Acórdão nº 577/13 de Tribunal Constitucional (Port, 13 de Setembro de 2013
Magistrado Responsável | Cons. João Cura Mariano |
Data da Resolução | 13 de Setembro de 2013 |
Emissor | Tribunal Constitucional (Port |
ACÓRDÃO N.º 577/2013
Processo n.º 850/13
Plenário
Relator: Conselheiro João Cura Mariano
Acordam em Plenário no Tribunal Constitucional
Relatório
Recurso interposto pelo Partido Social Democrata
O Partido Social Democrata apresentou uma lista de candidatos às eleições para a Assembleia de Freguesia da União das Freguesias de Arcos e Mogofores, a realizar em 29 de setembro de 2013, sendo o primeiro candidato dessa lista Fernando Adelino Pina Fernandes
O Mandatário da lista apresentada pelo CDS – Partido Popular, veio impugnar a elegibilidade de Fernando Adelino Pina Fernandes.
Após a Mandatária do Partido Social Democrata ter sustentado a elegibilidade do primeiro candidato da lista apresentada por aquele partido político, foi proferida decisão pelo Juiz do Juízo de Média e Pequena Instância Cível de Anadia, em 16 de agosto de 2013, declarando inelegível Fernando Adelino Pina Fernandes.
A Mandatária do Partido Social Democrata reclamou desta decisão, tendo esta reclamação sido indeferida por despacho proferido em 26 de agosto de 2013.
A Mandatária do Partido Social Democrata interpôs recurso desta decisão para o Tribunal Constitucional, sustentando a elegibilidade do candidato Fernando Adelino Pina Fernandes.
Recurso interposto por Fernando Manuel Ferreira da Fonte e outros
Fernando Manuel Ferreira da Fonte e outros eleitores, em exercício de ação popular, vieram impugnar todas as listas concorrentes às Assembleias de Freguesia da União das Freguesias de Amoreira, Gândara e Ancas, União das Freguesias de Arcos e Mogofores e União das Freguesias de Tamengos, Aguim e Óis da Ribeira.
Esta impugnação foi indeferida, com fundamento na ilegitimidade dos Impugnantes, por despacho proferido pelo Juiz do Juízo de Média e Pequena Instância Cível de Anadia, em 13 de agosto de 2013.
Fernando Manuel Ferreira da Fonte e outros eleitores reclamaram desta decisão, tendo a reclamação sido indeferida por despacho proferido em 21 de agosto de 2013.
Fernando Manuel Ferreira da Fonte e outros eleitores interpuseram recurso desta decisão para o Tribunal Constitucional, nos termos do artigo 31.º, n.º 1, da LEOAL, e 70.º, n.º 1, b), e 72.º, n.º 2, da Constituição, nos seguintes termos:
“FERNANDO MANUEL FERREIRA DA FONTE, e outros, eleitores do Concelho de Anadia, notificados da douta decisão do Exmo. Senhor Juiz de fls. .., da Reclamação prevista no artigo 29.º da LEOAL, vêm dela interpor recurso para o Tribunal Constitucional, nos termos do disposto no artigo 31.º, n.º 1 da LEOAL e 70.º, n.º 1 b) e 72.º, n.º 2 da Lei do Tribunal Constitucional.
…
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Os Recorrentes interpuseram impugnação de todas candidaturas de todas as Listas às seguintes "Freguesias" do Concelho de Anadia
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UNIÃO DAS FREGUESIAS DE AMOREIRA DA GÂNDARA, PAREDES DO BAIRRO e ANCAS
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UNIÃO DAS FREGUESIAS DE ARCOS e MOGOFORES
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UNIÃO DAS FREGUESIAS DE TAMENGOS, AGUIM e ÓIS 00 BAIRRO
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Com base na irregularidade do respetivo processo, que é do conhecimento oficioso.
Porém,
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O Exmo. Senhor Juiz a quo não admitiu a impugnação por julgar a ilegitimidade dos recorrentes,
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Numa interpretação do artigo 25.º, n.º 3 da LEOAL que se pauta de inconstitucional;
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Inconstitucionalidade que foi invocada em sede de reclamação (prevista no artigo 29.º da LEOAL), e que se estendeu, desde logo, a norma idêntica prevista no artigo 29.º, n.º 1 da mesma Lei.
ASSIM,
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São estas duas normas - artigos 25.º, n.º 3 e 29.º, n.º 1 da LEOAL (e extensivamente também o artigo 31.º, n.º 1) - na interpretação efetuada pelo Exmo. Senhor Juiz a quo que estão aqui em causa, num juízo de inconstitucionalidade que se invocou e que aos Recorrentes, parece evidente, salvo melhor opinião (que sempre se ressalva, admite e respeita).
MAS MAIS,
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Independentemente da ilegitimidade ou não, deveria o Exmo. Senhor Juiz a quo, enquanto órgão da Administração Eleitoral (pois é nessa função e não na função jurisdicional que atua), aferir da regularidade do processo e, designadamente, das irregularidades invocadas, pois estas são de conhecimento oficioso.
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É, POIS ESTA DECISÃO, NESTA DUPLA VERTENTE, E O SEU JUÍZO DE CONSTITUCIONALIDADE DAS NORMAS IMPUGNADAS QUE É OBJETO DO PRESENTE RECURSO.
DA INCONSTITUCIONALIDADE DAS NORMAS DOS ARTIGOS 25.º, N.º 3 E 29.º, N.º 1 DA LEOAL NA DOUTA INTERPRETAÇÃO DO EXMO. SR. JUIZ A QUO
1) A reclamação apresentada pelos ora Recorrentes, não admitida na decisão em apreço, invocou a inconstitucionalidade do artigo 25.º da LEOAL na interpretação que lhe foi dada, pois o Exmo. Sr. Juiz a quo entendeu a sua enumeração como taxativa.
2) Retirando do povo, dos cidadãos, dos eleitores, a legitimidade para impugnar candidaturas, para as quais se exige - trata-se de um dever cívico (cfr. artigo 96.º LEOAL) - que votem, numa visão, se se permite a expressão, partidocrática que nega as repercussões de um Estado de Direito democrático, de uma soberania popular e do direito de sufrágio, consagrados nos artigos 2.º, 3.º, 6.º e 49.º da CRP.
3) Por outro lado, esquece o vertido no artigo 231º da LEOAL, que, sob a epígrafe "Direito subsidiário", refere que em tudo o que não estiver regulado na presente lei aplica-se aos atos que impliquem intervenção de qualquer tribunal o disposto no Código de Processo Civil quanto ao processo declarativo, com exceção dos nºs 4 e 5 do artigo 145º.
Pelo que,
4) Têm os Requerentes legitimidade, como eleitores das freguesias atualmente existentes e sobretudo das freguesias a agregar nos termos da Lei n.º 11-A/2013 e como titulares do direito de sufrágio e de ação popular, constantes dos artigos 49.º da CRP e artigos 52.º da CRP e n 1 do artigo 2.º da Lei 83/95,
5) Direitos que ao abrigo do princípio do acesso ao direito (artigo 20.º da CRP e art.º 2/2 do CPC) pretenderam exercer por essa via e, posteriormente, pela via da reclamação prevista no artigo 29.º da LEOAL.
6) Numa interpretação constitucional de ambas as normas (artigos 25.º, 3 e 29.º, 1 da LEOAL), tem necessariamente de admitir-se a legitimidade dos cidadãos eleitores, sendo neles que reside a soberania em que se baseia a República Portuguesa como Estado de Direito democrático (cfr. artigo 2.º da CRP), soberania essa que está no povo e por causa do povo, como resulta do vertido no artigo 3.º da CRP.
Efetivamente,
7) A regularidade do processo eleitoral e das candidaturas é um interesse difuso e não um interesse próprio de partidos e/ou candidatos;
8) E é sobretudo um direito dos eleitores e não dos putativos eleitos.
9) Que legitimidade têm os futuros eleitos quando os presentes eleitores não têm direitos eleitorais, mas apenas o dever de votar!?
10) De votar em ilegalidades, irregularidades e entes desconhecidos e, à data, inexistentes, impreparados e não instalados previamente?
11) Há no caso sub judice uma clara irregularidade de todo o processo por:
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Violação do direito de sufrágio.
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Candidaturas apresentadas para entidade inexistente e totalmente desconhecida.
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Instrução das candidaturas com certidões de eleitores nulas, porquanto emanadas de entidade inexistente.
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Instrução de candidaturas com certidões de eleitores nulas, porquanto emitidas por comissões recenseadoras inexistentes.
12) Irregularidades que geram a nulidade do processo, que é de conhecimento oficioso.
13) Assim, a decisão em causa viola, na modesta opinião dos Recorrentes, este dever de conhecimento oficioso, mas sobretudo aplica os artigos 25.º, n.º 3 e 29.º, n.º 1 de forma inconstitucional,
14) Violando os artigos 2.º, 3.º, 20.º, 49.º,5 2.º da Constituição da República Portuguesa.
Na verdade,
15) E face a tudo quanto se já demonstrou, a interpretação das normas sobre a legitimidade - seja a do artigo 25.º, seja a do artigo 29.º - como tendo uma enumeração taxativa, não pode prevalecer,
16) Pois as eleições - e portanto todo o processo eleitoral - dirigem-se ao povo, aos eleitores, soberanos e onde assenta a legitimidade democrática do Estado,
17) E não aos eleitos ou candidatos,
18) E muito menos aos partidos políticos.
19) A razão de ser destas normas sobre a legitimidade ativa (que se estende também ao artigo 31.º, n.º 1 da LEOAL) não é afastar a legitimidade natural e geral dos cidadãos, eleitores, mas antes atribuir essa legitimidade a quem a não possuía.
20) Nunca uma norma enxertada na LEOAL poderá afastar a legitimidade geral dos cidadãos eleitores e muito menos limitar o direito constitucionalmente consagrado do acesso ao Direito e aos Tribunais.
21) Os Recorrentes são cidadãos da República Portuguesa, residentes nas freguesias em causa e nelas eleitores,
22) Sendo todos maiores, sem qualquer incapacidade de exercício de direitos CIVIS ou políticos,
23) Pelo que estão na plenitude de exercício dos seus direitos civis e políticos legalmente determinados.
24) O artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa consagra no seu n.º 1 o direito fundamental de acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva1,
25) Direito esse, que é uma garantia plena2,
26) Garantido a nível internacional pelo artigo 8.º da Declaração Universal dos Direitos do Homem, pelo n.º 3 do artigo 2.º do Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos, pelos artigos 6.º e 13.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem e pelo artigo 47.º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia e
27) A nível infraconstitucional, pela previsão do n.º 2 do artigo 2.º do Código de Processo Civil ("CPC"), que estabelece que a todo o direito corresponde uma ação.
28) Sendo constitucionalmente atribuído a todos o direito ao sufrágio (artigo 49.º), como direito fundamental e estruturante do Estado de Direito democrático consagrado no artigo 2.º da CRP, ao qual acresce o facto de a soberania residir no povo (cfr. artigos 2.º e 3.º da CRP), com as consequências daí decorrentes.
29) Assim, o cidadão eleitor goza da plenitude dos seus direitos, inclusive do direito de petição e de ação popular, consagrado no artigo 52.º da CRP, que não pode ser limitado por esta interpretação sobre a legitimidade dos artigos 25.º, 3 e 29.º, 1 da...
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