Acórdão nº 107/11 de Tribunal Constitucional (Port, 01 de Março de 2011

Magistrado ResponsávelCons. Pamplona Oliveira
Data da Resolução01 de Março de 2011
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 107/2011

Processo n.º 374/10

  1. Secção

Relator: Conselheiro Carlos Pamplona de Oliveira

Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional:

  1. Relatório

    1. A. intentou acção para reconhecimento de direito no Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa, contra o Ministro da Defesa Nacional e o Ministro de Estado e das Finanças, peticionando inter alia o reconhecimento do direito a que a remuneração suplementar concedida em conformidade com o estabelecido no Despacho Conjunto do Ministro das Finanças e do Plano e do Chefe do Estado Maior General das Forças Armadas n.º A-220/81, de 02/09/81, fosse calculada sobre a remuneração base correspondente à categoria, escalão e índice remuneratório em que fora posicionado no novo sistema retributivo (NSR).

      O Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa indeferiu o pedido nos seguintes termos:

      “Por Acórdão do STA, de 19.01.2006, Processo 0265 /05, em Pleno da Secção do Contencioso Administrativo, proferido em recurso com fundamento em oposição de julgados, foi decidido:

      “(...)

      no caso em análise se coloca a questão de saber se na transposição para o NSR o suplemento remuneratório consistente numa determinada percentagem do vencimento base deve ser calculado por incidência sobre a remuneração inerente à categoria (1º escalão) ou sobre a remuneração base de cada funcionário (escalão respectivo).

      Sucede que a solução que melhor se adequa ao princípio da equidade interna e externa que enforma o NSR vai no sentido propugnado pelo Acórdão recorrido, o que implica que a referência ao 1º escalão da categoria tem de ser entendido como escalão 1 desta e não outras remunerações acessórias ou suplementares, razão pela qual a remuneração suplementar abonada aos Recorrentes deve corresponder a 1/3 do vencimento base do 1° escalão da categoria profissional em que cada um deles se integra.

      De facto, a tese contrária acentuaria a subjectivização do suplemento remuneratório, quando este tem um cariz tendencialmente objectivo, isto é, não está dependente de elementos subjectivantes da remuneração do interessado, antes dependendo o seu quantitativo do vencimento da categoria objectivamente considerado.”

      E, no mesmo sentido, fazendo aliás citação deste acórdão do STA, se decidiu no Acórdão do TCA/Sul – Acórdão de 04.10.2007, Processo 0213/06

      (…)

      Pelo exposto, aderindo sem reserva à fundamentação e jurisprudência dos citados acórdãos, aplicável ao caso concreto em discussão na presente acção, julga-se esta improcedente e, consequentemente, absolvem-se os Réus dos pedidos”.

    2. Desta sentença A. recorreu para o Tribunal Central Administrativo Sul, concluindo, para o que aqui releva:

      1. (…) a prevalecer o entendimento perfilhado na sentença recorrida, a sua aplicação na prática seria fonte de um tratamento violador do princípio da igualdade;

      2. Com efeito, é preciso ter em conta que o suplemento em causa destina-se a retribuir trabalho efectivamente prestado;

      3. Ora, nos termos do direito fundamental à retribuição do trabalho, segundo a quantidade, a natureza e a qualidade, observando-se o princípio de que para trabalho igual salário igual (cfr. art. 59.°, n.º 1, al. a) da CRP), e tendo em conta que o mesmo princípio da igualdade impõe o tratamento desigual de situações desiguais e que existe uma distinção entre trabalhadores com índices remuneratórios distintos, sempre os Recorrentes teriam direito a uma remuneração suplementar calculada por referência à sua remuneração base;

        (…)

      4. Ao decidir no sentido referido atrás, a sentença recorrida fez uma incorrecta interpretação e aplicação do Despacho Conjunto n.º A-220/81, bem como do disposto no art. 17.°, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 184/89, com o que se mostra violado o princípio da igualdade nos termos previstos no art. 59.º, n.º 1, al. a) e no art. 13.º da CRP, inconstitucionalidade essa que expressamente aqui se invoca para os devidos efeitos legais (...).

    3. O Tribunal Central Administrativo Sul decidiu o recurso por acórdão de 25 de Março de 2010, que confirmou a decisão recorrida nos seguintes termos:

      “a única questão a resolver no presente recurso – saber se o direito à remuneração suplementar correspondente a 1/3 da remuneração base do autor, deve ser feita por referência ao escalão 1 da respectiva categoria profissional em que se integre ou, inversamente, por referência à categoria, escalão e índice remuneratório, em que o autor foi sendo posicionado ao longo dos anos, até à sua transição para o quadro do pessoal civil da Marinha – já foi objecto de pronúncia por parte do STA, no sentido defendido na sentença recorrida.

      Além disso, mais recentemente, o Pleno da Secção do STA, em acórdão proferido em 18-9-2008, no âmbito do recurso nº 0212/08, em questão em tudo idêntica, quer no plano factual, quer no plano do Direito, veio reiterar o entendimento que já resultava do Acórdão do mesmo Pleno, de 19-1-2006, acrescentando os seguintes argumentos:

      “A «remuneração suplementar», prevista no Despacho Conjunto muitos anos antes da introdução do NSR, correspondia a «remunerações por horas suplementares», estando até condicionada à «prestação de serviço média diária não inferior a duas horas, para além do período normal de serviço» [cfr. os nºs 5 e 6 do mesmo Despacho]. Sendo assim, e na terminologia dos DL’s nºs 184/89 e 353-A/89, respectivamente de 2/6 e de 16/10, tais abonos não eram remunerações acessórias, mas antes autênticos suplementos – pois traduziam acréscimos remuneratórios atribuídos em função de particularidades especificas da prestação de trabalho [artigo 11º, nº 1 do DL nº 353-A/89] ou, mais precisamente, em função de uma disponibilidade para o trabalho fora do seu período normal [cfr. o artigo 19º, nº 1, alínea a) do DL nº 184/89].

      Com a introdução do NSR [para que sobretudo concorreram os dois decretos-leis atrás citados], os suplementos remuneratórios anteriormente concedidos não desapareceram, e antes se mantiveram «nos seus regimes de abono e de actualização» [artigo 11º, nº 2 do DL nº 353-A/89]; e isto significava que tais suplementos permaneceram «nos seus montantes actuais, sujeitas à actualização nos termos em que» vinha «sendo feita», situação que vigoraria «até à fixação do regime e condições de atribuição de cada suplemento em decreto-lei, nos termos do nº 3 do artigo 19º do DL nº 184/89, e do artigo 12º do próprio DL nº 353-A/89» [cfr. o artigo 37º, nºs 2 e 3 deste último diploma].

      Deste modo, o NSR estabeleceu, para todos os suplementos – e, portanto, também para aquele a que se referem os autos – um «regime transitório» [como esclarece a epígrafe do citado artigo 37º] que vigoraria até que se legislasse sobre cada um deles. E, basicamente, esse regime consistia em os suplementos pretéritos permanecerem à margem do NSR – já que as regras do seu abono, a determinação do seu «quantum» e, inclusivamente, a metodologia da sua actualização continuavam a ser as anteriormente vigentes.

      Percebe-se agora o motivo por que configura um falso problema a busca do escalão que, em cada categoria do NSR, haveria de servir de base de cálculo à «remuneração suplementar» prevista no Despacho nº A-220/81: desde que os suplementos ora em causa tinham de se manter «nos seus montantes actuais» [por referência à entrada em vigor do NSR], nenhuma razão havia para os recalcular à luz dos incrementos remuneratórios trazidos pelo NSR e, «a fortiori», à luz dos escalões por onde se distribuíram os funcionários; mas, porque poderia demorar a edição do decreto-lei regulador da tal «remuneração suplementar», o «quantum» desses suplementos seria actualizável «nos termos» das actualizações passadas, assim se evitando ou minorando uma sua progressiva degradação.

      Está assim plenamente demonstrado que os recorrentes não têm o primeiro direito de que se arrogavam na acção. Salvo havendo uma actuação «contra legem», a emergência do NSR não lhes permitia auferir um abono quantitativamente diferente do que antes recebiam – sempre sem prejuízo das respectivas actualizações.

      Também é óbvio que nunca foi publicado um decreto-lei que tivesse fixado «ex novo» o «regime» e as «condições de atribuição» do suplemento previsto no Despacho nº A-220/81 – pais, se tal porventura houvesse sucedido, toda a problemática dos autos estaria resolvida «ipso facto». Portanto, e impondo a lei que os abonos em causa se mantivessem «nos seus montantes actuais», embora actualizáveis, não tem qualquer cabimento a ideia de que eles deviam acompanhar o acréscimo remuneratório que o NSR trouxe [desde logo, «ex vi» do artigo 30º, nº 2 do DL nº 353-A /89] e, por via disso mesmo, serem a partir daí recalculados com base nos vencimentos base dos escalões das várias categorias.

      Portanto, a solução do acórdão recorrido, negatória do primeiro direito invocado pelos recorrentes, merece subsistir, ainda que por diferentes razões. E, desde que o regime legal dos suplementos nem sequer admitia que o seu cálculo se fizesse segundo o primeiro escalão de cada categoria, fica imediatamente prejudicada a denúncia de que a improcedência da acção nesta parte implicava uma ofensa do princípio constitucional da igualdade – por propiciar que funcionários posicionados em diferentes escalões da mesma categoria viessem a receber suplementos iguais. Decerto que esta possibilidade persiste ainda; mas isso nada tem a ver com o alegado direito, antes se devendo ao «regime transitório dos suplementos», constante do artigo 37º do DL nº 353-A/89 – norma esta que se limitou a manter provisoriamente íntegro um «statu quo ante» e que não enferma da apontada inconstitucionalidade.

      (…)”

      A Jurisprudência do STA invocada pela decisão recorrida – Acórdão do Pleno, de 19-1-2006 – foi efectivamente tirada em situações exactamente idênticas, fosse no plano factual, fosse no plano jurídico, pelo que atendendo a que não se antevêem razões para dela divergir – atente-se igualmente no Acórdão do Pleno da Secção do STA, proferido em 18-9-2008, no âmbito do recurso nº 0212/08, sobre idêntica questão de facto e de...

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