Acórdão nº 34/19 de Tribunal Constitucional (Port, 09 de Janeiro de 2019

Magistrado ResponsávelCons. Pedro Machete
Data da Resolução09 de Janeiro de 2019
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 34/2019

Processo n.º 956/18

2.ª Secção

Relator: Conselheiro Pedro Machete

Acordam, em conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional:

I. Relatório

1. A., notificado da Decisão Sumária n.º 764/2018 (cf. fls. 118-125), nos termos da qual se decidiu não tomar conhecimento do objeto do recurso de constitucionalidade por si interposto, veio requerer a sua «aclaração», invocando o disposto nos artigos 669.º, n.º 1, alínea a), e 716.º, do Código de Processo Civil.

Conforme relatado na referida Decisão Sumária, o recorrente nos presentes autos, em que é recorrido o Ministério Público, foi condenado, em primeira instância, pela prática, em autoria material, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto e punido pelos artigos 292.º, n.º 1, e 69.º, n.º 1, alínea a), ambos do Código Penal, na pena de 90 dias de multa, à taxa diária de €5.00, perfazendo a quantia total de €450.00, e bem assim na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados de todas as categorias pelo período de cinco meses.

Inconformado, recorreu para o Tribunal da Relação de Lisboa, que, por acórdão de 4 de julho de 2018, negou provimento ao recurso.

Deste acórdão interpôs recurso de constitucionalidade, ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (Lei do Tribunal Constitucional – LTC).

2. É a seguinte a fundamentação da decisão sumária ora reclamada:

«5. Tendo em atenção o que consta do requerimento de interposição de recurso, verifica-se que o recorrente pretende a «apreciação da inconstitucionalidade na interpretação das normas contidas no art.º 379º, n.º 1, alínea c), e n.º 2, CPP e art.º 40.º n.º 1, 69.º e 71.º, todas do Código Penal, com o entendimento imperfeito e incompletamente expresso na primária sentença – mas também emergente do conjunto do texto decisório e do alcance da própria condenação – o cumprimento da pena acessória de inibição de conduzir durante os períodos não laborais mostra-se suficiente e adequado para cumprir as finalidades da pena acessória, contribuindo, em medida significativa, para a emenda cívica do condutor imprudente ou leviano, uma vez eu lhe causará constrangimento, funcionando com o efeito de prevenção geral de proteção dos bens jurídicos fundamentais e com o princípio da prevenção especial, consciencializando-o da sua conduta errada».

In casu , o objeto do recurso prende-se exclusivamente com a eventual inconstitucionalidade da decisão recorrida.

Com efeito, não obstante o recorrente ter reportado a questão enunciada a uma suposta interpretação extraída do artigo 379.º, n.º 1, alínea c), e n.º 2, do Código de Processo Penal e dos artigos 40.º, n.º 1, 69.º e 71.º, do Código Penal, que entende ser inconstitucional, o que está em causa, verdadeiramente, na questão que coloca, é sindicar a decisão do caso concreto, e não um qualquer critério normativo de decisão aplicado, autonomamente, pelo tribunal recorrido.

Na verdade, não é condição suficiente da idoneidade do objeto do recurso «que a parte tenha, de um ponto de vista formal, equacionado uma questão de inconstitucionalidade de “normas” (não se limitando a impugnar diretamente a constitucionalidade de decisões judiciais e indicando ou especificando o sentido ou interpretação com que considera ter sido tomado e aplicado o preceito alegadamente violador da Constituição), já que – como advertem, quer a doutrina (Rui Medeiros, A Decisão de Inconstitucionalidade, pág. 347), quer a jurisprudência (cf. os Acórdãos n.ºs 196/91, e 551/01) –, importa prevenir os casos de “abuso” ou “ficção” do conceito de “interpretação normativa”, apenas com o objetivo de forjar artificialmente uma “norma” sindicável pelo Tribunal Constitucional» (v. Lopes do Rego, Os Recursos de Fiscalização Concreta na Lei e na Jurisprudência do Tribunal Constitucional, Almedina, Coimbra, 2010, p. 34).

Ora, no presente caso, para além de os preceitos legais em causa não apresentarem um teor semântico que possa, diretamente, servir de base ao enunciado que o recorrente pretender submeter a fiscalização, acresce ainda a circunstância de, na própria formulação da questão de constitucionalidade, o recorrente formular um juízo conclusivo, respeitante aos critérios de escolha e determinação da pena concreta – neste caso da pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados –, reportando-o a uma suposta interpretação das normas que, no recurso por si interposto para o Tribunal da Relação de Lisboa, entendeu terem sido violadas pela decisão de primeira instância. Acresce que a questão enunciada mais não é do que o sentido decisório que, na perspetiva do recorrente, deveria ter sido adotado pelo tribunal a quo no que respeita à referida pena acessória de proibição de conduzir (cf. conclusões VI. a IX. das alegações do recurso interposto para o Tribunal da Relação de Lisboa – fls. 60). Tal é demonstrativo de que, sob a aparência da enunciação de uma questão de constitucionalidade, o recorrente visa impugnar, em rigor, a decisão concreta e não uma qualquer dimensão normativa aplicada pelo tribunal recorrido enquanto critério de decisão.

Em suma, como resulta da enunciação da questão de constitucionalidade, bem como da simples leitura do que demais consta do requerimento de interposição de recurso, o que o recorrente pretende é questionar o juízo efetuado pelo tribunal recorrido no que respeita à verificação dos pressupostos e ao modo de aplicação da pena acessória de proibição de conduzir prevista no artigo 69.º do Código Penal.

Ora, e como mencionado, o Tribunal Constitucional português, no âmbito da fiscalização concreta, aprecia apenas problemas de constitucionalidade normativa, não detendo competência para rever ou reexaminar, de qualquer outro modo, as decisões proferidas pelos outros tribunais, designadamente no que se reporta à aferição dos critérios a aplicação de uma pena acessória.

É, por conseguinte, evidente a inidoneidade do objeto do presente recurso no que respeita a esta questão, o que determina o não conhecimento do respetivo mérito.

6. Por outro lado, e não menos decisivamente, falece legitimidade ao recorrente para a interposição do presente recurso, por falta de suscitação, de modo processualmente adequado perante o tribunal a quo, de uma questão de constitucionalidade (cf. artigo 72.º, n.º 2, da LTC).

Conforme se referiu, e seguindo a indicação do próprio recorrente, este pretende sindicar uma dada interpretação das normas contidas no art.º 379º, n.º...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT