Acórdão nº 357/08 de Tribunal Constitucional (Port, 02 de Julho de 2008

Magistrado ResponsávelCons. Carlos Fernandes Cadilha
Data da Resolução02 de Julho de 2008
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 357/2008

Processo n.º 46/08

  1. Secção

Relator: Conselheiro Carlos Fernandes Cadilha

Acordam na 3ª Secção do Tribunal Constitucional

I. Relatório

Na presente acção declarativa, com processo ordinário, que a Câmara Municipal de Ponte da Barca intentou contra A., Lda., julgada procedente na primeira instância e em apelação, veio a Ré ínterpor recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, que, tendo sido admitido como revista, foi julgado deserto por falta de alegações.

A Ré, através do mandatário que, ao abrigo de um substabelecimento com reserva, motivara o recurso de apelação, veio arguir a nulidade do despacho que julgou deserto o recurso com o fundamento de lhe não ter sido notificado o acórdão da Relação.

A nulidade foi desatendida, na Relação, por despacho do relator, confirmado em conferência, pelo que a Ré agravou desta decisão para o Supremo Tribunal de Justiça (STJ), pedindo a sua revogação e a consequente notificação ao mandatário com poderes substabelecidos do acórdão que conheceu do recurso de apelação.

Invocou para tanto, em síntese, que, tendo sido emitido substabelecimento com reserva, passaram a existir no âmbito do processo dois mandatários, pelo que se não podia ignorar que era ao mandatário com poderes substabelecidos que deviam ser também efectuadas as notificações de todos os actos processuais que se seguiram àquele em teve a primeira intervenção, devendo efectuar-se uma interpretação conjugada das normas dos artigos 36.°, n.° 3, 253.° e 254.° do Código de Processo Civil (CPC) com o disposto no artigo 20 °, n.° 2, da Constituição da República (CRP), sob pena de inconstitucionalidade por violação desta referida disposição constitucional.

Por acórdão de 4 de Dezembro de 2007, o STJ negou provimento ao agravo, com base na seguinte fundamentação:

1.1- O mandato judicial, que pode ser conferido por instrumento público ou documento particular ou mesmo por declaração verbal da parte no auto de qualquer diligência processual (art. 35º do CPC), confere ao mandatário poderes para representar a parte em todos os actos e termos do processo (nº 1 do art. 36º do CPC).

E preconiza o nº 2 do mesmo art. que nos poderes que a lei presume conferidos ao mandatário está incluído o de substabelecer o mandato.

Com o substabelecimento o mandatário está a investir uma outra pessoa, igualmente habilitada, nos poderes de representação forense da parte e no dever de os exercer, como refere Castro Mendes [Direito Processual Civil, II, pág. 141].

O substabelecimento pode ser com ou sem reserva. Enquanto nesta segunda hipótese se verifica a exclusão do primitivo mandatário, tal como decorre do nº 3 do mesmo art. 36º, já no substabelecimento com reserva, a parte fica representada por dois mandatários, cada um deles com plenos poderes para praticar actos processuais em representação da parte. O substituinte não é, neste caso, excluído da posição representativa, subsistindo antes dois mandatos.

Desde que o substabelecimento não contenha qualquer limitação, ambos os mandatários ficam com iguais poderes de representação da parte.

O mandatário judicial constituído no processo, sempre que o juiz ou a lei processual o determinem, tem de ser notificado de todos os actos que se vão praticando, para assumir as suas competências e obrigações funcionais.

Esta omissão é geradora de nulidade porquanto é susceptível de influir no exame ou decisão da causa, em conformidade com o disposto no nº 1 do art. 201º do CPC.

A notificação do advogado é feita nos termos e com as formalidades previstas no art. 254º do CPC, sendo a respectiva carta registada enviada para o escritório ou domicílio por ele escolhido.

Enviada para essa direcção, mesmo que devolvida a carta, tem-se a notificação por efectuada, em conformidade com o preceituado no nº 4 do art. 254º.

Em caso de substabelecimento com reserva, assumindo ambos os advogados plenos poderes de representação, as notificações a fazer no processo poderão ser feitas a qualquer deles, nos respectivos escritórios.

Só assim não acontecerá se tiver sido escolhido domicílio específico para recebimento das notificações, situação em que as mesmas serão então dirigidas para esse domicílio.

Na situação vertente, o primitivo mandatário substabeleceu com reserva num outro advogado, substabelecimento não direccionado para a prática de qualquer acto judicial específico. Depois e como se consignou no acórdão recorrido, não foi escolhido domicílio próprio para recebimento das notificações.

Assim sendo, as notificações podiam ser feitas a qualquer dos advogados, tanto ao primitivo como ao substabelecido.

A notificação do acórdão proferido na Relação foi correctamente efectuada quando dirigida para o escritório do primitivo mandatário, pelo que de nenhuma irregularidade padece.

1.2- Sustenta ainda a recorrente que, ao admitir-se que apenas um dos advogados devia ser notificado, está-se a limitar a escolha de mandatário para a prática de actos específicos no âmbito do processo e, como tal, a violar o princípio constitucional vertido no art. 20º da Constituição da República.

O art. 20º da Constituição da República reconhece vários direitos, direitos esses que integram o direito geral de protecção jurídica.

Esse direito abarca normativamente, desde logo, o direito que a todos é reconhecido de se fazer acompanhar por advogado perante qualquer autoridade – nº 2 do citado art. 20º.

Este direito não foi cerceado à recorrente que, em vez de um só mandatário forense, passou a ter mais do que um com o substabelecimento com reserva. E a todos eles foi reconhecido o direito de intervirem processualmente.

Agora o que a lei ordinária impõe é que só um desses advogados seja notificado dos actos processuais. E isto para evitar a anarquia processual relacionada com a verdadeira contagem de prazos que resultaria da notificação a todos e cada um desses advogados.

Este entendimento mostra-se perfeitamente razoável e proporcionado, não podendo ver-se na notificação dos actos processuais apenas a um desses advogados uma limitação do direito de acompanhamento pleno por advogado.

E este direito fundamental não foi afectado, na sua essência, por essa regra processual, porquanto a recorrente não viu cerceado o direito à escolha de mandatário, nem à intervenção no processo de qualquer um dos advogados escolhidos.

Daí que a interpretação dos arts. 36º e 254º do CPC com aquele sentido não enferme de qualquer inconstitucionalidade.

Inconformada com o assim decidido, a Ré veio interpor recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70° da Lei do Tribunal Constitucional, pretendendo a apreciação da constitucionalidade das normas dos artigos 36º, n.º 3, 253° e 254º do CPC, quando interpretadas no sentido de que não existe obrigatoriedade de notificar os advogados/mandatários intervenientes no processo de forma a poderem tramitá-lo da forma mais correcta à protecção dos interesses do seu constituinte, por violação do direito de livre escolha do mandatário da parte consagrado no artigo 20º, n.º 2, da CRP:

Nada tendo obstado ao prosseguimento do recurso, no Tribunal Constitucional, os arguidos apresentaram as suas alegações, formulando as seguintes conclusões:

  1. No acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, foi decidido que: “A notificação do acórdão proferido na Relação foi correctamente efectuada quando dirigida para o escritório do primitivo mandatário, pelo que de nenhuma irregularidade padece.”

  2. Concluindo que: “Daí que a interpretação dos arts. 36.° e 254.° do CPC com aquele sentido não enferma de qualquer inconstitucionalidade.”

  3. De facto, o recorrente, salvo o devido respeito, entende que não assiste qualquer razão nos (aliás, escassos) fundamentos invocados no acórdão a quo para sustentar a sua decisão.

  4. Por isso mesmo se interpõe o presente recurso, através do qual se pretende ver apreciada a constitucionalidade dos artigos 36°, n.º 3, 253.° e 254.° do CPC, que deverão ser apreciados à luz do que é consagrado no artigo 20.° da Constituição da República Portuguesa.

  5. Ora o artigo 20.° da CRP estabelece um direito geral e efectivo à protecção jurídica, o...

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