Acórdão nº 181/08 de Tribunal Constitucional (Port, 12 de Março de 2008

Magistrado ResponsávelCons. Carlos Fernandes Cadilha
Data da Resolução12 de Março de 2008
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACORDÃO Nº 181/2008

Processo n.º 754/07

Plenário

Relator: Conselheiro Carlos Fernandes Cadilha

Acordam, em Plenário, no Tribunal Constitucional

I - Relatório

  1. O Partido Comunista Português vem recorrer para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto no n.º 3 do artigo 46º da Lei Orgânica n.º 2/2005, de 10 de Janeiro, da deliberação de 12 de Junho de 2007 da Entidade das Contas e Financiamentos Políticos (adiante, ECFP), que lhe aplicou uma coima no montante de 26 salários mínimos mensais nacionais, correspondente ao total de dez mil quatrocentos e setenta e oito euro, pela prática da contra-ordenação prevista e punida no n.º 2 do artigo 47º dessa Lei.

A deliberação impugnada é do seguinte teor:

I – DOS FACTOS

A Entidade das Contas e Financiamentos Políticos verificou que o Partido Comunista Português (PCP) não comunicou as acções de propaganda política realizadas no decurso do ano de 2005, bem como os meios nelas utilizados que envolveram um custo superior a um salário mínimo mensal nacional, cujo cumprimento era devido até ao dia 31 de Maio de 2006.

Na sequência de deliberação de 19 de Julho de 2006 (constante da acta nº 40 desta Entidade) foi instaurado um processo de contra-ordenação ao PCP e procedeu-se ao levantamento de auto de notícia, no qual foram indicados os factos relativos à infracção, bem como a transcrição das normas jurídicas aplicáveis à situação em causa (constante de fls. 1 e 2, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido).

O PCP foi regularmente notificado do auto de notícia, nos termos e para os efeitos previstos no artigo 50º do DL nº 433/82, 27 de Outubro, na redacção dada pelo DL nº 244/95, de 14 de Setembro – Regime Geral das Contra-Ordenações (adiante designado por RGCO), tendo apresentado a resposta que consta dos autos a fls. 4 e 5.

No seguimento das deliberações tomadas nas reuniões de 12 e 19 de Setembro e 3 de Outubro de 2006 desta Entidade (constantes, respectivamente, das actas nºs 41, 42 e 43), o PCP foi notificado da decisão proferida no âmbito do presente processo de contra-ordenação, por ofício datado de 4 de Outubro de 2006, tendo-lhe sido aplicada a coima de 26 salários mínimos nacionais.

O Partido Comunista Português interpôs recurso da decisão, ao abrigo do nº 3 do artigo 46º da Lei Orgânica nº 2/2005, de 10 de Janeiro.

O Tribunal Constitucional, no Acórdão nº 105/2007 de 14 de Fevereiro de 2007, concedeu provimento ao recurso e declarou nula a decisão por falta de um elemento essencial no processo decisório da Entidade das Contas e Financiamentos Políticos – a deliberação individualizada do órgão sobre o processo em concreto – não se pronunciando sobre as demais questões suscitadas pelo recorrente.

Devolvidos os autos a esta Entidade e atendendo ao facto de o Acórdão proferido não obstar à tomada de deliberação por parte da Entidade, prosseguiu-se com o processo de contra-ordenação.

Apreciados os autos e no seguimento da resposta que já tinha sido oferecida pelo PCP ao auto de notícia, foi este ainda notificado para se pronunciar, nos termos do artigo 50º do RGCO, sobre uma lista discriminativa das acções de propaganda política levadas a cabo por aquele partido no decurso do ano de 2005, susceptíveis de integrar a previsão constante do artigo 16º, nº 2, da Lei Orgânica nº 2/2005, de 10 de Janeiro (cfr. fls. 56 e 57 que aqui se dão por integralmente reproduzidas).

Da referida lista constam as acções de propaganda política desenvolvidas pelo partido em causa, não integradas em campanhas eleitorais, inventariadas pelos serviços da ECFP, com base em informação oficiosamente recolhida ao longo do ano de 2005 e cruzada com os dados constantes das contas partidárias prestadas.

O PCP respondeu por carta recebida no dia 11 de Maio de 2007 (cfr. fls. 66).

II – DO DIREITO

  1. Entidade competente para o processamento da contra-ordenação e a aplicação da coima

    É da competência da Entidade das Contas e Financiamentos Políticos (adiante designada por ECFP), a aplicação das sanções previstas na Lei Orgânica nº 2/2005, de 10 de Janeiro, isto é, a aplicação das coimas aos mandatários financeiros, candidatos às eleições presidenciais, primeiros candidatos de cada lista, primeiros proponentes de grupos de cidadãos eleitores e partidos políticos, pelo incumprimento dos deveres de comunicação e de colaboração (artigos 46º, nº 2, e 47º da Lei Orgânica nº 2/2005 mencionada).

    Das decisões da ECFP cabe recurso de plena jurisdição para o Tribunal Constitucional, em plenário (artigo 46º, nº 3, do mesmo diploma).

  2. As normas aplicáveis

    As matérias relativas ao financiamento dos partidos políticos e das campanhas eleitorais encontram expressão legal na Lei nº 19/2003, de 20 de Junho, e na Lei Orgânica nº 2/2005, de 10 de Janeiro.

    Os mencionados diplomas legais entraram em vigor no início de 2005 e introduziram diversos aspectos inovadores comparativamente ao quadro legal anteriormente aplicável e que consistem, entre outros, na ampliação e reforço das atribuições da nova entidade fiscalizadora, no acréscimo de deveres e obrigações dos partidos e candidaturas, na introdução de novos comandos ao nível das receitas e despesas e num quadro sancionatório mais penalizador, prevendo, nalgumas situações, a pena de prisão.

    No actual regime do financiamento dos partidos e das campanhas está instituído o dever de comunicação de dados à ECFP (artigo 16º, nºs 2, 3 e 5 da Lei Orgânica nº 2/2005, de 10 de Janeiro, e acessoriamente o nº 1 do artigo 26º da Lei nº 19/2003, de 20 de Junho).

    Conforme o disposto no artigo 16º da Lei Orgânica nº 2/2005, os partidos políticos estão obrigados a comunicar à Entidade as acções de propaganda política que realizem, bem como os meios nelas utilizados, que envolvam um custo superior a um salário mínimo nacional, até à data de entrega das contas dos partidos.

    Tal obrigação de comunicação de dados é independente da obrigação de prestação das contas e não se confunde com esta, quer ao nível das regras que regulam o seu cumprimento, quer ao nível da punição, em caso de incumprimento.

    Apesar do prazo de cumprimento dessa obrigação se reportar ao limite do prazo para entrega das contas anuais dos partidos, a comunicação de dados em causa nos presentes autos é uma obrigação autónoma e, por isso, não integrada na prestação de contas.

    É pressuposto da vida de qualquer partido político realizar acções de propaganda política para atingir os seus fins próprios. Estamos a falar das actividades permanentes dos partidos políticos de difusão – nas suas variadas formas – dos programas partidários e das ideias e posições políticas com o objectivo último de manter a fidelidade dos seus filiados e apoiantes e de angariar a confiança dos indecisos e restante eleitorado.

    Em suma, trata-se de qualquer actividade que seja relevante para a formação ou determinação da consciência política de qualquer cidadão, distinguindo-se das actividades estritamente eleitorais, necessariamente efémeras.

    A violação do preceito acima referido constitui contra-ordenação punível nos termos do artigo 47º do mesmo diploma, sob a epígrafe “Incumprimento dos deveres de comunicação e colaboração” e cujo teor é o seguinte:

    1 - Os mandatários financeiros, os candidatos às eleições presidenciais, os primeiros candidatos de cada lista e os primeiros proponentes de grupos de cidadãos eleitores que violem os deveres previstos nos artigos 15.º e 16.º são punidos com coima mínima no valor de 2 salários mínimos mensais nacionais e máxima no valor de 32 salários mínimos mensais nacionais.

    2 - Os partidos políticos que cometam a infracção prevista no n.º 1 são punidos com coima mínima no valor de 6 salários mínimos mensais nacionais e máxima no valor de 96 salários mínimos mensais nacionais.

    (sublinhado nosso).

    III – DA DEFESA

    O Partido Comunista Português foi regularmente notificado nos termos e para os efeitos do artigo 50º do RGCO.

    Assim, em fase de audiência escrita, o PCP pronunciou-se nos termos que constam de fls. 4, 5 e 66 e que aqui se dão aqui por integralmente reproduzidos.

    Em síntese e sobre os factos do presente processo:

    - Quanto ao teor do auto de notícia, assumiu o incumprimento da obrigação de comunicação de dados referente ao ano de 2005 e indicou as respectivas razões.

    - Quanto à lista discriminativa das acções de propaganda política, invocou, sem especificar e documentar, que algumas das acções tiveram lugar no âmbito de campanhas eleitorais, outras tiveram um custo inferior a um SMN e o pagamento de alguns almoços e jantares foi efectuado por cada um dos participantes, confirmando, ainda, tudo quanto foi alegado na resposta ao auto de notícia.

    IV – FUNDAMENTAÇÃO

    O Partido Comunista Português, em resposta à contra-ordenação admitiu a falta cometida e alegou razões para o incumprimento do dever a que estava obrigado, em concreto a novidade da lei, o número reduzido de acções políticas em virtude da realização de eleições consecutivas e a falta de condições logísticas.

    Todavia, as razões apontadas, generalizadas a todos os partidos políticos, não relevam em termos de verificação ou não da infracção, nem excluem a culpa do arguido e a ilicitude do facto.

    Por outro lado, apesar de referir a inaplicabilidade da lei relativamente a algumas das acções contidas na lista que lhe foi comunicada, não especifica a que acções se refere, nem apresenta os elementos probatórios pertinentes.

    Dessa lista constam acções realizadas pelo Partido Comunista Português no decurso do ano de 2005, tendo cada uma delas um custo muito superior a 1 SMN.

    Como já se referiu, as referidas acções foram monitorizadas pelos serviços da ECFP e efectuado o devido cruzamento com as informações constantes das contas anuais prestadas por aquele partido.

    Os custos havidos com a realização desses eventos partidários e propagandísticos caem na previsão legal constante do artigo 16º, nº 2, da Lei Orgânica nº 2/2005, já identificada e, nessa medida, deveriam ter sido comunicados à ECFP, o que não ocorreu.

    A conduta de não...

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