Decisões Sumárias nº 516/07 de Tribunal Constitucional (Port, 11 de Outubro de 2007
Magistrado Responsável | Cons. Maria Lúcia Amaral |
Data da Resolução | 11 de Outubro de 2007 |
Emissor | Tribunal Constitucional (Port |
DECISÃO SUMÁRIA N.º 516/07
Processo nº 522/2007 3ª Secção
Relatora: Conselheira Maria Lúcia Amaral
Decisão Sumária
Recorrente: Ministério Público
Recorrido: A.
I
Relatório
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O representante do Ministério Público junto do Tribunal Judicial da Comarca da Horta interpôs, ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro (Lei Tribunal Constitucional), recurso para este Tribunal da sentença proferida a fls. 295 e segs. dos autos, na parte em que decidiu “considerar inconstitucionais as normas dos art.ºs 1º e 2º do Decreto Legislativo Regional n.º 3/85/A, de 10 de Abril, juízo que se estende ao art.º 3.º, por carecer de autonomia”. Pode ler-se na respectiva fundamentação “De Direito”, para o que o presente recurso releva:
De Direito
Da questão prévia da inconstitucionalidade do Decreto Legislativo Regional n° 3/85/A, de 10 de Abril
As três normas do diploma em apreço, invocado pela autora, têm a seguinte redacção:
“1 – Na Região Autónoma dos Açores, os arrendamentos feitos exclusivamente para garagens de veículos particulares não comerciais ou para arrumos domésticos estão excluídos do âmbito do art° 1095° do C.Civil.
2 – Os arrendamentos referidos no artigo anterior podem ser denunciados segundo o regime geral estabelecido pelos artigos 1054° e art° 1055° do mesmo Código.
3 – O disposto no presente diploma aplica-se às relações jurídicas constituídas à data da sua entrada em vigor, bem como às que futuramente venham a constituir-se”.
Como se sabe, a competência do legislador regional afere-se pela verificação conjugada de três requisitos, um deles de projecção positiva – ser matéria de interesse específico regional –, os demais de índole negativa, respeito pelas leis gerais da República e, bem assim, não se tratar de matéria reservada a competência própria dos órgãos de soberania.
O interesse específico é algo que, respeitando o valor intangível da integridade da soberania do Estado e o quadro constitucional, e não se limitando a assumir-se como interesse exclusivo, passa pelo condicionalismo geoeconómico-social da região, que o isolamento insular aviva, e pelos objectivos autonómicos que o n° 2 do art° 227° enumera condensadamente. Serão assim de interesse específico para a região as matérias que lhes respeitem exclusivamente ou que nelas exigem especial tratamento por ali assumirem especial configuração.
Incluir-se-á aqui o regime de denúncia dos contratos de arrendamento de garagens?
Cremos que não.
Efectivamente, não só nesta Região são firmados inúmeros contratos de arrendamento de espaços destinados a utilização como garagem – para parqueamento de viaturas e arrumos domésticos –, tratando-se antes de um fenómeno de âmbito nacional. Verifica-se, por exemplo, com muita frequência, nas grandes áreas urbanas do território continental. A ser assim, esta não constitui uma realidade específica regional a justificar a adopção daquela medida legislativa. Por outras palavras, não estamos perante uma realidade exclusiva desta Região ou que aqui assuma uma peculiar configuração que imponha um tratamento diferenciado do válido para o restante território nacional.
Concluindo-se, como se concluiu, pela inexistência de qualquer interesse específico regional na regulamentação desta matéria, resta concluir que as normas do diploma em apreço são inconstitucionais.
Na verdade, não estando preenchido o primeiro dos enunciados requisitos, prejudicada fica a apreciação os demais.
Comunga-se assim o entendimento já perfilhado nos doutos acórdãos do Tribunal Constitucional n°s 154/88, 257/88, 139/90 e 141/90.
Com os fundamentos fácticos e legais supra expostos, consideram-se inconstitucionais as normas dos art° 1° e 2° do Decreto Legislativo Regional n° 3/85/A, de 10 de Abril, juízo que se estende ao art° 3°, por carecer de autonomia.
Cumpre decidir.
II
Fundamentos
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O Decreto Legislativo Regional n.º 3/85/A, de 10 de Abril, foi emitido ao abrigo da alínea a) do artigo 229.º da Constituição, na versão saída da I revisão constitucional.
Tendo em conta que a VI Revisão Constitucional, operada pela Lei Constitucional n.º 1/2004, de 24 de Julho, introduziu significativas alterações no texto constitucional no que respeita à matéria das competências das assembleias legislativas das Regiões Autónomas, depara-se um problema de sucessão de normas constitucionais no tempo. A questão já foi anteriormente tratada neste Tribunal Constitucional. Relembre-se o que se afirmou no Acórdão n.º 246/2005 (disponível em www.tribunalconstitucional.pt):
Entre as alterações introduzidas por esta revisão constitucional conta-se a “simplificação dos parâmetros em que o poder legislativo regional se pode exercer” (Vitalino Canas, Constituição da República Portuguesa (após a sexta revisão constitucional-2004), AAFDL, 2004, pág. 22) e, concomitantemente, o alargamento dos poderes legislativos das regiões autónomas. As modificações assinaladas são, essencialmente, as seguintes:
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desaparecimento da categoria de leis gerais da República (antigo n.º 5 do artigo 112.º da Constituição), a cujos princípios fundamentais os diplomas regionais se encontravam subordinados;
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eliminação da necessidade de existência de interesse específico regional na matéria regulada pelas regiões, enquanto pressuposto ou requisito do exercício da competência legislativa destas últimas (veja-se o n.º 4 do artigo 112º da CRP, na sua actual redacção).
O poder legislativo das regiões autónomas continua, porém, a enquadrar-se pelos fundamentos da autonomia das regiões consagrados no artigo 225.º da CRP e a restringir-se ao âmbito regional e às matérias enunciadas no respectivo estatuto...
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