Acórdão nº 52/08 de Tribunal Constitucional (Port, 23 de Janeiro de 2008

Magistrado ResponsávelCons. Pamplona Oliveira
Data da Resolução23 de Janeiro de 2008
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 52/2008

Processo n.º 933/07

1ª Secção

Relator: Conselheiro Carlos Pamplona de Oliveira

ACORDAM EM CONFERÊNCIA NO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL

  1. A fls. 441 e seguintes foi proferida a seguinte decisão sumária:

    A., LDA., não se conformando com o acórdão tirado no Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, em 5 de Julho de 2007, recorre para o Tribunal Constitucional ao abrigo dos "artigos 69º e segs." da LTC, nos seguintes termos:

    "[...]

    1. Em primeiro lugar, o presente recurso tem como fundamento a questão da inconstitucionalidade das normas do Regulamento da Taxa pela Realização de Infra-Estruturas Urbanísticas do Município de Lisboa (RTMIEU), aprovado por deliberação da Assembleia Municipal de Lisboa, de 1991.07.11 (v. DM n.º 16276, de 1991.12.20), que prevêem a Taxa pela Realização de Infra-Estruturas Urbanísticas (TRIU), face às normas e princípios consagrados nos arts. 2º, 9º, 18º, 20º, 62º, 103º, 165.º/1/i) e 266º da CRP (v. art. 70º/l/b) da LTC).

    A referida questão de inconstitucionalidade foi suscitada expressamente, além do mais, nos textos nºs. 5 a 10 e conclusão 4.ª das alegações apresentadas em 2006.03.03 pela ora recorrente, neste Venerando Supremo Tribunal.

    2. Em segundo lugar, o presente recurso tem como fundamento a questão da inconstitucionalidade do art. 88º/l/a) e c) do DL 100/84, de 29 de Março, e do art. 1º/4 da Lei 1/87, de 6 de Janeiro, face às normas e princípios constitucionais consagrados nos arts. 2º, 9º, 18º, 20º, 62º, 103º, 165º/1/i), 204º e 268º/4 e 5 da CRP, quando interpretados e aplicados com a dimensão e sentido normativo restritivo que lhe foi atribuído pelo douto acórdão recorrido.

    Com efeito, ao longo de todo o presente processo de impugnação judicial, a ora recorrente sempre invocou e sustentou expressamente o seguinte:

    a) As normas do RTMIEU, que prevêem a TRIU, por criarem uma contribuição especial que tem a natureza de imposto não previsto na lei, são inconstitucionais e inaplicáveis in casu, face às normas e princípios constitucionais consagrados nos arts. 103º/2 e 165º1/i) da CRP — cfr. conclusão 4 e texto n.º s 5 a 10 das alegações apresentadas em 2006.03.03;

    b) Nos termos dos arts. 88º/1/a) e c) do DL 100/84, de 29 de Março, e 1º/4 da Lei 1/87, de 6 de Janeiro, os órgãos e agentes das autarquias locais não podem criar, cobrar e liquidar tributos que não se encontrem previstos na lei – cfr. conclusão 5.ª e texto n.º s 11 a 13 das alegações apresentadas em 2006.03.03;

    c) Os actos de liquidação e cobrança sub judice são nulos, pois não foram praticados ao abrigo de qualquer norma legal ou regulamentar editada nos termos constitucionalmente estabelecidos, violando ainda o princípio reforçado da legalidade tributária e o direito fundamental de propriedade privada, consagrados nos arts. 62º e 103º da CRP - cfr. conclusão 7.ª e texto n.º s 15 a 16 das alegações apresentadas em 2006.03.03.

    O douto acórdão recorrido e o douto acórdão deste Venerando Supremo Tribunal, de 2006.11.29, negaram provimento aos recursos interpostos pela ora recorrente, com base numa interpretação e aplicação restritiva da dimensão e sentido normativos do art. 88º/1/a) e c) do DL 100/84, de 29 de Março, e do art. 1º/4 da Lei 1/87, de 6 de Janeiro, decidindo que tais normas não estabeleceriam a nulidade de actos consubstanciados na exigência de tributos previamente criados por órgãos do Município de Lisboa.

    Para mais preciso enquadramento desta questão, sublinhe-se ainda que nas alegações apresentadas em 2007.02.28, a ora recorrente invocou expressamente o seguinte:

    a) “O entendimento contrário à douta tese sufragada, “acaba, na prática, por permitir o tornear da proibição absoluta da imposição de tributos ilegais aos cidadãos pelas autarquias locais, ao possibilitar a manutenção na ordem jurídica de efeitos decorrentes da aplicação de norma tributária nula, desde que o respectivo recurso não seja interposto no prazo previsto para os actos anuláveis, assim desconsiderando o desvalor que necessariamente tem de estar ligado não só à norma nula como também ao acto que em execução daquela se venha a praticar em dissonância com o que dimana do n.º 3, do art 103.º CRP” (v. Acórdão STA (Plenário), de 2005.04.07, Proc. 01108/03 in www.dgsi.pt)” — fls. 5 das alegações;

    b) “No mesmo sentido, defendeu o Venerando Juiz Conselheiro Benjamim Silva Rodrigues no seu voto de vencido (ao qual aderiram ainda os Venerandos Juízes Conselheiros Fernando Manuel Azevedo Moreira, Rui Manuel Pinheiro Moreira, Isabel Jovita Loureiro dos Santos Macedo e Abel Ferreira Atanásio) no acórdão do STA (Plenário), de 2001.05.30, com o aplauso do Prof. Vieira de Andrade:

    “Quanto a esta sanção jurídica (nulidade), acontece até que ela representa uma opção continuamente reafirmada pelo legislador ordinário parlamentar, no exercício da competência reservada da Assembleia da República (actualmente o art. 165º, nº. 1, alínea q), da CRP), sempre que regulou a matéria das Finanças Locais (arts. 2º, nº. 4, da Lei nº. 42/98; 1’ nº. 4, da Lei 1/97, 1.º n.º 4, do DL nº 98/84 e 1º, nº. 4, da Lei nº. 1/87), e é fundada num princípio estruturante da nossa Lei Fundamental, qual seja o do auto-consentimento da tributação através dos representantes nacionais eleitos pelo Povo princípio do parlamentarismo dos impostos ou da auto-tributação —, e numa obstinada intenção legislativa de impedir aos órgãos locais e criação de impostos (e agora também de taxas) ao arrepio daqueles representantes nacionais, conhecida, como é historicamente, a apetência das comunidades locais para aumentarem as suas receitas mediante a imposição de tributos...” (v. CJA, 43, p.p.45)” — v. fls. 6 das alegações;

    c) “Apesar de se poder entender que a violação de princípios fundamentais constitucionalmente consagrados não implica necessariamente a nulidade dos actos impugnados, desde que tal violação não afecte o núcleo essencial de qualquer direito fundamental (v. art. 13 3º/2/d) do CPA), tal já não sucederá – como se verifica no caso sub judice – quando a lei preveja expressamente a nulidade como consequência jurídica de tal violação, pois a posição contrária conduziria, para usarmos as palavras do Senhor Conselheiro Benjamim Silva Rodrigues, a permitir que entre pela janela o que o legislador não quis deixar entrar pela porta (CJA, 43/45)” – v. fls. 7 das alegações;

    d) “Num acto administrativo é possível distinguir elementos essenciais gerais e elementos essenciais específicos, que Vieira de Andrade designa por elementos essenciais de cada tipo de acto (CJA, n.º 43, p.p. 47-48), escrevendo a propósito:

    “(...) A falta de base legal não pode ser aqui mera causa de anulabilidade, pois que não ofende apenas o princípio geral da legalidade, mas o princípio reforçado da legalidade tributária, associado ao direito de propriedade dos cidadãos” (v. Nulidade ..., CJA, n.º 43. p.p. 46-47; cfr. votos de vencido ao douto Ac. do STA, de 2001.05.30, CJA, n.º 43, p.p. 45)”— v. fls. 11 das alegações;

    e) “Como se decidiu no douto acórdão da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo, de 2000.07.12:

    Em sede de criação de impostos e de sistema fiscal, a competência exclusiva cabe à Assembleia da República, fora o caso de Governo munido de lei autorizada; sendo assim, na hipótese, o acto de liquidação enferma de vício de violação de lei na medida em que resulta evidente a invasão da esfera de atribuições e competências do Poder Legislativo por órgãos da Administração Local.

    A (referida) violação de lei (...) gera sempre, em todos os casos, a invalidade absoluta do acto, ex vi dos arts. 363 ºn.º 1 do C. Adm., 88º n.º 1”do DL 100/84 de 29.3 (LAL) e 133.º n.º2 a) do DL 442/9] de 15.11 (CPA)” (v. Proc. 3239/00; cfr. sentença de 1999.10.29, Proc. 8/95 (Trib. Trib. Porto, 3º Juízo))” — v. fls. 13 das alegações.

    Ao interpretarem e aplicarem restritivamente o art. 88º/1/a) e c) do DL 100/84, de 29 de Março, e o art. 1º/4 da Lei 1/87, de 6 de Janeiro, os referidos arestos aplicaram as referidas normas com uma dimensão e sentido normativos diametralmente opostos aos invocados pela ora recorrente, contrariando assim directamente as normas e princípios constitucionais expressamente invocados nas alegações apresentadas em 2006.03.03 e em 2007.02.28, neste Venerando Supremo Tribunal, designadamente os consagrados nos arts. 62º, 103º/2 e 165º/1/li) da CRP.

    3. Dado que as referidas normas foram aplicadas com uma dimensão e sentido normativos que a ora recorrente sempre reputou de inconstitucionais, cremos ser inquestionável a admissibilidade do presente recurso (v. arts. 70º/1/b) e 72º/2 da LTC).

    [...]"

    Convidada, nos termos do artigo 75º-A da LTC, a esclarecer o Tribunal do "exacto sentido" das normas impugnadas, acrescentou:

    "[...]

    1. ...

    2. Em primeiro lugar, o presente recurso tem como fundamento a questão da inconstitucionalidade das normas do Regulamento da Taxa pela Realização de Infra-Estruturas Urbanísticas do Município de Lisboa (RTMIEU), aprovado por deliberação da Assembleia Municipal de Lisboa, de 1991.07.11 (v. DM n.º 16276, de 1991.12.20), que prevêem a Taxa pela Realização de Infra-Estruturas Urbanísticas (TRIU).

    As normas referidas estabelecem o seguinte:

    “Artigo 1.º

    (Objecto)

    1 - A Taxa Municipal pela Realização de Infra-Estruturas Urbanísticas (TRIIJ) constitui a contrapartida devida ao Município de Lisboa pelas utilidades prestadas ou a prestar aos particulares em matéria de infra-estruturas urbanísticas primárias e secundárias cuja realização, remodelação ou reforço seja consequência de operações de loteamento, de obras de construção, reconstrução ou ampliação de edifícios ou respectivas fracções ou de alterações na utilização destes.

    2 - Para efeitos do presente Regulamento, constituem, designadamente:

    a) Infra-estruturas urbanísticas primárias - arruamentos e estruturas viárias, sistemas de drenagem pública de águas residuais domésticas, industriais e pluviais (contemplando redes...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT