e custas". Considerando, todavia, o "valor consideravelmente elevado da (...) acção", dispensou-o "do pagamento de preparos e custas em 60%".

    O réu, porém, uma vez que, ainda assim, teria de pagar mais de 1300 contos só de preparos, recorreu para o Tribunal da Relação de Lisboa, afirmando ser "imperioso a atribuição (...) do benefício de apoio judiciário na totalidade das modalidades que requereu, sem o que se estará a impossibilitar o seu recurso à Justiça e a violar, entre outros, o disposto nos arts. 1º, N. 1 e 31º, N. 3 todos do Decreto-Lei nº 387-B/87 de 29 de Dezembro, bem como o artigo 20º na Constituição, preceitos que o despacho recorrido claramente violou".

    O Tribunal da Relação de Lisboa (acórdão de fls. 2627), porém, por um lado considerando que, em rigor, o despacho recorrido era nulo por insuficiência de fundamentação de facto e por omissão de fundamentação de direito mas, por outro, tendo em conta que podia suprir a nulidade, negou provimento ao recurso.

    Recorreu então o réu para o Supremo Tribunal de Justiça. De novo foi julgado improcedente o recurso, por acórdão de 3 de Outubro de 1995 (de fls. 2657), segundo o qual "a matéria de facto alegada e provada não permite a este Tribunal afastar a conclusão das instâncias de que o benefício a conceder ao recorrente não pode ultrapassar os 60% dos montantes a pagar". Notificado das custas em que foi condenado por este acórdão, veio pedir a respectiva reforma, quanto ao que agora interessa, assim concluindo:

    "(...) deve a presente reclamação ser deferida e reformada a conta de modo a:

    a) Incluir como valor da causa o da sucumbência;

    b) Isso não só por aplicação directa do nº 3 do artº 8º do CCJ mas também por no requerimento inicial do recurso em 1ª Instância se ter referido a sucumbência e um valor;

    c) Sendo sempre de aplicar tal valor, mesmo que se considerasse que a indicação do valor da sucumbência não foi inteiramente expresso pois a parte final do nº 3 do artigo 8º e os artigos 16º e seguintes do CCJ são inconstitucionais, o primeiro nestes casos de apoio judiciário, e os restantes sempre, por não estabelecerem limite máximo da taxa de justiça, assim violando todos eles o disposto no artigo 20 da Constituição.

    (...)"

    O pedido de reforma não foi atendido, tendo o Supremo Tribunal de Justiça decidido, por acórdão de 9 de Janeiro de 1996, de fls. 2684, que "a conta, ora reclamada, respeitou os critérios legais de determinação do valor tributário" e que não ocorria a inconstitucionalidade suscitada, quer porque nada na Constituição obrigava à gratuitidade da justiça, quer porque a decisão de que o reclamante tinha capacidade económica para suportar 40% dos encargos respeitava "o seu direito de acesso à justiça".

    Recorreu então J... para o Tribunal Constitucional do acórdão "que decidiu sobre a reclamação da conta, e por se lhe afigurar ser inconstitucional por violar o disposto no artº 20 da Constituição da República Portuguesa ao aplicar como o fez o disposto na parte final do nº 3 do artigo 8º e os artºs 16º e seguintes do Código das Custas Judiciais".

    O recurso foi admitido pelo Supremo Tribunal de Justiça. Já no Tribunal Constitucional, pelo despacho de fls. 2695, o recorrente foi convidado a completar o requerimento. Respondendo ao convite, J... esclareceu que recorria ao abrigo do disposto na al. b) do nº 1 do artigo 70º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro e que a inconstitucionalidade que pretendia ver apreciada havia sido suscitada no requerimento em que pediu a reforma da conta de custas.

    Notificado para alegar, o recorrente veio sustentar, em síntese, que a aplicação da regra contida no nº 3 do artigo 8º do Código das Custas Judiciais, segundo a qual, nos recursos, caso o recorrente não indique no requerimento de interposição qual o valor da sucumbência, se considera relevante para efeitos de tributação o valor da causa (por conjugação com a al. v) do nº 1 do mesmo artigo), e não o da sucumbência, aos recursos de decisões proferidas no âmbito de pedidos de apoio judiciário põe em causa o princípio constitucional do acesso à justiça.

    Em particular, no caso dos autos, essa violação seria flagrante, uma vez que o valor da causa era extraordinariamente elevado e tinha sido concedido ao recorrente a dispensa de suportar 60% dos encargos da lide, quando requereu a concessão de apoio judiciário. Só havia decaído, portanto, em relação a 40% desses encargos. Logo, a conta deveria ter tomado como valor de referência esses 40%, correspondentes à sucumbência, e não o valor total da acção. O seu direito de acesso à justiça, constitucionalmente tutelado (artigo 20º da Constituição), foi, portanto, gravemente atingido com a interpretação e aplicação feita pelo tribunal a quo da parte final do nº 3 do artigo 8º citado.

    Quanto às normas dos artigos 16º e seguintes do Código das Custas Judiciais, a sua inconstitucionalidade residiria na...

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