Acórdão nº 124/16 de Tribunal Constitucional (Port, 24 de Fevereiro de 2016

Magistrado ResponsávelCons. João Cura Mariano
Data da Resolução24 de Fevereiro de 2016
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 124/2016

Processo n.º 546/15

  1. Secção

Relator: Conselheiro João Cura Mariano

Acordam na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional

Relatório

O Ministério Público, na sequência da realização de inquérito, tendo considerado suficientemente indiciada a prática, pelo arguido A., de um crime de pesca ilegal, previsto e punido pelos artigos 40.º, § 1.º, e 65.º do Regulamento da Lei n.º 2 097, aprovado pelo Decreto n.º 44 623, de 10 de outubro de 1962, remeteu os autos à 2.ª Secção de Instrução Criminal da Instância Central de Águeda, para os efeitos previstos no disposto no artigo 281.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, propondo a suspensão provisória do processo.

O Juiz de instrução criminal, em 13 de maio de 2015, decidiu proferir despacho de não concordância com a promovida suspensão provisória do processo, com a seguinte fundamentação (na parte que ora releva):

“O D.L. 400/82 de 23-9, diploma que aprovou o CP de 1982, estabelece no seu artigo 3.º n.º 1 que «ficam alterados para os limites mínimos e máximos resultantes do artigo 40.º do Código Penal todas as penas de prisão que tenham a duração inferior ou superior aos limites aí estabelecidos».

A consequência prática, no que ao crime em causa nestes autos respeita, é que a pena de prisão aplicável teria limites mínimo e máximo coincidentes (30 dias) importando, por esta razão, uma inaceitável e inconstitucional limitação dos poderes do Juiz na determinação concreta da pena, em violação dos princípios da culpa, da igualdade, da necessidade e da proporcionalidade.

Neste mesmo sentido – da inconstitucionalidade do referido artigo 3º nº 1 do D.L. 400/82 de 23-9, quando interpretada num sentido conducente à aplicação de pena de prisão com limite mínimo e máximo coincidentes, se pronunciou já o TC (pelo menos) nos seguintes arestos todos referentes a processos em que foi por nós recusada a aplicação por inconstitucionalidade da mesma norma:

1 – Decisão Sumária nº 434/2009 (P. TC/09 – 2ª Secção) de 3-11-2009.

Confirma a inconstitucionalidade dos artigos 67º do Regulamento da Lei 2097 (aprovado pelo Decreto-Lei 44623 de 10-10-1962 (norma declarada inconstitucional com força obrigatória geral pelo ac. TC nº 124/2004

Confirma a inconstitucionalidade do artigo 3º nº 1 do Decreto-Lei nº 400/82 de 23-9 (como já antes havia sido declarado nos Acórdãos 22/2003 e 163/2004.

2 – Decisão Sumária 386/2009 (P. 633/09 3ª Secção)

Confirma a inconstitucionalidade do artigo 3º nº 1 do Decreto-Lei nº 400/82 de 23-9 (como já antes havia sido declarado nos Acórdãos 70/02, 22/2003 e 163/2004.

3 – Decisão Sumária 651/2014 (P. TC 745/2014 2ª Secção).

Confirma a inconstitucionalidade do artigo 3º nº 1 do Decreto-Lei nº 400/92 de 23-9 (como já antes havia sido declarado nos Acórdãos 70/02, 22/2003 e 163/2004) quando conjugada com o artigo 40º do CPenal e com os artigos 34º nº 2 c) e d) e 65º do Decreto 44623 de 10-10-1962.

4 – Acórdão 712/2014 (P. 534/14 2ª Secção). DR de 18-12-2014.

Confirma a inconstitucionalidade do artigo 3º nº1 do Decreto-Lei nº 400/82 de 23-9 enquanto manda aplicar o limite de 1 mês previsto no artigo 40º nº 1 do CPenal (atualmente artigo 41º) ao crime de pesca ilegal previsto nos artigos 3º, 33º, 44º a) e punido nos termos do artigo 65º, todos do Regulamento da Lei 2097 aprovado pelo Decreto 44623 de 1962.

5 – Acórdão 102/2015 (P. 197/2014 – 1ª Secção).

Confirma a inconstitucionalidade do artigo 3º nº 1 do Decreto-Lei n.º 400/82 de 23-9 conjugada com os artigos 40º parágrafo 1º e 65º do Decreto 44623 de 10-10-1962.

Pela razões sumariamente atrás explicitadas e melhor desenvolvidas nos convocados Acórdãos do TC (que aqui se dão por reproduzidas) recusa-se a aplicação do convocado artigo 3.º nº 1 do D.L. 400/82, por violação dos artigos 13º, 18º e 27º da CRP, quando interpretado no sentido de que prevendo o Regulamento aprovado pelo Decreto 44623 de 10-10-1962 uma pena de prisão de 10 a 30 dias é aplicável uma pena de prisão de 30 dias.

A aplicação unicamente da pena de multa prevista no artigo 65.º do decreto n.º 44623 (já não considerando a prisão) não é uma solução viável, pois que equivaleria a ficcionar uma «nova» pena reduzida uma parte da pena aplicável, solução que não aceitamos porquanto se entende como orgânica e materialmente inconstitucional. Efetivamente é matéria de reserva relativa da AR a competência para legislar designadamente sobre crimes e penas, não cabendo aos Tribunais a definição, ainda que em sede interpretativa, de penas não previstas em legislação anterior, sob pena de violação daquela reserva e do princípio da legalidade – arts. 165.º e 29.º da CRP.

Por idênticas razões não é viável a aplicação de pena de multa de substituição à pena de prisão em abstrato aplicável. Uma coisa é a aplicação de uma pena de multa em substituição de pena de prisão que seja em abstrato de aplicar outra diversa (e para nós inadmissível) é a aplicação de uma pena de multa de substituição por se constatar pela inconstitucionalidade da pena de prisão aplicável á título principal. Tal solução mais não é do que (mais uma vez) a criação de uma «nova» pena de multa não prevista em legislação...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT