Acórdão nº 217/15 de Tribunal Constitucional (Port, 08 de Abril de 2015

Magistrado ResponsávelCons. Fernando Vaz Ventura
Data da Resolução08 de Abril de 2015
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 217/2015

Processo n.º 1354/13

  1. Secção

Relator: Conselheiro Fernando Ventura

Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional

  1. Relatório

    1. A A., S.A. (agora denominada A1, SA), impugnou judicialmente o ato de liquidação da Contribuição Especial prevista no Decreto-Lei n.º 43/98, de 3 de março, no montante de €1.396.127,79, sustentando, inter alia, a caducidade do direito de liquidação e a inverificação do facto tributário relativamente à impugnante.

      Por sentença proferida em 21 de novembro de 2012 pelo Tribunal Tributário de Lisboa, foi a impugnação julgada improcedente.

    2. Inconformada, a impugnante recorreu, vindo o Tribunal Central Administrativo Sul, por acórdão proferido em 17 de novembro de 2013, a negar provimento ao recurso e a confirmar a sentença recorrida.

    3. Nessa sequência, a impugnante interpôs recurso deste acórdão para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional, doravante LTC), através de requerimento com o seguinte teor:

      O recurso é de fiscalização concreta e destina-se à apreciação da inconstitucionalidade da norma contida no artigo 3.º do Regulamento da Contribuição Especial, constante do Anexo ao Decreto-Lei n.º 43/98, de 3 de março, por violação do princípio tributário da capacidade contributiva ínsito nos artigos 13.º, 103.º, n.º 1 e 104.º da CRP, quando interpretado no sentido de que (i) o facto tributário corresponde ao ato de emissão do alvará de licença de construção ou de obra e que (ii) o sujeito passivo é, necessariamente, a pessoa em nome da qual este alvará é emitido.

      Destina-se ainda ao exame da inconstitucionalidade da norma do artigo 14.º do Regulamento da Contribuição Especial, na redação que lhe foi conferida pelo Decreto-Lei n.º 472/99, de 8 de novembro, por violação da reserva de lei da Assembleia da República em matéria de impostos que se encontra consagrada nos artigos 165.º, n.º 1 al. i) e 103.º, n.º 2 da CRP, bem como por desrespeito pelo princípio da capacidade contributiva, quando interpretada no sentido de a emissão do alvará ser o facto tributário da Contribuição Especial, dissociando, assim, o dies a quo do prazo de caducidade do direito à liquidação do facto tributário.

      Em cumprimento do disposto no n.º 2 do artigo 75.º-A da Lei n.º 28/82, a Recorrente informa que suscitou as questões de inconstitucionalidade supra identificadas nas alegações de recurso que deram origem ao Acórdão recorrido, as quais foram apresentadas no Tribunal a quo em 17/01/2013 e dirigidas a este Tribunal Central Administrativo Sul - cfr., em especial, os n.ºs 4, 30, 33, 36 e 37 das conclusões. (…).

    4. Admitido o recurso, a recorrente apresentou alegações, que concluiu nos seguintes termos:

      1. No que à Contribuição Especial prevista no Decreto-Lei n.º 43/98 respeita, o artigo 1.º, n.º 1 do RCE estatui que o facto tributário corresponde ao aumento de valor dos prédios rústicos "resultante da possibilidade" da sua utilização como terrenos para construção urbana, ou seja, associa a valorização ou mais-valia que consubstancia o facto tributário ao momento a partir do qual existe a suscetibilidade de afetação do imóvel à construção.

      2. Se tivermos em conta que o artigo 26.º do Decreto-Lei n.º 555/99, de 16 de dezembro ("RJUE") estabelece que "A deliberação final de deferimento do pedido de licenciamento consubstancia a licença para a realização da operação urbanística", podemos afirmar que esta deliberação marca o momento em que o prédio passa a ser apto para a construção urbana, i.e. o instante em que se dá a valorização que o artigo 1.º, n.º 1 do RCE identifica como sendo o facto tributário.

      3. Sendo o fundamento da Contribuição Especial uma manifestação positiva da capacidade contributiva que se materializa na valorização do imóvel, o facto tributário deve ser aquele que melhor revela este acréscimo de valor patrimonial, deve ser o facto que exterioriza efetivamente a capacidade contributiva.

      4. À luz do artigo 1.º, n.º 1 do RCE e do disposto no artigo 26.º do RJUE, o direito de realizar a operação urbanística que provoca a valorização do imóvel e que corresponde ao facto tributário da Contribuição Especial surge na esfera jurídica do particular com a deliberação camarária, sendo o alvará um mero instrumento de titulação e de eficácia deste direito pré-existente.

      5. Portanto, o facto tributário da Contribuição Especial não corresponde ao ato de emissão do alvará de licença, porquanto este ato não é apto a revelar a capacidade contributiva subjacente à exigência do tributo.

      6. Relativamente ao teor do artigo 3.º do RCE, dele não se pode retirar que os titulares do alvará de licença são obrigatoriamente sujeitos passivos porque consagra uma presunção legal em matéria de incidência subjetiva que, como tal, é passível de ser ilidida, sob pena de inconstitucionalidade por desrespeito aos artigos 13.º, n.º 2, 103.º, n.º 1 e 104.º da Lei Fundamental (cfr. ainda o artigo 73.º da LGT).

      7. Em consequência do exposto, uma interpretação da norma contida no artigo 3.º do RCE como aquela que foi perfilhada pelo Tribunal a quo não pode ser aceite por violar o princípio tributário da capacidade contributiva ínsito nos artigos 13.º, 103.º, n.º 1 e 104.º da CRP.

      8. De referir que nos Acórdãos n.º 63/2006, de 24/0112006 e n.º 579/2011, de 29/11/2011 o Tribunal Constitucional não associa a realização da mais-valia - facto tributário - à emissão do alvará mas antes ao requerimento de licença, definindo ainda que as balizas temporais contidas no artigo 2.º, n.º 1 do RCE não visam determinar o facto tributário, mas apenas servir de instrumento de quantificação da matéria coletável sujeita à Contribuição Especial.

      9. Relativamente à interpretação da norma do artigo 14.º do RCE feita pelo Tribunal a quo, é violadora dos princípios da legalidade fiscal e da capacidade contributiva (cfr. artigos 13.º, 103.º, n.º 2 e 165.º, n.º 1, al. i) da CRP), por um lado, por considerar como facto tributário um evento que não tem a suscetibilidade de revelar a mais-valia que constitui a razão de ser da Contribuição Especial.

      10. E, por outro lado, por dissociar o termo inicial do prazo de contagem da caducidade do direito à liquidação do facto tributário da Contribuição Especial, porquanto a emissão do alvará não consubstancia o facto tributário deste tributo.

      11. Efetivamente, o Governo não se encontrava autorizado pela Lei n.º 52-C/96 a dissociar o facto tributário da Contribuição Especial do "aumento de valor dos prédios rústicos resultante da possibilidade da sua utilização como terrenos para construção urbana", o que equivaleria a uma alteração de um elemento essencial do tributo que redundaria numa violação dos referidos princípios constitucionais da legalidade fiscal e da capacidade contributiva.

      12. Ademais, em momento algum o artigo 34.º da Lei n.º 52-C/96 autorizou o Governo a consagrar um regime de caducidade do direito à liquidação diverso daquele que, na altura, estava consagrado no Código de Processo Tributário (cfr. artigo 33.º do diploma) e do qual já resultava que o facto tributário marcava o início da contagem do prazo de caducidade.

      Termos em que o presente recurso deve ser julgado totalmente procedente, por provado, com a consequente aplicação dos trâmites previstos no artigo 80.º da Lei 28/82, na medida em que o acórdão recorrido:

      A) Faz uma interpretação da norma contida no artigo 3.º do RCE, constante do Anexo ao Decreto-Lei n.º 43/98, de 3 de março, que atenta contra o princípio da capacidade contributiva ínsito nos artigos 13.º, 103.º, n.º 1 e 104.º da CRP, no sentido de que (I) o facto tributário da Contribuição Especial corresponde ao ato de emissão do alvará de licença de construção ou de obra; (II) o sujeito passivo é, obrigatoriamente, a pessoa em nome da qual este alvará é emitido;

      B) Faz uma interpretação da norma contida no artigo 14.º do RCE que desrespeita os princípios da legalidade fiscal e da capacidade contributiva (cfr. artigos 13.º, 103.º, n.º 2 e 165.º, n.º 1 al. i) da CRP) (I) por considerar como facto tributário um evento que não tem a suscetibilidade de revelar a mais-valia que constitui a razão de ser da contribuição especial e (II) por dissociar o termo inicial do prazo de contagem da caducidade do direito à liquidação do facto tributário da contribuição especial, porquanto a emissão do alvará não consubstancia o facto tributário deste tributo.

    5. Notificada, a Fazenda Pública veio aos autos apresentar contra-alegações, no sentido da improcedência do recurso, que concluiu do seguinte modo:

      A) Foi o presente recurso interposto, pela ora recorrente, A., SA, do Acórdão do TCA Sul de 17/10/13, proferido nos autos de recurso n.º 6461/13, o qual veio a negar provimento ao recurso jurisdicional interposto pela mesma, com a consequente manutenção da sentença de 1ª Instância e da liquidação de contribuição especial prevista no DL n.º 43/98.

      B) Pretende a recorrente, face ao deliberado pelo TCA Sul, que seja apreciada a interpretação e aplicação da norma constante do art. 30.º do Regulamento da Contribuição Especial, ao caso em concreto, que a recorrente considera violadora do princípio tributário da capacidade contributiva ínsito nos artigos 13.º, 103.º, n.º 1 e 104.º da CRP, ao concluir que o facto tributário da contribuição especial em questão corresponde ao ato de emissão do alvará de licença de construção ou de obra e que o sujeito passivo é, obrigatoriamente, a pessoa em nome da qual este alvará é emitido.

      C) Pretende, igualmente, que se proceda ao exame da inconstitucionalidade da norma do art. 14.º do RCE, na redação que lhe foi conferida pelo DL n.º 472/99, de 8/11, por violação da reserva de lei da AR em matéria de impostos que se encontra consagrada nos artigos 165.º, n.º 1, al. i) e 103.º n.º 2 da CRP, bem como, por desrespeito pelo princípio da capacidade contributiva, quando interpretada no...

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