Acórdão nº 72/09 de Tribunal Constitucional (Port, 11 de Fevereiro de 2009

Magistrado ResponsávelCons. Maria Lúcia Amaral
Data da Resolução11 de Fevereiro de 2009
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 72/2009

Processo nº 916/2007

  1. Secção

Relatora: Conselheira Maria Lúcia Amaral

Acordam na 3ª Secção do Tribunal Constitucional

I

Relatório

  1. O A., S.A. apresentou junto da Administração Tributária uma reclamação graciosa de uma eventual correcção da matéria colectável do exercício de 1990 a qual, no entendimento do então reclamante, nunca lhe teria sido notificada.

    Sobre esta reclamação recaiu uma decisão do Sr. Director Distrital de Finanças do Funchal que, em sede já de recurso hierárquico, confirmou a decisão de indeferimento da reclamação com o fundamento de que, ao contrário do alegado pelo então reclamante, a notificação da correcção da matéria colectável tinha efectivamente ocorrido.

  2. Assume ainda relevância para apreciação do presente recurso a conduta procedimental do ora recorrente. É que, previamente à apresentação da reclamação em que alegava a falta de notificação de um acto que, no seu entendimento, afectava os seus direitos e interesses legítimos, o ora recorrente apresentou, ao abrigo do que dispunha o artigo 22.º, n.º 1, do então em vigor Código de Processo Tributário (CPT), um pedido dirigido à Direcção Distrital de Finanças em que solicitava a fundamentação legal do acto de correcção da matéria colectável. Este pedido, por ter sido apresentado para além do prazo de 30 dias consagrado no normativo em questão, foi indeferido pelo Sr. Director Distrital de Finanças do Funchal.

    O A., S.A. apresentou então, ao abrigo do artigo 53.º, n.º 1, do CPT, requerimento de passagem de certidão o qual mereceu deferimento.

  3. O A., S.A. impugnou judicialmente a decisão referida em 1. anterior junto do Tribunal Administrativo e Fiscal do Funchal pretendendo, nesta acção, a anulação do despacho do Sr. Director Distrital de Finanças do Funchal que indeferiu a reclamação graciosa, relativa ao IRC de 1990 e apresentada em Junho de 1996.

    O Tribunal Administrativo e Fiscal do Funchal decidiu pela improcedência desta impugnação por entender que a impugnação judicial havia sido deduzida fora de prazo, intempestividade esta que resultava já da intempestividade da reclamação graciosa referida em 1. anterior fundada, por sua vez, na apresentação, fora de prazo, do pedido a que se refere o disposto no artigo 22.º, n.º 1, do CPT.

    O Tribunal Central Administrativo Sul, por acórdão de 4 de Abril de 2006, confirmou, em sede de recurso, esta decisão.

    Deste acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul veio o ora recorrente interpor recurso por oposição de julgados para o Supremo Tribunal Administrativo, tendo este tribunal proferido acórdão, a 2 de Maio de 2007, no sentido de que, por não existir a oposição de julgados alegada pelo recorrente, não deveria o recurso ser apreciado.

  4. Notificado deste acórdão a 7 de Maio de 2007, e inconformado com a decisão proferida pelo Tribunal Central Administrativo Sul, veio o A., a 15 de Maio de 2007, interpor o presente recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, alterada por último pela Lei n.º 13-A/98, de 26 de Fevereiro (Lei do Tribunal Constitucional).

  5. Nas conclusões de recurso apresentado junto do Tribunal Central Administrativo Sul o ora recorrente vem dizer, no que importa para o presente processo, que a interpretação do Tribunal a quo do disposto no artigo 63º do CPT (actual artigo 35.º do Código de Procedimento e Processo Tributário (CPPT)), quando admite que os contribuintes se devam considerar notificados de um acto ainda que não disponham de meios suficientes para conhecer o seu conteúdo, viola o disposto no artigo 268.º n.º 4 da Constituição da República Portuguesa. Mais refere o ora recorrente que também a interpretação que o tribunal a quo faz do que dispõe o artigo 22.º do CPT (actual 37.º, n.º 1, do CPPT) é inconstitucional por violação do que dispõe o artigo 268.º, n.º 3, da Constituição da República Portuguesa (cfr. em especial as conclusões XXXIII, XXXVII, XXXVIII e XXXIX a fls. 362 e ss dos autos).

  6. Quanto às questões de inconstitucionalidade suscitadas o Tribunal Central Administrativo Sul fundou a sua decisão, no que importa o presente recurso, nos seguintes termos:

    (…)

    Ora, a alteração da situação tributária dos contribuintes, designadamente da alteração da matéria colectável, encontrava-se sujeita a notificação e por carta registada com A/R, nos termos do disposto no art.° 65.° do CPT, então vigente, como a própria AT também entende (cfr. inf. de fls 35 a 37 dos autos, onde se considera tal notificação como, uma formalidade essencial do acto tributário...).

    Porém, a notificação, nos termos do disposto no art.° 63.° n.° 1 do CPT, consiste no acto pelo qual se leva um facto ao conhecimento de uma pessoa ou se chama alguém a juízo.

    No caso, dúvidas não restam de que a notificação do 1.° apuramento da matéria tributável (e que alterou a que por si fora declarada) jamais foi notificada à ora recorrente de forma autónoma e individualizada.

    Porém, como consta na matéria dos pontos 7., 8., 9., 12., 13., 26., 27. e 31. do probatório e melhor se colhe dos autos, na notificação operada e relativa ao 2.° apuramento e respectiva liquidação (nula), foi contida, também, a matéria do referido l.° apuramento, enquanto se reflectiu na respectiva ordem de grandeza, ou seja, neste 2.° apuramento que lhe foi remetido, em vez de ter sido indicado o lucro tributável por si declarado na declaração de rendimentos do exercício em causa, de 1.497.409.783$, foi indicado o de 599.090.718$, já apurado no referido 1.º apuramento, pelo que não podendo o ora recorrente deixar de saber que não havia indicado este valor (2.599.090.718$), como lucro tributável do exercício, por ser um facto que lhe é pessoal, não poderia deixar de concluir que ocorrera uma qualquer alteração do montante do lucro tributável que havia declarado.

    E nem devia presumir que tal menção daquele montante se devia a lapso da Administração Fiscal, como invoca na matéria da sua conclusão XIII (prova que em todo o caso não veio fazer), face aos princípios que enformam a actuação da Administração na sua relação com os particulares, desde logo aos constitucionais, previstos nas normas dos art.°s 266.° e segs (numeração actual), e, mesmo, perante, uma eventual suspeita de lapso, o caminho a seguir seria o da procura da informação atinente e não o do silêncio ou da omissão.

    Também o recorrente carece de razão ao invocar que o valor apurado no primeiro apuramento não deveria ter sido inscrito na linha 41, campo 262 da declaração modelo DC 22 – cfr. matéria da sua conclusão XIV. Segundo os dizeres dela própria, subordinada à epígrafe, Apuramento, na linha 40, campo 261, inscreve–se o total das correcções aí apuradas (positivas ou negativas), na linha seguinte (41), campo 262, inscreve-se o lucro ou prejuízo declarado, e na linha 42, campo 263, tem, necessariamente, de se inscrever o resultado dos dois campos anteriores, como o total ou resultado (diferença ou adição) e desta forma alcançar a mensuração do lucro tributável desse exercício. Como forma de “medir” esse lucro tributável, nessa linha 41, campo 262, não poderá deixar de se inscrever o lucro tributável declarado ou, caso ele já tenha sido alterado por algum anterior apuramento, o valor aí encontrado (sendo a própria norma do art.° 17.° n.° 1 do CIRC, que nessa determinação o reporta ao lucro tributável declarado ou corrigido), sob pena de não conduzir ao correcto apuramento desse lucro, que é, o que afinal aí se visa alcançar, tal como aliás se repete no Quadros de Recolha, subordinados aos mesmos números de campo (cfr. cópia de fls 19 dos autos de reclamação)

    É certo que a norma do art.° 21.° do CPT, então vigente, dispõe que a notificação das decisões em matéria tributária que afectem os direitos ou interesses legalmente protegidos dos contribuintes conterão os respectivos fundamentos de facto e de direito, a qual lhes será notificada com a decisão.

    E no caso, tal norma não foi integralmente cumprida, porque nenhuma fundamentação lhe foi remetida com a notificação do referido 2.° apuramento e relativo ao referido 1.º apuramento, mas tal falta, como se sabe, não contende com a validade ou perfeição do acto mas tão só com a sua eficácia externa, como constitui jurisprudência que se considera firmada, designadamente do STA […].

    Também a norma do art.° 268.° da CRP (numeração actual) não fulmina de nulidade ou anulabilidade do acto administrativo em geral por falta da sua notificação, antes remete para a lei ordinária tais efeitos, e que são, como se disse, de falta da sua eficácia externa, que não da sua validade ou perfeição, o que bem se compreende, sabido que a notificação, constitui um acto extrínseco ou exterior ao próprio acto notificado, não se vislumbrando assim, qualquer inconstitucionalidade na interpretação das normas supra referidas […].

    Aliás, nem se compreenderia que a sanção por vício respeitante a acto posterior à liquidação e que em nada contende com a perfeição desta fosse a sua anulação.

    Perante tal falta de remessa da fundamentação nesta parte, a sanação obtinha-se por requerer a notificação da parte omitida, ou a passagem de certidão que a contivesse, isenta de qualquer pagamento, ou seja quanto à parte das correcções que foram efectuadas no referido l.° apuramento e que naquele 2.° apuramento se dava conta, ao abrigo do disposto no art.° 22.° do mesmo CPT, o que, de resto, o ora recorrente não deixou de vir fazer, mas só que já fora do prazo que a lei lhe concede para o efeito, facto que só a si próprio lhe poderá ser imputável.

    O uso desta faculdade, não consubstanciando, embora, um ónus de satisfação obrigatória, é, no entanto, condição necessária para que o termo inicial do prazo para a dedução da impugnação ou reclamação graciosa se conte, não com a data da primeira notificação, mas com o daquela que o contribuinte suscite, pois de outro modo se não entenderia a imposição daquele prazo de trinta dias […].

    E assim sendo, tal...

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