Acórdão nº 179/15 de Tribunal Constitucional (Port, 17 de Março de 2015

Magistrado ResponsávelCons. João Pedro Caupers
Data da Resolução17 de Março de 2015
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 179/2015

Processo n.º 698/14

  1. Secção

Relator: Conselheiro João Pedro Caupers

Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional:

  1. Relatório

  1. O Ministério Público interpôs recurso, nos termos dos artigos 72º, n.º 1, alínea a), e 75º da Lei do Tribunal Constitucional do Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte – Seção do Contencioso Tributário, que considerou ilegais, por inconstitucionalidade formal, material e orgânica, as normas constantes dos artigos 3.º, 4.º, 5.º, 8.º e 10.º do Regulamento Municipal de Liquidação e Cobranças de Taxas pela Exploração de Inertes no Concelho de Vila Pouca de Aguiar, doravante referido como “RMLCTEI” (fls. 303 e segs.).

    Tal ilegalidade decorreria da circunstância de as normas regulamentares em causa procederem à criação de um imposto incidindo sobre o valor de venda dos bens objeto da atividade das empresas extrativas, o que colidiria «inevitavelmente com o estatuído no n.º 2 do artigo 104.º da Constituição», violando também as «regras estabelecidas nos artigos 103.º, n.º 2, e 165.º, n.º 1, alínea i)» da Lei Fundamental.

    Nas alegações do recurso escreveu o Representante do Ministério Público neste Tribunal (fls. 310-311):

    (…) 2.ª) O tributo levantado pelo RMLCTEI, nomeadamente nos seus artigos 3.º, 4.º, 5.º, e 8.º, não é um “imposto” mas antes, verdadeiramente, uma “taxa” devida como contrapartida específica dos serviços público municipal de fiscalização administrativa e de cooperação na fiscalização técnica da exploração das pedreiras (Decreto-Lei n.º 89/90, de 16 de março, nomeadamente os arts. 30.º a 48.º).

    3.ª) Por conseguinte, diversamente do que se julgou na douta decisão recorrida, não são aplicáveis ao caso os critérios constantes dos artigos 103.º, n.º 2, 104.º, n.º 2, e 165.º, nº 1, alínea i), todos da Constituição, na redação da Lei Constitucional n.º 1/97, de 20 de setembro, na medida em que o âmbito material de tais normativos está referido a “impostos” e não a “taxas”, como é o caso, pelo que não são inconstitucionais (formal, orgânica e materialmente), nomeadamente deste ponto de vista, as normas constantes dos artigos. 3.º, 4.º, 5.º, 8.º e, consequentemente, do artigo 8.º (Contraordenações), do RMLCTEI, na exata medida em que sanciona as infrações ao regime em apreço.

    Nestes termos, em virtude de concorrer erro de julgamento quanto à questão da constitucionalidade, pois foi dirimida com fundamento em normas constitucionais regendo em matéria de “impostos” e não de “taxas, como é verdadeiramente o caso, é de conceder provimento ao presente recurso, revogando a douta decisão recorrida, após o que os autos baixarão ao tribunal de onde provieram, para reformar a mesma em conformidade com este julgamento da questão (LOFPTC, art. 80.º, n.º 2).

  2. Notificadas as recorridas A., e B. para contra-alegar, apenas a última o fez (fls. 337 a 358).

    Nas alegações apresentadas, conclui o seguinte:

    V. CONCLUSÕES

    A. O tema fundamental que permite dar resposta à presente questão de constitucionalidade é o de saber se o tributo que a Assembleia Municipal de Vila Pouca de Aguiar criou através do Regulamento Municipal constitui - apesar da denominação que lhe foi atribuída - uma verdadeira taxa, ou, como o Tribunal a quo considerou, um imposto.

    B. Da jurisprudência citada conclui-se que o tributo previsto no Regulamento Municipal apenas poderia ser considerado uma taxa caso o seu pagamento assentasse numa relação sinalagmática entre o tributo a pagar e a contraprestação do Município, sendo que a doutrina e a jurisprudência consideram que este sinalagma apenas existe se a contraprestação da Administração, ou neste caso do Município, se traduzir:

    i. Na prestação de um determinado serviço individualizado ao sujeito passivo;

    ii. Na utilização de um bem do domínio público; ou

    iii. Na remoção de determinado obstáculo jurídico à atuação de particulares.

    C. No caso sub judice, a criação do tributo previsto no Regulamento Municipal não assenta, quer na prestação de um determinado serviço individualizado ao sujeito passivo, quer na utilização de um bem do domínio público, quer, ainda, na remoção de determinado obstáculo jurídico à atuação de particulares, pelo que se deve concluir que o tributo ora em análise assume a natureza de imposto, por lhe faltar o carácter de bilateralidade que é exigível às taxas.

    D. De todo o modo, ainda que se entendesse de alguma forma - o que não se admite e por mero dever de patrocínio se equaciona – que o Município prestaria alguma espécie de contraprestação individualizada às empresas que extraem inertes, ou que o prejuízo geral que sofre com a atividade justificaria o pagamento de uma taxa, sempre continuaria este tributo a ter natureza de imposto, já que a forma de cálculo da taxa a pagar apenas tem em consideração o valor da venda dos inertes, pelo que não é possível que exista qualquer equivalência económica ou jurídica entre a taxa a pagar e qualquer contraprestação eventualmente a cargo do Município.

    E. Ao mesmo tempo, verifica-se uma manifesta desproporção entre o valor do tributo cobrado e o valor do serviço alegadamente prestado, bem como, ademais, uma total incompatibilidade entre o fundamento de incidência da taxa (prejuízo do Município, ou simples extração dos inertes) e a taxa a cobrar (que incide sobre o valor da venda), pelo que não existe entre as duas prestações uma qualquer equivalência económica ou sequer jurídica, devendo concluir-se, consequentemente, que o tributo em análise tem, na verdade, a natureza de imposto.

    F. Por outro lado, não procede, a argumentação exposta pelo Recorrente de que a taxa assentaria na atividade de fiscalização administrativa prestada pelas autoridades municipais, uma vez que:

    i. Caso a autora material do Regulamento Municipal tivesse criado a taxa para custear a atividade de fiscalização administrativa das autoridades municipais, esta teria sido a primeira a referi-lo; o que não sucedeu;

    ii. Aquilo que o Regulamento Municipal pretende taxar não é o prejuízo que a atividade de extração de inertes causa ao Município (ou mesmo o custo de uma suposta atividade de fiscalização), mas, antes, a própria atividade de extração de inertes;

    iii. Não se pode considerar incluído no conceito de prejuízo, presente no artigo 2.º do Regulamento Municipal, os custos administrativos que as autoridades municipais alocam a uma eventual atividade de fiscalização, uma vez que, nos termos do n.º 2 do artigo 9.º do Código Civil, essa interpretação não encontra no texto da norma – nem sequer no espírito do legislador ou do autor material do Regulamento Municipal como vimos - o mínimo de correspondência e não pode portanto ser admitida; e

    iv. Não existe qualquer equivalência económica ou mesmo jurídica entre os custos suportados pelo...

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