Acórdão nº 705/16 de Tribunal Constitucional (Port, 21 de Dezembro de 2016

Magistrado ResponsávelCons. Lino Rodrigues Ribeiro
Data da Resolução21 de Dezembro de 2016
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 705/2016

Processo n.º 573/16

2ª Secção

Relator: Conselheiro Lino Rodrigues Ribeiro

Acordam, em conferência, na 2ª Secção do Tribunal Constitucional

I. Relatório

1. A. foi inicialmente condenado, com intervenção do Tribunal Coletivo da 4ª Vara Criminal do Porto, pela prática, em autoria material, de três crimes de peculato, p. e p. no artigo 375.º, n.º1 e 386.º, n.º 1, alínea c) do Código Penal e de seis crimes de corrupção passiva, p. e p. no artigo 372.º, n.º 1 e 386.º, n.º 1, alínea c) do Código Penal, tendo-lhe sido aplicada, em cúmulo jurídico, a pena única de sete anos e seis meses de prisão. Não se conformando com este primeiro Acórdão, dele recorreram o Ministério Público e vários coarguidos. Apreciando, o Tribunal da Relação do Porto decidiu, por acórdão datado de 07/07/2010, conceder parcial provimento ao recurso e ordenar, nos termos do disposto nos artigos 410.º, n.º 2, alínea a), b) e c) e 426.º, n.º 1 do CPP, o reenvio do processo para novo julgamento.

Em 12/07/2013 proferiu o segundo Tribunal Coletivo novo acórdão, no qual absolveu A. dos crimes de peculato pelos quais vinha acusado, e no qual o condenou pela prática de seis crimes de corrupção passiva, p. e p. no artigo 372.º, n.º 1 e 386.º, n.º 1, alínea c) do Código Penal, tendo-lhe sido aplicada, em cúmulo jurídico, a pena única de quatro anos e nove meses de prisão, suspensa por igual período de tempo, mediante a condição de proceder ao pagamento ao Estado do montante equivalente ao benefício ilicitamente obtido (de € 188.607,34), a que acresceu a obrigação de sujeição a regime de prova. Recorreu o arguido desse novo Acórdão para o Tribunal da Relação do Porto que, por acórdão de 30/09/2015, decidiu negar provimento ao recurso.

Interpôs então o arguido recurso para o Supremo Tribunal de Justiça (STJ), o qual, por despacho de 05/02/2016, não foi admitido com base no artigo 400.º, n.º 1, alínea f) do CPP. O arguido apresentou reclamação, nos termos do artigo 405.º do CPP, a qual foi indeferida por decisão de 05/06/2016 proferida pelo STJ.

2. O recorrente interpôs, então, recurso para o Tribunal Constitucional ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, requerendo a apreciação de duas questões de constitucionalidade, as quais se encontram formuladas da seguinte forma:

«A. A interpretação das normas conjugadas da al. a) do nº 2 do artº 5º e da al. f) do nº 1 do artº 400º CPP que considere aplicável a versão desta última norma resultante da Lei n.º 48/2007, de 29 de agosto (mantida sem alterações pela Lei nº 20/2013, de 21 de fevereiro) a um processo, como o presente, iniciado antes da entrada em vigor da mesma Lei 48/2007, e não permita o recurso dum acórdão da Relação que confirme uma pena inferior a oito anos de prisão aplicada em primeira instância a crimes que, em concurso de infrações, são puníveis com uma pena de prisão muito superior a oito anos, é inconstitucional, por violar, entre outros, o princípio da irretroatividade da lei penal e as garantias de defesa decorrentes dos arts. 29º, 1 e 31º, 1, CRP.

B. Porque viola os mesmos princípios, garantia e preceitos da CRP, é inconstitucional a interpretação das normas conjugadas da al. a) do nº 2 do artº 5º, da al. e) do nº 1 do artº 400º e da al. b) do artº 432º do CPP que considere aplicável a versão de tais normas resultante da Lei nº 48/2007, de 29 de agosto (mantida sem alteração pela Lei nº 20/2013, de 21 de fevereiro) a um processo, como o presente, iniciado antes da entrada em vigor da mesma Lei 48/2007, e não permita o recurso dum acórdão da Relação que confirme uma pena de prisão 4 anos e 9 meses (ainda que suspensa na sua execução) aplicada em primeira instância a crimes que, em concurso de infrações, são puníveis com uma pena de prisão muito superior a oito anos».

3. No Tribunal Constitucional foi proferida a decisão sumária 598/2016, que decidiu não conhecer do recurso, com os seguintes fundamentos:

"(...)

6. São duas as questões objeto do presente recurso que, no entanto, podem ser apreciadas em conjunto. De facto, quer a primeira, quer a segunda, encontram-se delineadas, nas respetivas primeiras partes, como reportando-se à aplicação de determinadas normas em função do tempo. A primeira consiste na “interpretação das normas conjugadas da al. a) do nº 2 do artº 5º e da al. f) do nº 1 do artº 400º CPP que considere aplicável a versão desta última norma resultante da Lei n.º 48/2007, de 29 de agosto (mantida sem alterações pela Lei nº 20/2013, de 21 de fevereiro) a um processo, como o presente, iniciado antes da entrada em vigor da mesma Lei 48/2007”, e a segunda reporta-se à “interpretação das normas conjugadas da al. a) do nº 2 do artº 5º, da al. e) do nº 1 do artº 400º e da al. b) do artº 432º do CPP que considere aplicável a versão de tais normas resultante da Lei nº 48/2007, de 29 de agosto (mantida sem alteração pela Lei nº 20/2013, de 21 de fevereiro) a um processo, como o presente, iniciado antes da entrada em vigor da mesma Lei 48/2007”.

6.1. Ora, no que toca às primeiras partes assim transcritas de ambas as questões, importa começar por referir que, em ambas, o recorrente visa questionar da aplicabilidade de uma norma de direito infraconstitucional ao caso concreto. Ora, mas se assim é, importa relembrar que o Tribunal Constitucional não tem competência para sindicar a correção dos juízos subsuntivos realizados pelos tribunais comuns, no que respeita à determinação da norma aplicável a determinado caso concreto. Tal juízo importaria a sindicância do próprio mérito da decisão, no que respeita, em especial, a seleção das normas aplicáveis ao caso. Ora, a sindicância do mérito é matéria estranha às competências do Tribunal Constitucional, na falta de recurso de amparo no sistema português de controlo da constitucionalidade.

6.2. Mas importa ainda sublinhar que, mesmo que se entendesse serem as questões em apreço reconduzíveis ao conceito de norma, ainda assim não se poderia tomar conhecimento das mesmas, for falta de utilidade do recurso. De facto, o Tribunal da Relação acrescentou...

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