Acórdão nº 186/08 de Tribunal Constitucional (Port, 13 de Março de 2008

Magistrado ResponsávelCons. Ana Guerra Martins
Data da Resolução13 de Março de 2008
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 186/2008

Processo n.º 1203/07

  1. Secção

Relatora: Conselheira Ana Guerra Martins

Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional

I – RELATÓRIO

  1. Nos presentes autos, vindos do Supremo Tribunal de Justiça, em que é recorrente A., Lda. e recorrido Icor – Instituto para a Construção Rodoviária, a Relatora proferiu a seguinte decisão sumária:

    I – RELATÓRIO

    1. Nos presentes autos, em que figura como recorrente A., Lda e como recorrido Icor – Instituto para a Construção Rodoviária, vindos do Supremo Tribunal de Justiça, a primeira veio interpor recurso de acórdão proferido por aquele tribunal em 02 de Outubro de 2007 (fls. 469 a 479), ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da LTC, para que seja apreciada a constitucionalidade “dos artºs 70º-1 e 71º do Código das Expropriações, aprovado pela Lei nº 168/99, de 18.09, na interpretação que lhes é dada de que a contagem de juros moratórios é dependente da notificação (interpelação) do dito artº 71º” (fls. 502).

    Cumpre apreciar e decidir.

    II – DA FUNDAMENTAÇÃO

    2. Por força do n.º 1 do artigo 78º-A da LTC, pode ser proferida decisão sumária quando a questão a decidir se revestir de simplicidade. Ora, a questão da inconstitucionalidade da norma extraída da conjugação do n.º 1 do artigo 70º e do n.º 1 do artigo 71º do Código de Expropriações de 1999 [de ora em diante identificado por CExp1999] já foi alvo de jurisprudência deste Tribunal, no sentido da sua não inconstitucionalidade, ainda que a propósito de disposição similar: o então artigo 100º do Código de Expropriações de 1976 [de ora em diante identificado por CExp1976].

    O referido n.º 1 do artigo 100º do CExp1976 determinava que:

    “1. Fixado por trânsito em julgado o valor da indemnização a pagar pelo expropriante, será este notificado para o depositar na Caixa Geral de Depósitos no prazo de dez dias, excepto se já tiver sido decidido, ainda que sem trânsito em julgado, o pagamento em prestações.”

    A propósito desta norma pronunciou-se este Tribunal, no Acórdão n.º263/98, de 05 de Março de 1998 (publicado in «Diário da República», Série II, n.º 157, de 10 de Julho de 1998, pp. 9576 e segs), com relevância para os presentes autos, do seguinte modo:

    “Ao contrário do que supõem os recorrentes, os artigos 62º, nº 2, e 13º, nº 1, da Constituição não impõem que, por eles no caso dos autos, ocorresse a constituição em mora da entidade expropriante com a simples prolação da decisão da primeira instância. O acórdão recorrido (tal como o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 21 de Abril de 1994) entendeu que, com o recurso interposto daquela decisão pelo Município de Felgueiras e pelos expropriados, a mesma não tinha ainda transitado em julgado, acrescentando o mesmo acórdão que a indemnização apenas se tornou líquida com a prolação do Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 25 de Junho de 1991, pelo que antes disso não podia a entidade expropriante ser constituída em mora.

    Fez apelo o acórdão aqui sub judicio à regra constante da primeira parte do nº 3 do artigo 805º do Código Civil, segundo a qual "se o crédito for ilíquido, não há mora enquanto se não tornar líquido, salvo se a falta de liquidez for imputável ao devedor". Ou seja: aplicou aquele aresto o princípio "in illiquidis non fit mora", temperado embora pela possibilidade de o credor alegar e provar que a falta de liquidez se deve a comportamento (acção ou omissão) imputável ao devedor - o que, manifestamente, nestes autos, o recorrente não curou de fazer.

    Aquele preceito da lei civil sempre foi unanimemente entendido na doutrina e jurisprudência como significando que só existe mora depois de fixado, em definitivo, pelo tribunal o quantitativo da indemnização: enquanto durar a acção, não há liquidação da dívida, já que - embora o pedido formulado fosse eventualmente líquido - não o é a indemnização.

    Assim sendo - e em face da regra constante da primeira parte do nº 3 do artigo 805º do Código Civil -, a interpretação dada pelo acórdão recorrido à norma do nº 1 do artigo 100º do Código das Expropriações de 1976 não traduz a fixação de qualquer regime excepcional em desfavor do expropriado: tal como qualquer outro credor, ele só vê o seu devedor constituir--se em mora quando se tornar certo e líquido, por decisão judicial definitiva, o montante indemnizatório em litígio.

    Eis, pois, as razões pelas quais a norma do artigo 100º, nº 1, do Código das Expropriações, aprovado pelo Decreto-Lei nº 845/76, de 11 de Dezembro, não viola os artigos 62º, nº 2, e 13º, nº 1, da Constituição, nem qualquer outra norma ou princípio constitucional.”.

    A actual redacção do n.º 1 do artigo 71º do CExp1999 determina que:

    “1. Transitada em julgado a decisão que fixar o valor da indemnização, o juiz do tribunal de 1ª instância ordena a notificação da entidade expropriante para, no prazo de 10 dias, depositar os montantes em dívida e juntar ao processo nota discriminada, justificativa dos cálculos da liquidação de tais montantes.”

    Daqui decorre que a actual redacção do preceito legal que corporiza a norma objecto do presente recurso se afigura ainda mais garantística dos direitos dos expropriados, visto que, por um lado, esclarece que cabe ao juiz de 1ª instância a notificação da entidade expropriante e, por outro lado, emprega uma forma verbal do verbo “ordenar” que não deixa sombra de dúvidas sobre a imposição de um dever de notificação, o mais célere possível, do expropriante.

    Não tendo havido qualquer inflexão da jurisprudência consagrada no citado acórdão, deve a mesma ser aplicada ao caso presente. Com efeito, por argumento de maioria de razão, se este Tribunal já considerou que a redacção do anterior n.º 1 do artigo 100º do CExp1976 não era inconstitucional por confronto com o princípio da igualdade (artigo 13º da CRP), muito menos será inconstitucional a presente redacção literal do n.º 1 do artigo 71º do CExp1999.

    A redacção literal desta norma visa precisamente reforçar o dever de notificação do expropriante pelo juiz de primeira instância, evitando que aquele possa ser alvo de juros moratórios (nos termos do artigo 70º CExp 1999) sem que tenha sido previamente interpelado para proceder ao pagamento do montante indemnizatório. Deste modo, é absolutamente evidente que não se vislumbra que a norma extraída da conjugação entre o n.º 1 do artigo 70º e o n.º 1 do artigo 71º do CExp1999 incorra em qualquer violação do princípio da igualdade (artigo 13º da CRP).

    Em suma, reitera-se a fundamentação e o sentido da jurisprudência anterior deste Tribunal – v.g., do Acórdão n.º 263/98, de 05 de Março de 1998 –, que é integralmente aplicável aos presentes autos, por argumento de maioria de razão.

    II. DECISÃO

    Nestes termos, e ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 78º-A da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 13-A/98, de 26 de Fevereiro, decide-se não julgar inconstitucional a norma resultante da conjugação do n.º 1 do artigo 70º e do n.º 1 do artigo 71º do Código de...

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