Acórdão nº 321/16 de Tribunal Constitucional (Port, 19 de Maio de 2016

Magistrado ResponsávelCons. Teles Pereira
Data da Resolução19 de Maio de 2016
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 321/2016

Processo n.º 1077/15

1.ª Secção

Relator: Conselheiro Teles Pereira

Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional

I – A Causa

1. A. (ora Recorrente) deduziu, junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, oposição à execução fiscal que, tendo sido inicialmente movida contra “A1, Lda.” (devedora principal), para cobrança de dívidas de IVA, IRS e coimas, prosseguiu contra o opoente, como responsável subsidiário, por reversão.

Aí sustentou o opoente, em síntese, que a administração tributária não teria feito prova de culpa – dele opoente – na causação de insuficiência do património da sociedade para pagamento da dívida tributária. Concluiu pedindo a extinção da execução.

1.1. Entretanto, o opoente apresentou nos autos requerimento dando conta de que, no processo de insolvência da sociedade “A1, Unipessoal, Lda.” (a devedora originária), o tribunal respetivo “[…] concluiu pela ausência de culpa […]”. Juntou a respetiva decisão judicial que, nos termos do artigo 188.º, n.º 4, do CIRE (na redação emergente do Decreto-Lei n.º 53/2004, de 18 de março), qualificou tal insolvência como fortuita, na sequência de pareceres concordantes do administrador e do Ministério Público (fls. 64 a 67).

1.1.1. Foi proferida decisão pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, julgando extinta a instância por inutilidade superveniente da lide relativamente à reversão por dívida de coimas e, no mais, julgando a oposição improcedente, entendendo-se a reversão operada nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 24.º da Lei Geral Tributária (LGT), sendo que, nesse caso, a culpa do revertido é presumida.

1.2. Inconformado com a decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, o opoente recorreu para o Tribunal Central Administrativo (TCA) Sul. Nesse contexto, entre outros argumentos, sustentou que a sua falta de culpa se deve ter por demonstrada em virtude da declaração do caráter fortuito da insolvência, concluindo que:

“[…]

A interpretação de que, para efeitos do artigo 24.º, n.º 1, al. b), da LGT, se desconsidere a prova da ausência de culpa apurada no âmbito da qualificação da insolvência é inconstitucional, por violação do artigo 266.º, n.º 2, da CRP.

[…]”.

1.2.1. Proferiu, então, o TCA sul acórdão negando provimento ao recurso, considerando, designadamente, que a declaração do caráter fortuito da insolvência não afastava a presunção prevista na alínea b) do n.º 1 do artigo 24.º da LGT.

1.2.2. Inconformado, pretendeu o opoente interpor recurso para o Supremo Tribunal Administrativo (STA), invocando oposição de acórdãos. No entanto, o STA considerou não existir qualquer oposição entre as decisões indicadas pelo Recorrente, julgando o recurso findo.

1.3. O opoente interpôs, então, recurso para o Tribunal Constitucional – que deu origem aos presentes autos –, nos termos aqui reproduzidos:

“[…]

Vem apresentar recurso para o Tribunal Constitucional, com fundamento na alínea b), do art. 70.º, da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional […].

[…]

I – O acórdão agora notificado confirma o de 26/06/2014, sendo certo que na petição deste último recurso alegou o recorrente que a interpretação do art. 24.º, n.º 1, al. b), da LGT que desconsidere a prova de ausência da culpa apurada no âmbito da qualificação da insolvência como fortuita é inconstitucional.

II – A causa de reversão e da declaração de insolvência culposa está precisamente no juízo de censura jurídica que é possível imputar ao administrador /gerente.

III – E é a existência de culpa que legitima a reversão das dívidas tributárias.

IV – Por isso, entende o recorrente. que a não consideração da prova de ausência de culpa na insolvência (com a sua qualificação como fortuita) para efeitos do art. 24.º, n.º 1, al. b), da LGT é inconstitucional.

V – Por violação do art. 266.º, n.º 2, da CRP, que obriga a Administração Fiscal a atuar com respeito pelo princípio da legalidade.

[…]”.

O Recorrente foi convidado no STA a esclarecer se interpunha recurso do acórdão do STA ou do acórdão do TCA Sul, tendo esclarecido que interpôs referir-se essa interposição ao acórdão do TCA.

1.4. Já no Tribunal Constitucional, foi o Recorrente notificado para alegar, indicando-se o sentido geral da matéria até então alegada nos termos seguintes (despacho do relator de fls. 246):

“[…]

[A] inconstitucionalidade do artigo 24.º, n.º 1, alínea b) da Lei Geral Tributária, na interpretação segundo a qual a responsabilidade subsidiária do gerente de uma sociedade comercial, pelo pagamento de dívidas tributárias de IVA e IRS cujos prazos de pagamento voluntário terminaram antes do trânsito em julgado da decisão de declaração de insolvência da sociedade devedora, não é afastada unicamente pela circunstância de, no processo de insolvência, ter sido proferida decisão qualificando a insolvência como fortuita, nos termos do artigo 188.º, n.º 4, do CIRE, na redação emergente do Decreto-Lei n.º 53/2004, de 18 de março, por violação do disposto no artigo 266.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa.

[…]”.

1.4.1. O Recorrente apresentou alegações, concluindo o seguinte:

“[…]

I – O Tribunal adota uma interpretação do art. 24.º, n.º 1 da Lei Geral Tributária, segundo a qual a responsabilidade de um gerente pelo pagamento de dívidas de IVA e de IRS, cujo prazo terminou em data anterior à declaração de insolvência da devedora originária não é afastada pelo qualificação de tal insolvência como fortuita, ora tal entendimento é inconstitucional, por violação do art. 266.º, n.º 2 da CRP.

II – Ora, o art. 24.º, n.º 1, al. b) da LGT prevê a inversão do ónus da prova da culpa por não pagamento relativamente às dívidas vencidas no período do exercício de tais funções.

III – Em bom rigor, o objetivo nuclear do incidente de qualificação é precisamente a apreciação da conduta do devedor e/ou dos seus administradores e tem por finalidade a responsabilização dos mesmos quando há culpa pela insolvência.

IV – Na verdade o n.º 40 do preâmbulo do Decreto-Lei n.º 53/2004, de 18 de março prevê, nomeadamente o seguinte: «O incidente destina-se a apurar (sem...

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