Acórdão nº 155/18 de Tribunal Constitucional (Port, 14 de Março de 2018

Magistrado ResponsávelCons. Fernando Vaz Ventura
Data da Resolução14 de Março de 2018
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 155/2018

Processo n.º 333/2017

2ª Secção

Relator: Conselheiro Fernando Ventura

Acordam na 2.ª secção do Tribunal Constitucional

I. Relatório

1. A. interpôs recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo das alíneas b) e f) do artigo 70º da Lei nº 28/82, de 15 de novembro (Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional, doravante LTC), do acórdão proferido em 16 de fevereiro de 2017 pelo Tribunal Central Administrativo Sul (TCAS).

2. O ora recorrente A. demandou, através de ação administrativa especial, o Instituto da Segurança Social, pedindo a declaração de nulidade do ato administrativo que determinou o montante da sua pensão de reforma, por resultar da aplicação de norma inconstitucional – o artigo 101º, n.º 1, do Decreto-Lei nº 187/2007, de 10 de maio, quando conjugado com as normas dos artigos 33.º e 34.º do mesmo diploma legal – em virtude da violação dos princípios constitucionais da proteção da confiança, da proporcionalidade e da igualdade, assim como por ilegalidade, por violação dos artigos 100.º e 101.º da Lei de Bases da Segurança Social (Lei nº 4/2007, de 16 de janeiro); a condenação da demandada a pagar-lhe uma pensão de reforma calculada de acordo com as regras constantes do Decreto-Lei nº 35/2002, de 19 de fevereiro, ou, caso assim não se entenda, de acordo com as regras constantes do Decreto-Lei nº 187/2007, sem a aplicação do artigo 101.º, n.º 1; e a condenação da entidade demandada a pagar-lhe indemnização correspondente à diferença entre a pensão de reforma assim calculada e a pensão mensal que tem vindo a ser paga, a apurar mensalmente até à prolação da sentença.

Por acórdão proferido em 9 de novembro de 2012, o Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra julgou a ação improcedente. Inconformado, o demandante recorreu para o TCAS, que negou provimento ao recurso, afastando a violação dos parâmetros de constitucionalidade e legalidade suscitada pelo recorrente, aderindo à fundamentação constante do Acórdão n.º 188/2009.

3. É desta a decisão que vem interposto o presente recurso, pretendendo o recorrente ver apreciadas:

«a) A inconstitucionalidade material do artigo 101º, nº 1, do Decreto-Lei nº 187/2007, de 10 de Maio, por violação dos seguintes preceitos e princípios: princípio da proteção da confiança, ínsito no princípio do Estado de Direito, previsto no artigo 2º da Constituição e consagrado no artigo 18º, n 3 da C.R.P.; princípio da proporcionalidade, consagrado no artigo 18º, nº 2, da C.R.P., a propósito da proteção dos direitos, liberdades e garantias, e no artigo 266º, nº 2, da C.R.P., enquanto critério orientador da atividade político-legislativa e da atividade administrativa; princípio da igualdade, consagrado no artigo 13º da Constituição da República Portuguesa

b) A ilegalidade do citado artigo 101º, nº 1, do Decreto-Lei nº 187/2007, de 10 de Maio, por violação dos artigos 20º, 66º, nºs 1 e 2, 63º, nº 1, 100º e 101º da Lei de Bases da Segurança Social (Lei nº 4/2007, de 16 de Janeiro).»

4. Admitido o recurso e remetido o processo, neste Tribunal foi determinado o prosseguimento para alegações.

O recorrente alegou, formulando as seguintes conclusões (na formulação corrigida de erros de escrita, cuja retificação foi requerida a fls. 761 e segs.):

«I. Até hoje, o Tribunal Constitucional ainda não apreciou a ilegalidade do artigo 101.º do Decreto-Lei 187/2007, por violação dos artigos 100.º e 101.º da Lei nº 4/2007, de 16 de Janeiro, ("Lei de Bases da Segurança Social" ou Lei de Bases").

II. No seu Acórdão nº 188/2009, proferido em 22 de Abril de 2009, num processo de fiscalização abstrata sucessiva do artigo 101º, nº 1, do DL nº 187/2007, a pedido do Provedor de Justiça, o TC não apreciou a referida ilegalidade, uma vez que essa apreciação não lhe foi solicitada.

III. [eliminada, fls. 763]

IV. [o Tribunal de primeira instância deu como provado que em 2011], por aplicação do artigo 101º, nº 1, do Decreto-Lei 187/2007, a Segurança Social fixou o montante da pensão do Recorrente, em € 5.290,33 €.

V. [eliminada, fls. 763]

VI.O artigo 101º, nº 1, do DL nº 187/07, limitou assim de forma drástica e retroativa a parcela essencial da fórmula de cálculo da pensão do Recorrente: a parcela P1, que se baseia na remuneração média mensal dos melhores 10 dos últimos 15 anos de carreira contributiva.

VII.O cálculo da pensão com base na parcela P I corresponde ao regime de cálculo das pensões que vigorou durante 44 anos dos 47 anos de carreira contributiva do Recorrente, até à entrada em vigor do DL nº 187/2007.

VIII.O limite introduzido pelo artigo 101.º, nº 1, do Decreto-Lei 187/2007 viola o artigo 101 º da Lei de Bases, uma vez que, como resulta dos factos provados, reduz para valor próximo de metade o quantitativo da pensão do Recorrente, que resultaria das remunerações registadas durante os 44 anos de vigência da anterior legislação.

IX. O artigo 101º da Lei de Bases exige que o decreto-lei de desenvolvimento (o DL nº 187/2007) preveja um regime transitório de cálculo de pensões, que pondere, em termos proporcionais, os "períodos de carreira contributiva cumpridos ao abrigo da legislação anterior", de acordo com as "regras de determinação das pensões então vigentes".

X. Esta ponderação veio a ser efetuada pelo artigo 33.º, n.º 1, do Decreto-Lei 187/2007, do qual já resultaria uma diminuição proporcional do montante da pensão de reforma do Recorrente, em conformidade com a Lei de Bases.

XI. De acordo com a aplicação desta ponderação proporcional imposta pelo artigo 101º da Lei de Bases a pensão do Recorrente teria o valor de € 7.158,31: [(7.433,48 x 43) + (4.200,24 x 4)] -7- 47 = € 7.158,3l.

XII. Ao limitar a parcela PI a 12 IAS, o artigo 101º, nº 1, do DL nº 187/2007, reduz drasticamente a pensão de reforma do Recorrente, em termos que violam o artigo 101º da Lei de Bases, uma vez que, pura e simplesmente, suprime o resultado da ponderação proporcional imposta por esta norma.

XIII. Como resultado da aplicação do artigo 101º, nº 1, DL nº 187/2007, a pensão de reforma do Recorrente é reduzida para cerca de metade do valor que resultaria da ponderação proporcional imposta pelo artigo 101 º da Lei de Bases

XIV. Até ao Decreto-Lei 187/2007, o Recorrente trabalhou durante 44 anos e efetuou contribuições para a Segurança Social, sendo que em face das normas vigentes, durante este período de carreira contributiva, tinha a expectativa de receber uma pensão de reforma de € 7.433,48.

XV. Por aplicação do artigo 101º do Decreto-Lei 187/2007, que vigorou apenas durante os últimos três anos de carreira contributiva do Recorrente, a Segurança Social fixou a pensão do Recorrente num montante que corresponde praticamente a metade: € 5.290,33.

XVI. O resultado da aplicação do artigo 101º, nº 1, do Decreto-Lei 187/2007, para efeitos de cálculo do montante da pensão do Recorrente, viola claramente o disposto no artigo 101 º da Lei de Bases: regras vigentes durante 44 anos de carreira contributiva = pensão de € 7.433,48, artigo 101º, nº 1, do DL nº 187/2007, vigente nos últimos três anos de carreira contributiva = pensão de € 5.290,33.

XVII. É evidente que o artigo 101º, nº 1, do DL nº 187/2007 não faz relevar, no cálculo da pensão do Recorrente e com respeito pelo princípio da proporcionalidade, os períodos de carreira contributiva cumpridos ao abrigo de legislação anterior, bem como as regras de determinação das pensões então vigentes, violando assim o artigo 101.º da Lei de Bases da Segurança Social [!].

XVIII. De acordo com o disposto no artigo 101 º da Lei de Bases, o valor de pensão resultante das regras em vigor nos últimos três anos dos 47 anos da carreira contributiva do Recorrente deveria ter um peso de apenas 3/47 avos, no cálculo da pensão do Recorrente.

XIX. Por força do artigo 101º, nº 1, do DL n.º 187/2007, no cálculo da pensão do Recorrente, só relevaram as regras em vigor nos últimos três anos dos 47 anos de carreira contributiva, o que constitui uma evidente violação do artigo 101 º da Lei de Bases

XX. Deve assim o Tribunal Constitucional julgar a norma do artigo 101º, nº 1 do DL nº 187/2007, ilegal por violação dos artigos 100º e 101 º da Lei de Bases da Segurança Social (Lei nº 4/2007, de 16 de Janeiro)

XXI. Com a entrada em vigor do artigo 101.º do Decreto-Lei 187/2007, que introduziu um limite para as pensões de reforma, com efeitos imediatos e retroativos, o Recorrente assistiu a uma brutal redução da pensão de reforma, que legitimamente contava receber, tendo vindo a receber uma pensão que corresponde a cerca de [71]% [!] da pensão de reforma que contava receber.

XXII. Por força da aplicação retroativa do artigo 101.º, nº 1, do Decreto-Lei 187/2007, o Recorrente assistiu a uma perda que corresponde a 40,5% do valor da pensão que lhe veio a ser atribuída.

XXIII. O Recorrente confiou na Administração Pública da Segurança Social e acalentou, durante cerca de quatro décadas a expectativa legítima de vir a receber uma pensão de reforma, com um determinado valor.

XXIV. Mas, meses antes da sua reforma, viu-se, subitamente confrontado com uma quebra abrupta de rendimentos, que rompeu as condições de vida que preparara para a sua velhice: a pensão de reforma que resulta do artigo 101.º do Decreto-Lei 187/2007, é substancialmente inferior ao valor que o Recorrente esperava receber.

XXV. Trata-se de uma alteração verdadeiramente surpreendente e inusitada, uma vez que: não foi antecedida, nem acompanhada de qualquer diminuição, redução ou limitação das elevadas contribuições para a segurança social que o Recorrente e as respetivas entidades patronais efetuaram ao longo de décadas; contraria a antiguidade [47 anos (!)] do reconhecimento pelas autoridades públicas do...

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