Acórdão nº 3/13 de Tribunal Constitucional (Port, 09 de Janeiro de 2013

Magistrado ResponsávelCons. Maria José Rangel de Mesquita
Data da Resolução09 de Janeiro de 2013
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 3/2013

Processo n.º 735/12

  1. Secção

Relatora: Conselheira Maria José Rangel de Mesquita

Acordam na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional:

I – Relatório

  1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal da Relação de Coimbra, em que são recorrentes 1) A. 2) B., C., D., E., F. e G., e recorrido o MINISTÉRIO PÚBLICO, o primeiro vem interpor recurso, ao abrigo das normas dos «artigos 69.º, 70.º n.º 1 al. b), n.º 2 e 3, 71º, 75º e 75º-A», da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, na sua atual versão (LTC) e os demais recorrentes vêm interpor recurso ao abrigo do «artigo 70º n.º 1-b)» da mesma Lei, do acórdão proferido, em conferência, pelo Tribunal da Relação de Coimbra, em 14 de Agosto de 2012 (cfr. fls. 11650 a 11658).

  2. Os recorrentes interpuseram recurso para este Tribunal com os seguintes fundamentos.

    2.1 O primeiro recorrente, A., nos termos seguintes (cfr. fls. 11672 a a 11684):

    (…) 1 - A norma cuja inconstitucionalidade se pretende que o Tribunal Constitucional aprecie é a do artigo 107.° n.º 6 do Código de Processo Penal, conjugada com os arts. 103° nºs 1 e 2-a), 104°, e 411° n°s 1-b), 2, 3 e 4 do C.P.P.; 144° n°s 1 e 2, 145° n° 3, e 677° do C.P.C. e 12° e 122° n°s 1 e 3 da Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais (LOFTJ), no entendimento do Tribunal da Relação de Coimbra que deve ser julgada a extemporaneidade de recurso interposto nos termos de prazo fixado por despacho (não recorrido) do juiz de 1ª instância, ao abrigo do art. 107° no 6 do C.P.P., quando o Tribunal de recurso entenda que a 1ªinstância aplicou erroneamente tal norma legal, e entenda que mesmo com a prorrogação, o prazo máximo do recurso seria 30 das, tal entendimento é inconstitucional, por violação dos princípios constitucionais da proteção da confiança e do processo equitativo, bem como do direito ao recurso e das garantias de defesa consagradas nos art.°s 203.°, 20.° n.° 1 e 32.° n.º 1 da Constituição da República Portuguesa. (…)

    .

    O recorrente afirma ainda que suscitou a questão de constitucionalidade no requerimento de fls. 11211 a 11219:

    (…) 34 – Face ao supra exposto, e por se entender que a interpretação do Venerando Tribunal da Relação de Coimbra é inconstitucional ter sido arguida, tempestivamente, nomeadamente no requerimento de fls. 11211/11219, se requer que seja admitido o presente recurso, com as naturais consequências legais (…).

    .

    2.2 O segundo e os demais recorrentes, B. e outros, nos termos seguintes (cfr. fls. 11700 a 11712):

    (…) I-CRONOLOGIA (…)

    II - O ENTENDIMENTO NORMATIVO EM APREÇO

    20º

    Segundo o acórdão recorrido, o art. 107° n° 6 do C.P.P. limitar-se-ia a admitir a prorrogação do prazo de 20 dias previsto no art. 411° n° 1 e 3 do C.P.P. até 30 dias, querendo com isto dizer que só se poderia fixar no conjunto um prazo máximo de 30 dias. E que, havendo reapreciação da matéria de facto com recurso à prova gravada, o prazo também no poderia exceder 30 dias. Em qualquer caso, nunca o prazo poderia exceder 30 dias.

    21°

    Os Recorrentes entendem que a interpretação da lei, efetuada pelo acórdão recorrido, está errada, mas, como é evidente, não é isso que constitui o objeto do presente recurso,

    22°

    o qual, antes versa sobre uma dada interpretação normativa que viola — ressalvado o devido respeito, em termos até chocantes — princípios constitucionais elementares.

    23°

    No presente recurso, está em causa a interpretação normativa, adotada pelo acórdão recorrido da Re1aço de Coimbra, que decorre das passagens acima transcritas nos arts. 16° a 19° deste requerimento e de onde é extraída a tese da extemporaneidade de recurso interposto nos termos de prazo fixado por despacho (não recorrido) do juiz de 1a instância, ao abrigo do art. 107° n° 6 do C.P.P.

    24°

    Tal interpretação normativa — expressa ou implícita — dada aos arts. 103° nºs 1 e 2-a), 104°, 107° n° 6 e 411° nos 1-b), 2, 3 e 4 do C.P.P.; 144° n°s 1 e 2, 145° nº 3, e 677° do C.P.C., e 12° e 122° n°s 1 e 3 da Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais (LOFTJ), aprovada pela Lei n° 3/99, de 13/01, conjugadamente considerados (total ou parcialmente), no sentido em que deve ser julgada a extemporaneidade de recurso interposto nos termos de prazo fixado por despacho (não recorrido) do juiz de 1a instância, ao abrigo do art. 107° n° 6 do C.P.P., quando o tribunal de recurso entenda que a 1ª instância aplicou erroneamente tal norma legal, é inconstitucional, por violação dos princípios constitucionais da proteção da confiança e do processo equitativo, bem como do direito ao recurso e das garantias de defesa consagradas no art. 32° n° 1 da CRP.

    25°

    Tal inconstitucionalidade foi arguida nos requerimentos dos Recorrentes supra referidos nos n°s 13 e 14, tal como já o tinha sido no recurso efetuado para o Supremo Tribunal de Justiça (cfr. supra n° l1).

    26°

    O acórdão recorrido não se pronuncia expressamente sobre a inconstitucionalidade arguida, mas é indubitável que o faz implicitamente, tendo em conta que a inconstitucionalidade fora suscitada e a Relação de Coimbra discorre abundamente sobre o texto constitucional, concluindo que, em nenhuma situação ou sob qualquer perspetiva, se pode adotar um entendimento normativo que valide um prazo fixado por despacho judicial que ultrapasse, para este efeito, um prazo máximo de 30 dias.

    27°

    É pois inequívoco que o entendimento adotado teve em conta a inconstitucionalidade tempestivamente arguida.

    28°

    Por mera cautela, caso assim se não entenda, então deve considerar-se arguida a nulidade do acórdão ora recorrido por omissão de pronúncia quanto a essa questão concretamente suscitada.

    29°

    O presente recurso é interposto ao abrigo do art. 70º n° 1-b) da LTC.

    Termos em que o presente recurso deve ser admitido, com as legais consequências. (…)

    .

    II - Fundamentação

  3. Dos documentos juntos aos autos, tem-se por assente, com relevância para a decisão, o seguinte:

    3.1 Por decisão proferida em 1.ª instância pelo Tribunal Judicial de Mangualde, o primeiro, o segundo e os demais recorrentes foram condenados nas seguintes penas: A. na pena única de dezassete anos de prisão, B. na pena conjunta de doze anos de prisão, C. na pena de três anos e oito meses de prisão, suspensa por igual período, D., E., F. e G., cada um na pena de um ano e três meses de prisão, suspensa por igual período.

    3.2 Em resposta ao requerimento dos arguidos B., E. e outros, relativo ao alargamento do prazo de interposição de recurso (cfr. fls. 9858-9859 e 11239-11240), o tribunal de 1.ª instância decidiu, por despacho de 15/09/2010, não recorrido, o seguinte (cfr. fls. 9868 e 11238):

    (…) A excecional complexidade do processo foi declarada por despacho de fls. 5222/5223 (vol. XV), termos em que se fundamentou o alargamento do prazo máximo de duração da prisão preventiva do arguido A.. Os fundamentos desse qualificativo mantêm-se (número de arguidos, extensão da matéria de facto e do acórdão final, numerosas provas, seja documental ou testemunhal), pelo que, nos termos do disposto no art. 107º, n.º 6 do CPP, prorrogo de 20 para 30 dias o prazo de recurso previsto no art. 411º, n.º 1 e 3 do CPP, sem prejuízo do alargamento do prazo em mais 10 dias no caso de o recurso ter por objeto a reapreciação da prova gravada. (…)

    .

    3.3 Os ora recorrentes interpuseram recurso da decisão condenatória para o Tribunal da Relação de Coimbra (TRC), o qual foi admitido.

    O TRC, em 9/02/2011, proferiu Decisão Sumária pela qual rejeitou os recursos por intempestividade, considerando não ter sido interposto, nos termos legais, recurso para reapreciação da prova gravada, pelo que o prazo de interposição do recurso era de 30 dias – 20 dias nos termos do art.º 411.º, n.ºs 1 e 3 do CPP acrescido de 10 dias em conformidade com o despacho de 15/09/2010 (cfr. fls. 11010-11018).

    Os arguidos e ora recorrentes reclamaram para a Conferência, tendo o TRC, por acórdão de 11/05/2011, indeferido a reclamação, com o fundamento (diverso) seguinte (cfr. fls.11407 a 11410):

    (…) No estádio atual do ordenamento jurídico nacional, o prazo máximo de recurso de qualquer decisão judicial nunca poderá exceder 30 (trinta) dias, como claramente resulta da dimensão normativa decorrente dos arts. 411.°, ns. 1, 3 e 4, e 107.°, n.º 6, do Código de Processo Penal1, já que este último inciso (n.º 6 do art.° 107.°) apenas excecionalmente — quando o procedimento se revelar de excecional complexidade — permite a prorrogação até àquele — limite de 30 (trinta) dias dos prazos de 20 (vinte) dias prevenidos nos nºs. l e 3 do citado art.° 411.°, nenhuma outra modificação consentindo quanto ao especial, da mesma ordem de grandeza — de 30 (trinta) dias, já excecionalmente prolongado, atinente a recursos cujo objeto consista na impugnação do julgado factual, fundada em específico conteúdo probatório que se encontre gravado, em estrita conformidade com a disciplina jurídica-processual postulada pelos nºs. 1, 3 e 4, do C. P. Penal —, conferido pelo n.º 4 do mesmo dispositivo (art.° 411.°), cuja eventual/arbitrária alteração por decisão judicial, porque invasiva da exclusiva competência legislativa sobre a matéria da Assembleia da República, se haverá axiomaticamente por inconstitucional e juridicamente inexistente, [cfr., máxime, arts. 165.°, n.º 1, al. c), 203.° e 204.°, da Constituição Nacional].(…)

    .

    3.4 Os arguidos interpuseram recurso do Acórdão do TRC de 11/05/2011 para o Supremo Tribunal de Justiça (STJ), o qual não foi admitido por despacho do TRC – tendo o processo sido, a partir daqui, dividido e seguido tramitação autónoma um, quanto ao ora primeiro recorrente (A.) e outro quanto aos ora segundo e demais recorrentes.

    Da decisão não admissão proferida pelo TRC reclamaram os arguidos e ora recorrentes para o Presidente do STJ.

    3.4.1 No processo do ora primeiro recorrente, a reclamação foi indeferida pelo Vice-Presidente do STJ, pelo que aquele recorreu desta decisão para o Tribunal Constitucional, o qual proferiu o Acórdão n.º 107/2012 (disponível, tal como os...

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