Acórdão nº 267/16 de Tribunal Constitucional (Port, 04 de Maio de 2016

Magistrado ResponsávelCons. João Cura Mariano
Data da Resolução04 de Maio de 2016
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 267/2016

Processo n.º 34/16

  1. Secção

Relator: Conselheiro João Cura Mariano

Acordam, em conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional

Relatório

  1. e outros propuseram no Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra ação administrativa especial, pedindo a ilegalidade da omissão de regulamentação do Decreto-Lei n.º 112/2001, de 6 de abril, para a carreira de inspeção do pessoal do quadro da Direção Geral de Viação prevista no n.º 2, do artigo 14.º, daquele diploma.

Em 9 de abril de 2010 foi proferida sentença que julgou improcedente o pedido e fixou, nos termos do n.º 1, do artigo 45.º, do CPTA, o prazo de 20 dias para as partes acordarem no montante da indemnização devida.

Após recurso interposto pelos Ministérios das Finanças e da Administração Interna para o Tribunal Central Administrativo Norte, que convolou o recurso em reclamação para o Tribunal Coletivo, aquela decisão foi confirmada por acórdão do Tribunal Coletivo proferido em 2 de outubro de 2013.

O Ministério das Finanças interpôs recurso desta última decisão para o Tribunal Central Administrativo Norte, a que aderiu o Ministério da Administração Interna, tendo sido proferido acórdão em 6 de março de 2015 que revogou parcialmente a decisão recorrida, tendo julgado a ação improcedente, relativamente aos Autores que não integravam a carreira de inspetor de viação e julgado verificada uma situação de impossibilidade superveniente da lide em relação aos Autores integrados na carreira de inspetor de viação, confirmando a decisão recorrida quanto à convolação objetiva do processo, apenas no que toca a este último grupo de Autores.

Alguns dos Autores interpuseram recurso desta decisão para o Supremo Tribunal Administrativo, nos termos do artigo 150.º do CPTA, que, por acórdão proferido em 11 de novembro de 2015, não admitiu a revista.

Aqueles Autores recorreram então para o Tribunal Constitucional nos seguintes termos:

“I - Norma enquadradora do recurso: artigo 70.º, n.º 1, alínea b) da Lei n.º 28/82, de 5 de novembro;

II – Norma cuja constitucionalidade se pretende que o Tribunal Constitucional aprecie: artigo 14.º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 112/2001 de 6-4,

  1. Quando interpretada e aplicada no sentido de que uma entidade pública que regulamente as carreiras de inspeção dos seus funcionários tem discricionariedade para não admitir a transição para essas carreiras de funcionários seus que exercem, de facto, no âmbito das atribuições dessa entidade, funções de inspeção, apesar de não estarem incluídos em carreiras de inspeção;

  2. quando interpretada no sentido de que permite que funcionários públicos - que exerçam de facto funções de inspeção embora não integrados em carreiras de inspeção - de duas entidades públicas distintas que regulamentem (ou que tenham regulamentado) as carreiras de inspeção de funcionários seus e a transição de funcionários seus para as novas carreiras regulamentadas nos termos do Decreto-Lei n.º 112/2001 de 6-4, possam ser tratados de forma diferente - admitidos uns, e não admitidos outros, a transitar para a carreira de inspeção consoante tal possibilidade tenha sido, ou não, prevista no diploma que, dentro da respetiva entidade pública, tenha regulamentado a carreira de inspeção, nos termos do Decreto-lei n.º 112/2001.

    III - Normas da Constituição da República Portuguesa que se considera violadas: artigos 13.º e 59.º, n.º 1, alínea a) da Constituição da República Portuguesa.

    IV - Pecas processuais nas quais a referida inconstitucionalidade foi invocada:

  3. artigos 17.º e 18.º da Petição Inicial da ação intentada no TAF de Coimbra em 19-10-2005.

    Os recorrentes alegaram a inconstitucionalidade da situação de omissão, decorrente da errada e limitativa aplicação da norma do artigo 14.º do DL 112/2001, designadamente da norma do artigo 14.º, n.º 3, logo nos artigos 17.º e 18.º da P.I. da ação intentada no TAF de Coimbra em 19-10-2005, decorrente essa inconstitucionalidade da violação do princípio da igualdade com consagração constitucional - artigo 13.º da CRP - e do princípio da igualdade de remuneração para desempenho de funções laborais idênticas previsto na alínea a) do artigo 59.º da CRP.

  4. Artigo 6.º das Conclusões das alegações de recurso, na qualidade de recorridos, para o TCA Norte.

    Nesse artigo das Conclusões das Alegações os Autores, ora recorrentes, alegam que foram objeto de tratamento omissivo violador do princípio da igualdade consagrado na Constituição de República Portuguesa no artigo 13.º e no artigo 59.º, n.º 1, alínea a) - na vertente de igualdade de remuneração para trabalho igual, decorrente de quer a Região Autónoma dos Açores quer a Região Autónoma da Madeira terem, através, respetivamente, dos Decretos regulamentares regionais n.ºs 21/2004/A e 18/2002/M, regulamentado as carreiras de inspeção de viação nas Regiões Autónomas prevendo a transição para essas carreiras de funcionários que exerciam de facto funções de inspeção, embora não estivessem integrados em careiras de inspeção.

  5. Petição de Recurso de Revista endereçado a esse Douto Supremo Tribunal Administrativo, nos termos que, em seguida, se passarão a expor sumariamente.

    V- Decisões Judiciais que deveriam ter conhecido da questão de inconstitucionalidade suscitada da norma do artigo 14.º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 112/2001:

    Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 6-3-2015 e Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 11-11-2015.

    VI - Fundamentação Sumária:

    Na sua fundamentação, o acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 6-3-2015 concluiu pela verificação de uma obrigação de regulamentar o D L 112/2001.

    Porém, conclui que essa obrigação apenas existia em relação aos funcionários que estavam na carreira de inspeção.

    Em relação a todos os demais autores - que não estavam em uma carreira de inspeção - concluiu que efetivamente desempenhavam funções de inspeção (facto provado) mas que não existia a obrigação de regulamentar, mas antes uma faculdade discricionária de o fazer, pelo que não poderia ser declarada uma omissão ilegal de regulamentação.

    Aquele acórdão refere expressamente que «(...) a lei distinguiu claramente entre as carreiras legalmente implementadas (n. º 1 e 2 do artigo 14. º do DL 112/2001) e as que fossem exercidas meramente de facto (n.º 3 do mesmo preceito), estabelecendo, relativamente às primeiras, o dever de regulamentar e, relativamente às segundas, uma mera faculdade de o fazer».

    E acrescenta, em consequência, que «a solução que se impõe no caso não é igual para todos os autores».

    E ainda que «no caso concreto ficou provado que os autores, ex-funcionáros das Direção-Geral de Viação, estavam integrados na carreira de inspetor de viação, uns, ou desempenhavam a funções de inspeção, outros». (. . .)

    Dai que, (...) em relação [aos AA] que apenas desempenhavam funções de inspeção mas não estavam integrados em carreira de inspeção tal omissão não se verifica

    .

    Este raciocínio do Douto acórdão do TCA Norte - e desse Douto STA no acórdão que rejeita a revista - faz uma errada aplicação do direito e conduz a uma interpretação da lei - em concreto do n.º 3 do artigo 14.º do DL 112/2001 - inconstitucional porque violadora do princípio da igualdade no reconhecimento de direitos a trabalhadores funcionários do Estado que exercem exatamente as mesmas funções.

    Todavia, ao considerar que o n.º 3 do artigo 14.º do DL 112/2001 confere uma faculdade discricionária para prever, na regulamentação das carreiras de inspeção que era devida no seio da ex-DGV, que ingressem nessas carreiras de inspeção os funcionários da ex-DGV que comprovadamente exerciam funções de inspeção embora não estivessem integrados em carreiras de inspeção.

    E que essa faculdade discricionária pode ser utilizada para deixar de fora da carreira de inspeção funcionários que exerciam apenas de facto funções de inspeção, os Doutos acórdãos recorridos acolhem uma interpretação, e fazem uma aplicação, errada e inconstitucional do referido preceito, na medida em que, no entendimento dos ora Recorrentes:

  6. A norma do n.º 3 do artigo 14.º do DL 112/2001 não atribui qualquer faculdade discricionária à entidade regulamentadora;

  7. Ainda que se reconheça uma faculdade discricionária naquela norma, o exercício daquela faculdade tem de fazer-se com respeito pelos princípios fundamentais de Direito e, designadamente, pelo princípio da igualdade e não discriminação entre funcionários públicos que exercem as mesmas funções dentro do mesmo instituto público ou departamento da administração do Estado, e ainda

  8. A interpretação do n.º 3 do artigo 14.º do DL 112/2001 proposta pelos acórdãos recorridos, conduz a que, no âmbito dos funcionários da ex-DGV que exercem, todos, comprovadamente, funções de inspeção, se estabeleça uma distinção entre os que estão numa carreia de inspeção e os que não estão, assim discriminando, de forma inconstitucional, esses funcionários do Estado em relação a outros funcionários do Estado que, no âmbito do mesmo ou de outro instituto ou departamento da Administração Pública também exerciam funções de inspeção embora não estando inseridos em carreiras de inspeção e em relação aos quais ficou prevista, por altura de regulamentação imposta pelos DL 112/2001, a sua transição para as carreiras de inspeção.

    Os mencionados Acórdãos admitem que da aplicação do artigo 14.º do Decreto-Lei 112/2001, e em especial do seu n.º 3, resulta APENAS a ilicitude da omissão de regulamentação no que respeita à integração na carreira de inspeção dos funcionários públicos da ex-DGV que estavam integrados em carreiras de inspeção e já não a ilicitude da omissão de regulamentação da integração na carreira de inspeção dos funcionários que comprovadamente desempenhavam funções de inspeção, embora não estivessem em carreiras de inspeção.

    Ora, os ora recorrentes consideram que estão abrangidos pelo n.º 3 do artigo 14.º e que, por isso, existia, também em relação a eles, a obrigação de regulamentar os termos em que a sua transição para as carreiras...

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