Acórdão nº 6/18 de Tribunal Constitucional (Port, 09 de Janeiro de 2018
Magistrado Responsável | Cons. Teles Pereira |
Data da Resolução | 09 de Janeiro de 2018 |
Emissor | Tribunal Constitucional (Port |
ACÓRDÃO Nº 6/2018
Processo n.º 1003/2017
1.ª Secção
Relator: Conselheiro José António Teles Pereira
Acordam, em Conferência, na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional
I A Causa
1. A., SGPS, S.A. e 32 outras sociedades comerciais (incluindo sociedades incorporadas), melhor identificadas a fls. 3 a 6 (as ora Recorrentes) requereram a constituição de Tribunal Arbitral, no âmbito do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD). Apresentaram requerimento de pronúncia arbitral, no qual pediram: (a) a anulação de decisões de indeferimento de reclamações graciosas tomadas pela Autoridade Tributária (AT) e, consequentemente, a anulação de diversos atos de liquidação de IRC respeitantes às sociedades requerentes, no valor global de 6.119.594,28; e (b) a desconsideração de correções efetuadas a título de tributação autónoma, no valor de 305.598,73.
1.1. O processo seguiu os seus termos, com apresentação de resposta pela AT e alegações escritas de ambas as partes, culminando em acórdão arbitral, datado de 03/09/2017, pelo qual foi julgado totalmente improcedente o pedido arbitral formulado.
1.2. Inconformadas com tal decisão, as Requerentes dela interpuseram recurso para o Tribunal Constitucional, nos termos seguintes:
[ ]
A) O recurso é interposto da douta decisão (notificada em 05/09/2017) proferida nos autos do processo à margem referenciado que julgou totalmente improcedente o seguinte pedido arbitral formulado: (a) a anulação das decisões de indeferimento das Reclamações Graciosas sub judice e, em consequência disso, a anulação dos atos de liquidação de IRC n.ºs ( ) no montante global de 6.119.594,28 (seis milhões, cento e dezanove mil, quinhentos e noventa e quatro euros e vinte e oito cêntimos), correspondentes a um montante total a pagar de 5.897.281,65 e a um reembolso no montante de 222.312,63; e (b) serem desconsideradas as correções efetuadas a titulo de tributação autónoma, no montante de 305.598,73.
B) O recurso é interposto com fundamento na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro.
C) A douta decisão recorrida, na interpretação e aplicação que faz do artigo 69.º do Código do IRC, no caso sub judice, viola de forma inequívoca o principio da proporcionalidade a que aludem os artigos 266.º, n.º 2, e 18.º, n.º 2, ambos da CRP.
D) As recorrentes suscitaram a inconstitucionalidade não só no pedido de pronúncia arbitral (cfr. pontos 395.º a 524.º de tal articulado), mas também nas alegações que apresentaram por escrito (cfr. pontos 166.º a 247.º dessa peça).
[ ] (sublinhados acrescentados)
1.2.1. O recurso foi admitido no CAAD, por despacho de 18.09.2017.
1.3. No Tribunal Constitucional, foi proferida decisão sumária pelo relator (coube-lhe o número 692/2017), nos termos do artigo 78.º-A, n.º 1, da LTC, no sentido do não conhecimento do objeto do recurso, com os fundamentos seguintes:
[ ]
2.2. [ ] [L]ido o requerimento de interposição de recurso (cfr. item 1.2. supra) e, bem assim, as posições assumidas pelas sociedades Recorrentes no processo até esse momento, verifica-se que as apontadas condições de admissibilidade não se mostram verificadas.
É patente que, ao longo do processo, não foi suscitada qualquer questão de inconstitucionalidade com adequada dimensão normativa (cfr. artigo 72.º, n.º 2, da LTC).
Na longa exposição para a qual as Recorrentes remetem no requerimento de interposição do recurso (130 artigos do requerimento inicial e 82 artigos das alegações escritas cfr. fls. 53 a 72, no 1.º volume, e fls. 20563 a 20572, no 42.º volume, respetivamente) há várias referências a questões jurídico-constitucionais, mas nenhuma delas com dimensão normativa (a título meramente exemplificativo, no requerimento inicial: [ ] acontece que não pode, contudo, a AT demitir-se da aplicação dos princípios constitucionais que devem reger toda a sua atividade, aquando da interpretação das normas ínsitas nos n.ºs 8 e 9 do artigo 69.º do Código do IRC, fazendo tábua rasa dos mesmos, como se tais princípios simplesmente não existissem; à luz do entendimento da Recorrente, e no que diz respeito à matéria que cumpre apreciar, mesmo que se admitisse a existência de um incumprimento da obrigação tributária, sempre se deveria entender que a decisão da AT é inconstitucional, na medida em que aplica à mora de dois dias, a taxa de juro de mora de dois meses; no caso ora em apreço, importa então aferir se o sacrifício (imposto a pagar) das aqui Requerentes (bem como das restantes sociedades do grupo), é proporcional ao interesse estatal que se trata de salvaguardar (evasão fiscal e aproveitamento fiscal ilícito); a disposição normativa em causa artigo 69.º, n.º 8, alínea b), do CIRC e bem assim a aplicabilidade da mesma no caso concreto não parece passar no teste da proporcionalidade»; «determinar a cessação in totum do RETGS a todo o grupo de sociedades em virtude de um puro (alegado) lapso no preenchimento das comunicações de entrada ou saída de sociedades do respetivo perímetro de um grupo de tributação ( ) lesa o princípio da proporcionalidade que, conforme se viu, beneficia de proteção Constitucional; e, ainda no requerimento inicial, em jeito de conclusão, fica assim evidenciado que a cominação legal imposta a todas as sociedades do A. encerra uma sanção manifestamente excessiva e desproporcionada, ( ) razão pela qual nos deparamos com uma aplicação claramente ilegal e inconstitucional do artigo 69.º, n.º 8, alínea b), do Código do IRC; e, nas alegações escritas, para além de passagens que retomam as atrás citadas, não pode, contudo, a AT demitir-se da aplicação dos princípios constitucionais que devem reger toda a sua atividade, aquando da interpretação das normas ínsitas nos n.ºs 8 e 9 do artigo 69.º do Código do IRC, fazendo tábua rasa dos mesmos, como se tais princípios simplesmente não existissem; ao pretender que cada uma das sociedades que se encontravam integradas no perímetro fiscal do A. sejam autónoma e individualmente tributadas, no período de tributação de 2011, em virtude do alegado incumprimento do artigo 69.º do Código do IRC, a AT incorre numa decisão que se mostra absolutamente desadequada e violadora dos princípios gerais de direito).
As Recorrentes não põem em causa, nos articulados, qualquer norma adequadamente delimitada, posicionando-se, antes, diretamente (e, em várias passagens, expressamente), contra a própria decisão da AT, não construindo a sua crítica por referência a um critério normativo que a tenha suportado. Ora, tal construção não constitui, como vimos já, desligada que seja de um sentido normativo específico e adequadamente delimitado, uma questão de inconstitucionalidade apta a desencadear um recurso de fiscalização concreta previsto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC.
Ainda que os argumentos usados pelas Recorrentes, nos segmentos atrás referidos, se reconduzissem à invocação de normas ou princípios constitucionais ou à interpretação da lei em conformidade com normas constitucionais (no enquadramento dado pelas próprias Recorrentes, claro está), o certo é que a partir de uma discussão jurídica substancial ainda que assente em argumentos de conformidade constitucional não se pode, sem mais, considerar suscitada uma questão com adequada dimensão normativa, muito menos quando (como é o caso) as Recorrentes se abstiveram de enunciar o sentido (a interpretação) da norma que operou como critério de decisão com suficiente clareza, o que consubstanciava um ónus sobre elas impendente (não se bastando o ónus da suscitação prévia da questão de inconstitucionalidade normativa com a mera remissão para a letra de um preceito legal). Dúvidas não restam, por outro lado, de que as Recorrentes dispunham de todas as condições de construir a questão de inconstitucionalidade normativa, porquanto tinham os dados relevantes para apresentar os termos do que, na sua tese, constituiria o desvio às normas constitucionais.
Acrescente-se, a terminar, que o próprio requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional (cfr. item 1.2., supra) reflete as mesmas insuficiências, limitando-se a remeter para a interpretação de certo preceito levada a cabo na decisão recorrida, sem que a tenham enunciado e delimitado.
Em suma, as Recorrentes não invocaram, ao longo do processo podendo fazê-lo , a dimensão normativa do critério de decisão. Como tal, não pode considerar-se cumprido o ónus previsto no n.º 2 do artigo 72.º da LTC, o que, inexoravelmente, compromete o recurso.
2.3. Resta, pois, concluir pela (ostensiva) inadmissibilidade do recurso interposto, sem que se justifique o convite ao aperfeiçoamento do respetivo requerimento de interposição, porquanto as insuficiências evidenciadas não podem superar-se mediante meras correções formais.
[ ]
1.3.1. Inconformadas com a decisão sumária, as Recorrentes dela reclamaram para a conferência, nos termos do artigo 78.º-A, n.º 3, da LTC, alegando o seguinte:
[ ]
1. O presente recurso de inconstitucionalidade vem interposto de uma decisão arbitral que julgou improcedente o pedido de impugnação de um conjunto de atos tributários que (i) determinaram a cessação da aplicação do Regime Especial de Tributação dos Grupos de Sociedades (RETGS) aos Recorrentes, com efeitos a partir do final do período de tributação anterior a 2011; e (ii) corrigiram a liquidação de IRC desse ano para as várias sociedades do A., procedendo ao cálculo do...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO