Acórdão nº 533/17 de Tribunal Constitucional (Port, 11 de Setembro de 2017

Magistrado ResponsávelCons. Fernando Vaz Ventura
Data da Resolução11 de Setembro de 2017
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 533/2017

Processo n.º 844/2017 e 845/2017

Plenário

Relator: Conselheiro Fernando Vaz Ventura

Acordam, em Plenário, no Tribunal Constitucional.

I. Relatório

1. No processo relativo à eleição para a Câmara Municipal de Cabeceiras de Basto (proc. n.º 844/2017) e no processo relativo à eleição para a Assembleia Municipal do mesmo município (proc. n.º 845/2017, apenso), no âmbito das eleições autárquicas designadas para 1 de outubro de 2017, o mandatário da candidatura do Partido Socialista (PS) interpôs recurso, ao abrigo do artigo 31.º da Lei Eleitoral dos Órgãos das Autarquias Locais (LEOAL) — Lei Orgânica n.º 1/2001, de 14 de agosto, atualmente na versão conferida pela Lei Orgânica n.º 2/2017, de 2 de maio -, das decisões que, em cada um dos referidos processos, julgaram procedentes as reclamações apresentadas e admitiram as candidaturas do Grupo de Cidadãos Eleitores “Independentes por Cabeceiras” (doravante também referido pela respetiva sigla, IPC).

2. Em ambas as decisões, o Tribunal Judicial da Comarca de Braga, Juízo de Competência Genérica de Cabeceiras de Basto, deu provimento a reclamação deduzida pelo “IPC”, deduzida ao abrigo do n.º 1 do artigo 29.º da LEOAL, e admitiu as suas candidaturas aos referidos órgãos autárquicos, revertendo decisão inicial de rejeição, proferida na sequência de impugnação apresentada pelo PS. As decisões recorridas são substancialmente idênticas, pelo que se transcreve o respetivo conteúdo comum, na parte relevante:

«De acordo com o artigo 19º, n.º 3, da LEOAL "os proponentes devem subscrever a declaração de propositura da qual resulte inequivocamente a vontade de apresentar a lista de candidatos dela constante."

Da análise das declarações de propositura apresentadas verifica-se que a lista de candidatos efetivos e suplentes não consta da declaração que foi assinado por cada um dos proponentes.

A questão que se coloca é a de saber se a referência que no texto se faz à "lista anexa" é ou não suficiente para se concluir pela vontade inequívoca de apresentar a lista de candidatos dela constante.

A jurisprudência do Tribunal Constitucional tem-se debruçado sobre a questão de saber o que é necessário constar da declaração de propositura para que se conclua que a vontade dos proponentes, de apresentar aquela lista de candidatos, é inequívoca. Tal jurisprudência foi já citada no despacho sob reclamação, pelo que prescindiremos aqui de qualquer transcrição quanto à mesma.

Ora, da análise da jurisprudência citada resulta que se os nomes dos candidatos não constaram da própria declaração deverão constar de um anexo "devidamente identificado", "que forme com a declaração um todo incindível".

Atentando nos documentos que compõem a candidatura do grupo de cidadãos eleitores "Independentes Por Cabeceiras - IPC" concluiu o despacho reclamado não ser possível concluir de forma cabal que os proponentes quiseram apresentar, propor aqueles candidatos efetivos e suplentes, mas apenas o cabeça-de-lista, que é devidamente identificado pelo seu nome e que a simples alusão aos "cidadãos que constam da lista anexa" não dá qualquer garantia que a referida lista tenha sido apresentada a cada um dos cidadãos proponentes e que não está anexa às declarações de propositura uma lista dos candidatos e a que foi junta aos autos, por si só, não permite concluir que a lista tenha efetivamente sido vista e aprovada pelos proponentes ou, que tendo-lhes sido apresentada uma lista de candidatos, ela seja a mesma que veio remetida ao tribunal.

Ora, dos elementos que compõem os autos, também não pode deixar de concluir-se que os proponentes declararam subscrever uma lista de candidatos cuja composição conheciam ou dela podiam tomar conhecimento, caso o quisessem.

Não se infere dos autos que os proponentes não compreenderam o significado do ato pretendido/prestado ou sequer que não conheciam a lista dos candidatos em causa.

Saliente-se que o que importa acautelar é que os proponentes possam ter tido acesso às listas dos candidatos que estão a apoiar, que hajam demonstrado vontade inequívoca de apresentar a lista de candidatos constante da declaração de propositura. Tal declaração de vontade não se pode negar às declarações de propositura da lista reclamante e juntas aos autos.

Da reclamação apresentada não resulta a confissão invocada pelo Respondente (Partido Socialista), pois que o artigo 36, e os que o antecedem, da reclamação referem que tendo em conta os prazos legais para recolha de assinaturas e escolha de candidatos, a defender-se a tese do despacho reclamado, em abstrato poderiam ocorrer situações de parcelar desconhecimento dos candidatos.

Dos autos não resulta demonstrado qualquer desconhecimento.

Não tem este Tribunal como sindicar e concluir que os assinantes efetivamente consultaram as listas com a totalidade dos candidatos, todavia o que importa é que o possam ter feito caso assim o entendessem. Dos autos não resultam elementos que demonstrem o contrário, ou seja, que os proponentes não puderam aceder a tais listas ou que as mesmas eram incompletas ou distintas da remetida ao Tribunal.

Também não é possível asseverar que os candidatos que aceitaram formalmente a sua designação em momento posterior às declarações de propositura não constassem da lista que se diz anexa às mesmas.

Em face de todo o exposto, julgo procedente a reclamação apresentada pelo Grupo de Cidadãos Eleitores "Independentes Por Cabeceiras - IPC", admitindo a respetiva candidatura».

3. A candidatura do PS não se conformou e interpôs recurso, pugnando pela revogação da decisão de admissão e pela sua substituição por outra, que determine a rejeição de «todas as candidaturas apresentadas pelo Grupo de Cidadãos Eleitores “Independentes por Cabeceiras de Basto” ao Município de Cabeceiras de Basto, porquanto a decisão viola, clara e expressamente, o disposto nos artigos 16.º, 17.º, 19.º, 21.º, 22.º, 23.º da Lei Orgânica de 1/2001, de 14/08”.

Extraiu das alegações - onde são referidas candidaturas a outros órgãos do município, para além da Câmara Municipal e Assembleia Municipal de Cabeceiras de Basto - as seguintes conclusões (igualmente idênticas em ambos os processos):

«I. O PS não se conforma com a decisão recorrida pelo que não lhe resta senão recorrer da mesma para o Tribunal Constitucional.

II. O PS considera que a decisão recorrida consubstancia uma violação clara e inequívoca do disposto do artigo 19.º da LEOAL,

III. Uma violação clara e inequívoca da jurisprudência uniformizada do Tribunal Constitucional,

IV. Consubstancia erros quanto aos pressupostos de facto e erros quanto à apreciação da prova documental.

V. Contrariamente à decisão inicial, que determinou a rejeição das candidaturas do “IPC”, a decisão recorrida não analisou os documentos constantes dos autos dos processos eleitorais relativos às candidaturas do “IPC”.

VI. As declarações de propositura constam dos autos dos processos eleitorais.

VII. Percorrendo uma a uma detecta-se, desde logo, um denominador comum: nenhuma delas identifica os candidatos, efectivos e suplentes, e nenhuma delas tem anexada uma lista com a identificação dos mesmos.

VIII. Esta circunstância é reconhecida pela decisão inicial: “Isto porque, o tribunal, olhando para os documentos que compõem a candidatura do grupo de cidadãos Independentes por Cabeceiras, não concluir de forma cabal que os proponentes quiseram apresentar, propor aqueles candidatos efectivos e suplentes, mas apenas o cabeça-de-lista, que é devidamente identificado pelo seu nome. A mera alusão aos “cidadãos que constam da lista anexa à presente declaração” não nos dá garantia que a dita lista tenha sido apresentada a cada um dos cidadãos proponentes. De facto, não está anexa a cada declaração de propositura uma lista dos candidatos e a que foi junta aos autos, por si só, não nos permite concluir que a lista tenha sido vista e aprovada pelos proponentes ou, que tendo-lhes sido apresentada uma lista de candidatos, ela seja a mesma que veio remetida ao tribunal.

IX. Por isso mal andou o tribunal porquanto dos autos dos processos eleitorais é notório que tais listas não se encontram anexadas às declarações.

X. O tribunal deveria, logo à partida, determinar se as listas de candidatos se encontravam efectivamente anexadas às declarações.

XI. Ocorreu, igualmente, um outro erro na apreciação da prova documental que o PS apresentou com a sua resposta à reclamação do “IPC”.

XII. Consultados os processos eleitorais das candidaturas do “IPC” que se encontram depositadas neste tribunal CONSTATA-SE A EXISTÊNCIA DE MAIS DE MIL DECLARAÇÕES DE PROPOSITURA COM DATAS ANTERIORES ÀS DECLARAÇÕES DE ACEITAÇÃO DE CANDIDATOS.

XIII. Acresce o “IPC” solicitou certidões de capacidade eleitoral de candidatos nos últimos dias para apresentação das candidaturas, designadamente no último dia (07-08-2017).

XIV. Isto significa, claramente, que quando assinaram as declarações de propositura os cidadãos não sabiam quem eram os candidatos porque estes ainda não tinham sequer aceitado assumir essa qualidade!

XV. A confirmação da inexistência da data, assinatura e rubricas é essencial para a decisão desta causa na medida em que estamos perante uma formalidade essencial das candidaturas.

XVI. Também aqui o tribunal não disse nada e estava obrigado a fazê-lo sendo certo que não lhe seria difícil dado que os documentos em causa (listas) constam dos processos eleitorais.

XVII. O PS alega a existência de uma coligação material entre o “IPC” e os partidos “PSD” e “CDS” e, ainda, a inexistência de qualquer documento que legitime o mandatário do “IPC” nas candidaturas à Câmara Municipal e à Assembleia Municipal de Cabeceiras de Basto.

XVIII. As questões suscitadas são as seguintes:

a) Violação do...

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