Decisões Sumárias nº 593/13 de Tribunal Constitucional (Port, 17 de Outubro de 2013

Magistrado ResponsávelCons. Maria José Rangel de Mesquita
Data da Resolução17 de Outubro de 2013
EmissorTribunal Constitucional (Port

DECISÃO SUMÁRIA N.º 593/2013

Processo n.º 794/13

  1. Secção

Relator: Conselheira Maria José Rangel de Mesquita

I – Relatório

  1. Nos presentes autos, vindos do Supremo Tribunal de Justiça, em que é recorrente A. e recorrido o Ministério Público, foi interposto recurso, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 280.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei do Tribunal Constitucional (LTC) aprovada pela Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, na redação que lhe foi dada pela Lei n.º 13-A/98, de 26 de fevereiro, da decisão proferida pelo Supremo Tribunal de Justiça, em 9/08/2013 (fls. 202-207), que indeferiu a reclamação deduzida contra a não admissão, pelo relator na 2ª instância, do recurso interposto para o Supremo Tribunal de Justiça do Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 3/12/2012 que, mantendo a decisão condenatória de 1ª instância, reduziu as penas, parcelar e única, aplicadas à arguida, fixando em sete anos e seis meses a pena aplicada pelo crime de tráfico de estupefacientes agravado, p. p. pelos artigos 21º, n.º 1, e 24.º, alínea c), do Código Penal por referência às tabelas I-A e I-B anexas ao Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro, e em oito anos a pena única.

    2. A recorrente veio interpor um recurso de constitucionalidade desta decisão, nos seguintes termos (cfr. 219-223):

    A., arguida nos presentes autos, notificada do indeferimento da Reclamação apresentada, no que toca à não admissão do Recurso, VEM, ao abrigo do disposto na alín. b) do n.º 1 do art.° 70°, da Lei do Tribunal Constitucional, INTERPOR RECURSO, para o Digníssimo Tribunal Constitucional, nos termos e pelos fundamentos seguintes termos;

    A arguida foi condenada na 2ª Vara Criminal do Porto, a 8 anos e 6 meses de prisão, pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes agravado, p. e p. pelos artºs 21°, n" 1 e 24°, al. c), por referência às tabelas I-A e I-B anexas ao Dec.-Lei n.º 15/93, de 22/01 e um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo artº 86°, n.º 1, al. c), da Lei nº 5/2006, de 23/02, na redação da Lei n° 17/2009, de 06/05.

    Inconformada interpôs recurso para o Digníssimo Tribunal da Relação do Porto, por entender que a sua conduta preenchia, no máximo, um crime de Tráfico de Menor Gravidade (art.º 25° DL 15/93).

    Por outro lado, atentas as suas condições pessoais, desejar ressocializar se, deveria ser-lhe aplicada uma pena mais leve, atenuada, próxima do seu mínimo legal, o que satisfaria os fins de prevenção geral e especial, devendo ser suspensa na sua execução, mostrando-se violados os art.s 70° e 71° do CP; 25.° da Lei 15/93 e 32.° da CRP.

    Assim não entendeu o Digno Tribunal da Relação do Porto, que apenas operou uma redução da pena única para 8 anos de prisão.

    Dessa decisão, interpôs a arguida recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, tendo o mesmo sido indeferido nos termos dos art.°s 400.° n.º 1 alín. f) do CPP e art. 432° n.º 1 alín b) e c) do mesmo diploma.

    Ora, no caso em apreço estamos perante uma situação de uma confirmação pela Relação, de uma Decisão da primeira instância de 8 anos e seis meses, e operando uma redução da pena única para 8 anos de prisão.

    O direito ao recurso inscreve-se numa manifestação fundamental do direito de defesa; no direito a um processo justo, decidido em tempo razoável, por um tribunal independente, imparcial e regulado por lei, como resulta dos arts. 8.° e 10.° da Declaração Universal dos Direitos do Homem, e dos arts. 6.° e 13.° da CEDH, que, por via de regra não demanda o seu exercício em mais de um grau, e é decidido por um tribunal superior àquele de que se recorre.

    De acordo com o Douto Acórdão n.º 422/2005 do Tribunal Constitucional de 17 de agosto, para se respeitar o direito ao recurso constitucionalmente garantido no n.º 1 do art.°32° CRP, a possibilidade de interposição, pelo arguido, de recurso de decisões penais desfavoráveis tem de ser uma possibilidade real e efetiva e não meramente fictícia.

    Parte da jurisprudência vem invocando, contra a solução que identifica a pena aplicável com a pena aplicada na decisão condenatória que não possa ser agravada pelo tribunal ad quem por se tratar de recurso interposto apenas pela defesa ou no interesse da defesa, milita decisivamente a perversão do princípio da proibição da reforrnatio in pejus que está na sua base.

    Não é aceitável que esta garantia fundamental do direito ao recurso do arguido, que visa tornar efetiva a possibilidade de exercício desse direito, possa ser lançada precisamente contra o arguido, impedindo-o de recorrer.

    Posição que foi também muito recentemente subscrita pelo Ac. n.º 628/2005, em que, pela primeira vez e contra jurisprudência anterior, o Tribunal Constitucional concluiu pela inconstitucionalidade daquela interpretação que identifica pena aplicável com pena aplicada limitada pelo princípio da proibição da reformatio in pejus.

    É de saudar, portanto, a proposta, pela qual, caso mereça consagração legal, se tornará inequívoco que o condenado pela relação em pena concreta de prisão não superior a 8 anos, por crime abstratamente punível com pena de prisão superior a 8 anos, poderá recorrer para o Supremo Tribunal de Justiça.

    …. «Num caso de sucessão de leis penais, havendo normas mais favoráveis num e noutro dos regimes, há que comparar as consequências concretas que da aplicação de uma e outra lei resultam e aplicar de maneira completa aquela cujos resultados sejam menos gravosos para o arguido.»

    Assim, analisando ambos os regimes penais, facilmente concluímos que o anterior é mais favorável à arguida.

    Como refere Germano Marques da Silva, in Direito Penal Português, I, 2001, p. 281, «para se determinar se uma Lei é mais favorável ao arguido do que outra, avaliam-se as consequências no seu conjunto e no caso concreto» (ponderação concreta).

    Pertinentemente, Américo Taipa de Carvalho, in Sucessão de Leis Penais, 2ª ed, Coimbra Editora, 1997, p. 191, salienta que não é necessário proceder a uma avaliação concreta, quando é evidente, numa simples consideração abstrata, que uma das Leis é claramente mais favorável que a outra.

    O que se verificou no caso em apreço.

    Discutida na Doutrina é a questão de saber se a ponderação deve ser unitária ou diferenciada.

    Ponderação unitária significa que é a Lei na sua totalidade, na globalidade das suas disposições, que deve ser aplicada; a ponderação diferenciada, considerada a complexidade de cada uma das Leis e a relativa autonomia de cada uma das disposições, defende que deve proceder-se ao confronto de cada uma das disposições de cada Lei, podendo, portanto, acabar por se aplicar ao caso sub judice, disposições de ambas as Leis (vide Taipa de Carvalho, ob. Cit., p. 192, 193).

    A doutrina maioritária entende que se deverá optar pela ponderação unitária, pois, caso contrário, o Julgador estaria a criar novos regimes, e não a aplicar o mais favorável de entre os vigentes desde a prática do ilícito até à decisão, violando, desse modo, o princípio da separação de poderes.

    O STJ, por Ac. de 03/11/2005, publicado no DR Série I-A, de 19/12/2005 (Ac. nº 11/2005) decidiu que «sucedendo-se no tempo Leis sobre o prazo de prescrição do procedimento contraordenacional, não poderão combinar-se, na escolha do regime concretamente mais favorável, os dispositivos mais favoráveis de cada uma das Leis concorrentes».

    Aliás, tal Venerando Tribunal, na motivação do Assento publicado em 17/03/1989, ao defender uma ponderação global e aplicação de uma das Leis em bloco, considerou que «não é lícito construir regimes particulares pela conjugação de elementos de uma e outra Lei, com prejuízo da quebra de coerência e a obtenção de um resultado aberrante, ainda que concretamente vantajoso para o agente».

    Assim, deve aplicar-se o CPP anterior ao caso em apreço, por ser mais favorável...

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