Acórdão nº 623/13 de Tribunal Constitucional (Port, 26 de Setembro de 2013

Magistrado ResponsávelCons. Ana Guerra Martins
Data da Resolução26 de Setembro de 2013
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 623/2013

Processo n.º 288/2013

  1. Secção

Relator: Conselheira Ana Guerra Martins

Acordam, na 2ª Secção, do Tribunal Constitucional

  1. Relatório

  1. Nos presentes autos, em que é recorrente A. e o Ministério Público, foi interposto recurso, ao abrigo do artigo 70º, n.º 1, alínea b), da Lei do Tribunal Constitucional (LTC), de acórdão proferido pela 9ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Lisboa, em 28 de fevereiro de 2013 (fls. 369 a 380-verso), para que seja apreciada a constitucionalidade do artigo 7º - por manifesto lapso, identificado pelo recorrente como artigo 8º - do Regulamento de Fiscalização da Condução sob Influência do Álcool, anexo à Lei n.º 18/2007, de 17 de maio, «que foi base da aplicação ao seu caso dos art.ºs 69.º/1/c, 348.º/1/a C.Penal e 152.º/3 C.Estrada, por contrariar o disposto no art. 41.º/1 CRP (…), quando no acórdão condenatório criminal se postula valer a liberdade de religião e de culto como mero motivo de um dever legal de informação, podendo a lei comum ser imposta, mesmo contra o ditame confessional, embora no caso bem mais gravoso da escolha das “Testemunhas de Jeová” pela morte hospitalar já o ordenamento se lhe não sobreponha» (fls. 387).

  2. Notificado para o efeito, o recorrente produziu as seguintes alegações, cujas conclusões ora se transcrevem:

    I - O recorrente foi condenado por crime de desobediência em pena de multa criminal e proibição de conduzir veículos motorizados por três meses.

    II - O douto acórdão recorrido imputa-lhe o seguinte: foi solicitado ao arguido que procedesse à realização do exame de álcool no sangue, através da recolha de sangue para análise, tendo o mesmo recusado fazer a colheita por motivos religiosos.

    III - Com efeito, o recorrente professa na confissão religiosa “Testemunhas de Jeová”, cujo credo determina a inviolabilidade do sangue humana e, por isso mesmo, de qualquer um dos fiéis.

    IV - Ora, há alternativa racional e cientifica à realização do exame de alcoolemia à colheita de sangue, quando se frustra a análise pelo sopro, nomeadamente através do exame médico aos sinais de reação neurológica e comportamental.

    V - Por isso mesmo, no âmbito da garantia da liberdade religiosa, prescrita no art.° 41.° CRP, tinha e tem o recorrente direito à “objeção de consciência”, que nos termos do n.° 6 do citado preceito constitucional é, segundo o art.° 18.°/1 CRP, de aplicação ¡mediata, sem intermediação.

    VI - Correspondendo, portanto, a inexistência legal do regulamento completo da objeção de consciência, a uma inconstitucionalidade por omissão, ininvocável, a falha ou a deficiência, contra o motivo de exclusão da ilicitude da recusa, por uma “Testemunha de Jeová”, se e quanto a ser- lhe extraído sangue para análise.

    VII - E é fora de dúvidas que aos tribunais criminais é proibido aplicarem preceitos inconstitucionais, tanto quanto desconsiderarem, a favor de uma suposta boa aplicação da lei, as omissões críticas de preceitos, e contra a Constituição.

    VIII - Por conseguinte, ao terem as Instâncias condenado o arguido, neste caso concreto, por crime de desobediência, com o fundamento em não ter permitido que lhe fosse extraído sangue para análise de alcoolemia, na sequência de um acidente de viação em que interveio, fizeram os tribunais aplicação ¡inconstitucional do segmento normativo dos art.°s art.°s 69.°/1/c, 348.°/1/a C. Penal e 152.°/3 C. Estrada, segundo a interpretação que lhe deram, de a diretiva legislada ser indiferente, afinal, ao motivo religioso invocada pelo recorrente para a recusa.

    (fls. 328 a 330)

  3. Notificado para o efeito, o Ministério Público apresentou contra-alegações, que ora se resumem:

    (…)

    2. Questão-prévia: inadmissibilidade do recurso

    2.1. Em primeiro lugar, parece-nos que convirá fazer uma rectificação do que vem afirmado pelo recorrente.

    Na verdade, ao longo do processo, em diversos momentos e no requerimento de interposição do recurso, aquele menciona o artigo 8.º do Regulamento de Fiscalização da Condução sob o efeito do Álcool ou de Substâncias Psicotrópicas (aprovado pela Lei nº 18/2007, de 17 de Maio e que passaremos a designar por Regulamento).

    Ora, esse artigo 8.º tem a ver com “substância psicotrópica a avaliar” para efeitos do artigo 81.º do Código da Estrada, situação completamente estranha à dos presentes autos.

    Onde no Regulamento está previsto o exame médico é no artigo 7.º, devendo, pois, a referência ao artigo 8.º, ser um mero lapso.

    ...

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