Acórdão nº 26/19 de Tribunal Constitucional (Port, 09 de Janeiro de 2019

Magistrado ResponsávelCons. Lino Rodrigues Ribeiro
Data da Resolução09 de Janeiro de 2019
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 26/2019

Processo n.º 1118/18

3.ª Secção

Relator: Conselheiro Lino Rodrigues Ribeiro

Acordam, em conferência, na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional

I – Relatório

1. Nos presentes autos, vindos do Supremo Tribunal de Justiça, em que é recorrente A. e recorrido o Ministério Público, o primeiro interpôs recurso de constitucionalidade ao abrigo do disposto no artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (LTC), da decisão proferida por aquele Tribunal no dia 12 de outubro de 2018, que manteve a decisão do mesmo Tribunal de não admitir o recurso para aí interposto pelo arguido. Fundou-se esta decisão no disposto no artigo 400.º, n.º 1, alínea e), do Código de Processo Penal (CPP).

O arguido foi condenado na 1.ª instância em pena de 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de prisão pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo disposto no artigo 21.º do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro, tendo o Tribunal da Relação do Porto, por acórdão de 13 de junho de 2018, negado provimento ao recurso interposto pelo arguido daquela decisão. O arguido reclamou do acórdão do Tribunal da Relação, invocando omissão de pronúncia, tendo esta reclamação sido indeferida por acórdão proferido pelo mesmo Tribunal no dia 11 de julho de 2018. Deste acórdão interpôs o arguido recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, que o rejeitou, por decisão de 27 de agosto de 2018. O arguido apresentou reclamação deste despacho para o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, que a indeferiu através da referida decisão de 12 de outubro de 2018.

2. Desta decisão interpôs então o arguido recurso para o Tribunal Constitucional, o que fez nos seguintes termos:

«EXMOS. SENHORES JUÍZES DO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL

No recurso que deu entrada em juízo no douto Tribunal da Relação do Porto, o Arguido, ora recorrente, arguiu o vício de inconstitucionalidade material por violação do princípio constitucional da garantia do processo criminal, previsto no art. 32 nº 2 da CRP, na concreta interpretação e aplicação que daqueles preceitos foi efetuada nos autos, ou seja, divergente do recorrente.

Assim, o recorrente pretende, pois, que seja, apreciada a constitucionalidade do artigo 127º do CPP que conduz à violação e não aplicação do Principio in dubio pro reo, que assegura as garantias de defesa do arguido, violando consequentemente o disposto do dito artigo 32 da CRP.

Por incorreta interpretação do artigo 127 do C.P.P. o ora recorrente foi condenado, no Processo 4592/13.6TDPRT que correu termos no Tribunal Judicial da Comarca do Porto - Porto -Juízo Central Criminal - J7 como autor material e na forma consumada pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art. 21 nº 1 do DL nº 15/93 de 22/01, com referencias às tabelas I-A e I-B anexas ao mesmo diploma, na pena de 5 anos e 6 meses de prisão efetiva.

O vicio da inconstitucionalidade ora invocado foi expressamente arguido na motivação de recurso por si apresentada ao Venerando Tribunal da Relação do Porto, nos pontos (…) que infra se transcrevem:

"G - Ora, inexiste qualquer elemento de prova que levante o mais ínfimo indício de venda de estupefacientes por parte do Arguido, pois o mesmo em momento algum vendeu produto estupefaciente!

H - Nas reiteradas e muitas escutas telefónicas existentes nos autos e nas variadas vigilâncias, não existe um único indicio, de eventuais transações de droga entre o Recorrente e eventuais "clientes", compras constantes de droga aos outros co arguidos, destes processos.

I - Nas buscas efetuadas à sua casa do arguido, em 26.03.2014 e 09.04.2015, as quais estão dadas como provadas, veja-se o douto acórdão na página 37 e 51 a fls., não existia, dinheiro em avultadas quantias monetárias, nem grandes quantidades de estupefacientes!

J - Apenas foi encontrado um conjunto de coisas que fazem parte da divisão do consumo do Arguido, uma vez que o mesmo sendo um consumidor diário tem de dividir as suas doses em função dos dias.

L - Mais, o Arguido trabalha por turnos na empresa B., e á data dos factos trabalhava corno operador de posto de abastecimento para a empresa "C., Ida, trabalhando em regime de turnos, conforme considerado provado no douto acórdão, na página 250.

M - O Arguido, como trabalhador que é, não tinha disponibilidade temporal para ir buscar droga de 10 em 10 dias, pelo que as quantidades que o mesmo detinha em seu poder, tinham em vista o seu consumo para um período mais alargado de 10 dias.

O - A busca domiciliária de 26.03.2014, onde foi apreendida a droga em sua casa foi autorizada pelo Arguido, facto que foi dado como provado pelo douto acórdão pagina 37, a fls.

P - O próprio Arguido, autorizou a busca domiciliária, sem qualquer problema, uma vez que à data dos factos, não escondia a sua dependência de consumo de heroína e cocaína.

Q - Se o arguido estivesse de má-fé, o mesmo, poderia não permitir a busca a sua casa e talvez se não a tivesse permitido, não teria sido condenado na pena a que foi!

T - Veja-se que entre todos os depoimentos dos elementos policiais envolvidos na investigação que deu causa aos presentes autos, raros são os que se referem ao recorrente e quando o identificam não se referem ao mesmo como "vendedor"!

U - O Arguido assumiu-se como consumidor de heroína e cocaína aquando da sua prestação de declarações em sede de audiência de julgamento (…).

V - Tendo tal facto sido dado como provado no douto acórdão na página 229.

W - Repare-se que o recorrente teve uma atitude que deverá ser de valorar, o que não se verificou, que é o facto de em 06.01.2011, ter tomado a iniciativa de pedir apoio ao CRI Oriental, integrando o programa da metadona, sendo que neste momento conseguiu vencer a luta contra o seu próprio vício.

AB - Por tudo o supra alegado não se compreende, salvo o devido respeito, a decisão do tribunal a quo, porquanto, o tribunal não tem suporte factual e probatório, para se convencer que de facto o recorrente se dedicava à venda de estupefacientes.

AE - No caso em apreço o arguido A., vem acusado e condenado pela prática em coautoria de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p., pelo artigo 21º nº 1 do DL nº 15/93 de 22.1.

AF - Para que o agente possa ser jurídica e penalmente responsabilizado tem que tal crime ser provado em Audiência de Julgamento sob pena de violar o princípio da imediação.

AG - A livre convicção não pode confundir-se com a íntima convicção do julgador, impondo-lhe a lei que extraia das provas um convencimento lógico e motivado, avaliadas as provas com sentido da responsabilidade e bom senso, e valoradas segundo parâmetros da lógica do homem médio e as regras da experiência.

AH - O tribunal a quo, ao condenar o arguido sem qualquer tipo de prova concreta, assistimos não à livre convicção mas antes à arbitrariedade na formação da convicção do tribunal.

AI - Considera-se pois insuficiente a prova produzida para a condenação em causa.

AJ - Violando-se nestes termos os direitos de defesa do arguido consagrado no artigo 32º nº 2 da C.R.P. designadamente o principio in dubio pro reo.

AK - O princípio do in dubio pro reo constitui uma imposição dirigida ao julgador no sentido de se pronunciar de forma favorável ao arguido, quando não tiver certeza sobre os factos decisivos para a decisão da causa; como tal, é um princípio que tem a ver com a questão de facto.

AL - Contudo entende-se que, in casu, e a terem-se como provados os factos admitidos pelo douto acórdão, dever-se-á, salvo o devido respeito, que é manifesto, convocar o art. 25 alínea a) do DL 15/93 de 22/01.

AM - Ora, a disposição contém um tipo privilegiado de tráfico de substâncias ilegais, que se sustenta na diminuição acentuada da ilicitude face à que está pressuposta no tipo base descrito no art. 21 do mesmo diploma.

AN - Esta diminuição depende, nos termos da referida norma, da verificação de determinados pressupostos que são elencados a título exemplificativo.

AO - Tem de ser feita uma ponderação global das circunstâncias que relevem do ponto de vista da ilicitude e que tornem desproporcionada e desajustada a pena do agente pelo art. 21º.

AP - Já...

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