Decisões Sumárias nº 178/16 de Tribunal Constitucional (Port, 18 de Março de 2016
Magistrado Responsável | Cons. Maria José Rangel de Mesquita |
Data da Resolução | 18 de Março de 2016 |
Emissor | Tribunal Constitucional (Port |
DECISÃO SUMÁRIA N.º 178/2016
Processo n.º 152/16
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Secção
Relatora: Conselheira Maria José Rangel de Mesquita
I Relatório
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Nos presentes autos, vindos do Supremo Tribunal de Justiça (STJ), em que é recorrente A. e recorridos o Ministério Público e B., o primeiro vem interpor recurso, ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, na sua atual versão (LTC), do acórdão daquele Tribunal de 25/11/2015 (cfr. fls. 421-453), que julgou improcedente o recurso interposto pelo ora recorrente do acórdão proferido pelo Coletivo do Tribunal Judicial da Comarca de Braga, depositado em 25/05/2015, o qual, por seu turno, efetuado o cúmulo jurídico das penas aplicadas nos processos 906/13.7PBBRG, 879/13.6PBBRG e 1581/13.4PBBRG (respetivamente de dois anos de prisão, de dois anos e seis meses de prisão e de quatro anos de prisão, todas suspensas na sua execução), condenou o arguido (ora recorrente) na pena única de seis anos de prisão efetiva.
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É este o teor do requerimento de interposição de recurso formulado pelo recorrente (cfr. fls. 477-478):
A., Recorrente nos autos à margem identificados, notificado do douto acórdão de 21-01-2016, no qual foi decidido indeferir a pretensão de correcção do dou to acórdão de 25-11-2015, deste vem interpor
RECURSO PARA O TRIBUNAL CONSTITUCIONAL
com subida imediata e efeito suspensivo, nos termos do disposto no n.º 3, do art. 78.º da LTC,
com os seguintes fundamentos:
I. Decisão de que se recorre:
Pelo presente recurso, vem impugnada a decisão do douto acórdão de 25-11-2015.
Desta decisão não cabe recurso ordinário.
II. Tempestividade:
Em 11-12-2015, o ora Recorrente requereu a correcção do douto acórdão de 25-11-2015.
Por novo acórdão de 21-01-2016, foi indeferida a referida pretensão.
Nos termos do disposto no n.º 1, do art. 75.° da LTC, "o prazo de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional é de 10 dias", que se contam a partir da notificação da decisão (Acs. TC n.º 105/84 e n," 265/99).
O ora Recorrente arguiu a irregularidade do douto acórdão de 25-11-2015 e requereu a sua correcção, pelo que o prazo para interposição de recurso só começou a ser contado a partir da data notificação da decisão que procedeu ao seu julgamento, proferida em 21-01- 016 (Acs. TC n.º 419/2011 e 427/2012; e BLANCO DE MORAIS, Justiça Constitucional, Tomo 11, Coimbra, 2005, p. 666).
Assim, o presente recurso está em tempo.
III. Pressupostos e requisitos previstos no art. 75.º-A da LTC
O presente recurso é interposto ao abrigo da al. b), do n.º 1, do art. 70.° da LTC.
Com o presente recurso, o Recorrente pretende que o Tribunal Constitucional aprecie a inconstitucionalidade das normas contidas nos n.ºs 1 e 2, do art. 77.° do Código Penal, interpretadas no sentido de que, em cúmulo jurídico de penas parcelares de prisão, suspensas na sua execução, é admissível a aplicação de uma pena única de prisão efectiva;
porque estas normas, com a referida interpretação, violam o principio da legalidade, consagrado no art. 29.° da CRP, os princípios do caso julgado, da culpa e da proporcionalidade e necessidade, este consagrado no art. 18.° da CRP, e todos inerentes ao Estado de Direito Democrático, como consagrado no art. 2.° da CRP.
O ora Recorrente suscitou a questão da inconstitucionalidade dessas normas, com a referida interpretação, no recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, apresentado no dia 23-06-2015.
Termos em que, respeitosamente, requer que seja admitido o presente recurso.
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O recurso de constitucionalidade foi admitido por despacho do Tribunal a quo de fls. 480.
Cumpre apreciar e decidir.
II Fundamentação
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Recorde-se que a questão de constitucionalidade é enunciada no requerimento de interposição de recurso por referência à interpretação das normas dos n.ºs 1 e 2 do artigo 77.º do Código Penal, «no sentido de que, em cúmulo jurídico de penas parcelares de prisão, suspensas na sua execução, é admissível a aplicação de uma pena única de prisão efectiva», porquanto, segundo o recorrente, «estas normas, com a referida interpretação, violam o princípio da legalidade, consagrado no art. 29.° da CRP, os princípios do caso julgado, da culpa e da proporcionalidade e necessidade, este consagrado no art. 18.° da CRP, e todos inerentes ao Estado de Direito Democrático, como consagrado no art. 2.° da CRP.» (cfr. requerimento de interposição de recurso, III, fls. 477-verso).
Assim dispõe o artigo 77.º do Código Penal:
Artigo 77.º
Regras da punição do concurso
1 - Quando alguém tiver praticado vários crimes antes de transitar em julgado a condenação por qualquer deles é condenado numa única pena. Na medida da pena são considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente.
2 - A pena aplicável tem como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes, não podendo ultrapassar 25 anos tratando-se de pena de prisão e 900 dias tratando-se de pena de multa; e como limite mínimo a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes.
3 - Se as penas aplicadas aos crimes em concurso forem umas de prisão e outras de multa, a diferente natureza destas mantém-se na pena única resultante da aplicação dos critérios estabelecidos nos números anteriores.
4 - As penas acessórias e as medidas de segurança são sempre aplicadas ao agente, ainda que previstas por uma só das leis aplicáveis.
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Pode assinalar-se, a partir da leitura das alegações de recurso para o Supremo Tribunal de Justiça (peça processual identificada pelo recorrente no requerimento de recurso para o Tribunal Constitucional como aquela em que terá suscitado a questão de constitucionalidade junto do Tribunal recorrido), uma certa imprecisão na formulação da questão de constitucionalidade, tendo em conta que o recorrente invoca junto do Tribunal a quo outras bases legais (designadamente o artigo 78.º do Código Penal) de cuja interpretação decorreriam as alegadas inconstitucionalidades.
Alegou então o recorrente, concluindo (cfr. Alegações de recurso para o STJ, Conclusões nona a décima quinta, fls. 390 e 390-verso):
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Nona: As regras de punição do concurso, previstas nos arts. 77.° e 78.° CP não prevêem, expressamente, a possibilidade de conversão, em cúmulo jurídico, depenas parcelares de prisão, suspensas na sua execução, numa pena única de prisão efectiva.
Décima: As normas estabelecidas nos arts. 77.° e 78.° do CP, com a interpretação que delas foi feita pelo Tribunal a quo, segundo a qual é admissível a aplicação de uma pena única de prisão efectiva, em cúmulo jurídico de penas parcelares de prisão, suspensas na sua execução, viola o princípio da legalidade, consagrado no art. 29.° da CRP, designadamente, na vertente estabelecida no seu n.º 3, inconstitucionalidade que expressamente se invoca, para todos os efeitos.
Décima primeira: A norma prevista no art. 77.°, n.º 2 do CP tem como fim evidente impedir que, em cúmulo jurídico, seja aplicada uma pena única que seja mais gravosa para o arguido do que o conjunto das penas parcelares concretamente aplicadas.
Décima segunda: A referida norma do art. 77.°, n.º 2 do CP estatui que, na determinação da pena única aplicável, sejam respeitadas as decisões aplicadas no julgamento de cada um dos vários crimes, que implicaram a apreciação dos pressupostos de punição e aplicação das penas, designadamente, a culpa do agente.
Décima terceira: Salvo o devido respeito e melhor opinião, a estatuição do limite máximo à pena única aplicável, na norma do art. 77.°, n.º 2 do CP, é um corolário dos princípios do caso julgado, da culpa e da proporcionalidade e necessidade, consagrado no art. 18.° da CRP, todos inerentes a um Estado de direito democrático, como consagrado no art. 2.° da CRP.
Décima quarta: A pena de prisão efectiva restringe o núcleo duro do direito à liberdade, bem como do direito ao desenvolvimento pessoal e, ainda que mais curta na sua duração, é, objectiva e inquestionavelmente, mais gravosa do que a pena de prisão, suspensa na sua execução, pelo que, sob pena de violação dos princípios constitucionais referidos na conclusão décima terceira, que antecede, a norma prevista no art. 77.°, n.º 2 do CP não pode ser interpretada em termos meramente aritméticos.
Décima quinta: A interpretação da norma estatuída no art. 77.°, n.º 2 do CP, feita pelo Tribunal a quo, segundo a qual é admissível a aplicação de uma pena única de prisão efectiva, em cúmulo jurídico de penas parcelares de prisão, suspensas na sua execução, não se compagina com a teleologia da norma e viola os princípios do caso julgado, da culpa e da proporcionalidade e necessidade, consagrado no art. 18.° da CRP, todos inerentes ao Estado de direito democrático, como consagrado no art. 2.° da CRP, inconstitucionalidade que expressamente se invoca, para todos os efeitos.
E assim decidiu o Supremo Tribunal de Justiça as questões de inconstitucionalidade suscitadas pelo recorrente (cfr. Acórdão de 25/11/2015, recorrido, fls. 450-452):
( )
Questão III - Inconstitucionalidade
O recorrente nas conclusões nona e décima invoca a inconstitucionalidade das normas estabelecidas nos artigos 77.° e 78.° do CP, pois a interpretação que delas foi feita pelo Tribunal a quo, segundo a qual é admissível a aplicação de uma pena única de prisão efectiva, em cúmulo jurídico de penas parcelares de prisão, suspensas na sua execução, viola o princípio da legalidade, consagrado no art. 29.° da CRP, designadamente, na vertente estabelecida no seu n.º 3.
Nas conclusões décima primeira a décima quinta defende que "a interpretação da norma estatuída no art. 77.°, n.º 2 do CP, feita pelo Tribunal a quo, segundo a qual é admissível a aplicação de uma pena única de prisão efectiva, em cúmulo jurídico de penas parcelares de prisão, suspensas na sua execução, não se compagina com a teleologia da norma e viola os princípios do caso julgado, da culpa e da proporcionalidade e necessidade, consagrado no art. 18.° da CRP, todos inerentes ao...
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