Acórdão nº 14/19 de Tribunal Constitucional (Port, 09 de Janeiro de 2019

Magistrado ResponsávelCons. Gonçalo Almeida Ribeiro
Data da Resolução09 de Janeiro de 2019
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 14/2019

Processo n.º 784/2018

3ª Secção

Relator: Conselheiro Gonçalo de Almeida Ribeiro

Acordam, em conferência, na 3ª secção do Tribunal Constitucional

I. Relatório

1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal da Relação do Porto, em que é recorrente A. e recorridos o Ministério Público, B., Ld.ª e C., Ld.ª, foi interposto o presente recurso, ao abrigo das alíneas b) e f) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (Lei do Tribunal Constitucional, referida adiante pela sigla «LTC»), do acórdão daquele Tribunal, de 24 de julho de 2018.

2. Pela Decisão Sumária n.º 759/2018, decidiu-se, ao abrigo do disposto no artigo 78.º-A, n.º 1, da LTC, não tomar conhecimento do objeto do recurso interposto. Tal decisão tem a seguinte fundamentação:

«6. Segundo o disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 280.º, da Constituição, e na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º, da LTC, cabe recurso para o Tribunal Constitucional das decisões dos tribunais que apliquem norma cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo, «identificando-se assim, o conceito de norma jurídica como elemento definidor do objeto do recurso de constitucionalidade, pelo que apenas as normas e não já as decisões judiciais podem constituir objeto de tal recurso» (v. Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 361/98).

O recorrente enuncia nos seguintes termos o objeto do recurso: «[n]o Requerimento com a ref.ª 28811532, de 05.02.2018, foi pedida ao Tribunal de 1ª Instância a questão da inconstitucionalidade para dar cumprimento ao art.º 113º, 196.º, 250.º, 333.º e 334.º do C.P.P. e violação do art.º 5º da Convenção de Viena (Lei n.º 183/72 de 30 de maio). A não aplicação das referidas normas viola os arts.º 18 e 32.º da C.R.P. Este entendimento normativo do Tribunal da Relação é inconstitucional, por flagrante, desproporcional, intolerável e iníqua denegação do direito ao recurso, tal como está consagrado no art.º 32.º n.º 1 da CRP e no art.º 2º do protocolo n.º 7 à Convenção Europeia dos Direitos do Homem. O acórdão de 1ª Instância e o Tribunal da Relação adotaram um entendimento normativo do art.º 334º n.º 2, 4 e 6 do CPP que viola claramente o nº 6 do art.º 32.º da CRP.(…) Assim sendo, deverão V/s Ex/s declarar inconstitucionais as seguintes normas do C.P.P. por violação do art.º 18.º e 32.º da CRP: - Arts.º 58º, 59º, 113.º, 196º, 250º, 333.º e 334º. Mais deverá ser declarada inconstitucional a não aplicação do art.º 5º da Lei n.º 183/72 de 30 de maio (Convenção de Viena) por violação do art.º 8.º da CRP.».

Por outras palavras, o recorrente considera que a decisão recorrida, ao admitir que o arguido seja julgado e condenado sem nunca ter sido previamente constituído como arguido, sem ter sido notificado pessoalmente da decisão condenatória e tendo apenas prestado termo de identidade e residência perante uma autoridade consular, é ilegal, por não ter dado cumprimento ao disposto nos artigos 113.º, 196.º, 250.º, 333.º e 344.º, todos do Código de Processo Penal e do artigo 5.º da Convenção de Viena sobre Relações Consulares, de 24 de abril de 1963, aprovada, para adesão, pelo Decreto-Lei n.º 183/72, de 30 de maio. (Note-se que o recorrente não só confunde o articulado da Convenção com o do Decreto-Lei que a aprovou para adesão, como também confunde sistematicamente esta Convenção com a Convenção sobre Relações Diplomáticas, concluída em Viena em 18 de abril de 1961, aprovada para adesão pelo Decreto-Lei n.º 48 295, de 27 de março de 1968, publicada no Diário da República I, n.º 74, de 27-03-1968). E, sendo ilegal, é também inconstitucional, por violação dos artigos 8.º, 18.º e 32.º, da Constituição.

Ora, embora o recorrente afirme a inconstitucionalidade de um entendimento normativo adotado pelo Tribunal da Relação a respeito do artigo 334.º, n.os 2 e 4, do Código de Processo Penal, o certo é que nunca chega a enunciar tal norma, apesar de convidado a fazê-lo com precisão. Ao invés, na economia da sua argumentação, a decisão recorrida viola, pura e simplesmente, o disposto nos aludidos preceitos. Porém, essas não são questões de constitucionalidade normativa, mas sim de eventual violação ou de errada interpretação de preceitos da lei ordinária e de direito internacional convencional, matéria de que não cuida o Tribunal Constitucional, no âmbito dos recursos de fiscalização concreta da constitucionalidade.

Vale isto por dizer que o objeto do presente recurso não possui natureza normativa, pois esta implica que aquele diga respeito à violação da Constituição pela lei, tal como interpretada na decisão recorrida, e não à violação da Constituição pelo tribunal recorrido, como sustenta o recorrente.

7. Sublinhe-se ainda que, já no recurso interposto para o tribunal recorrido, o recorrente configurou a questão de constitucionalidade nos termos mencionados. Significa isto que, independentemente da análise a que se procedeu, assente no conteúdo do requerimento de interposição do recurso de constitucionalidade, sempre estaria por preencher o requisito da suscitação prévia a adequada, perante o tribunal recorrido, de uma qualquer verdadeira questão de constitucionalidade normativa, designadamente reportada aos artigos 58.º, 59.º 113.º, 196.º, 250.º, 333.º, 334.º todos do Código de Processo Penal e artigo 5.º da Convenção de Viena de 24 de abril de 1963, como impõe o n.º 2 do artigo 72.º da LTC.

Face ao exposto, resta concluir pela impossibilidade de conhecimento do objeto do recurso...

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