Acórdão nº 419/16 de Tribunal Constitucional (Port, 22 de Junho de 2016

Magistrado ResponsávelCons. Ana Guerra Martins
Data da Resolução22 de Junho de 2016
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 419/2016

Processo n.º 349/15

2.ª Secção

Relatora: Conselheira Ana Guerra Martins

(Conselheiro João Cura Mariano)

Acordam, na 2.ª Secção, do Tribunal Constitucional

I - Relatório

Em processo de execução fiscal pendente no Serviço de Finanças de Santa Maria da Feira - 1 foi penhorado em 17 de maio de 2005 o prédio inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Arrifana sob o n.º …, pertencente a A..

Ordenada a venda judicial na modalidade de propostas por carta fechada, verificou-se, em 19 de janeiro de 2006, não ter sido efetuada qualquer proposta para a sua compra, pelo se ordenou a sua venda por negociação particular.

Em 15 de setembro de 2006 foi celebrado entre a Direção Geral dos Impostos e a sociedade B., Limitada, um contrato de mediação imobiliária, através do qual esta se obrigou a diligenciar, em regime de exclusividade, no sentido de conseguir interessado na compra daquele imóvel pelo preço mínimo de € 9.250,00, comprometendo-se a entregar no serviço local de finanças todas as propostas recebidas.

A. foi notificado por ofício enviado em 18 de setembro de 2006 de que havia sido nomeado negociador particular do bem imóvel referido a sociedade B., Limitada, por contrato celebrado em 15 de setembro de 2006, pelo facto de não terem existido proponentes na venda judicial por proposta por carta fechada.

Além da divulgação na Internet, em 19 de setembro de 2006 foi afixado no Serviço de Finanças de Vila da Feira e na Junta de Freguesia de Arrifana, anúncio da venda por negociação particular do referido imóvel no prazo de 60 dias, contados desde 15 de setembro de 2006.

Em 6 de novembro de 2006 a mediadora comunicou ao Serviço de Finanças de Santa Maria da Feira que havia recebido uma única proposta para a compra do referido imóvel pelo preço de € 10.195,00, apresentada por “C., Unipessoal, Limitada”.

O Chefe de Finanças proferiu despacho em 17 de novembro de 2006, aceitando aquela proposta.

Em 10 de janeiro de 2007 foi celebrada escritura pública de compra e venda, através da qual a sociedade mediadora, na qualidade de encarregada da venda, declarou vender a “C., Limitada”, o referido imóvel pelo preço de € 10.195,00, que esta declarou aceitar.

A. foi notificado da celebração deste contrato por ofício expedido em 22 de janeiro de 2007.

A. e D., filha daquele, vieram instaurar ação de anulação daquela venda em 31 de janeiro de 2007, tendo sido proferida sentença em 19 de agosto de 2013 que a julgou improcedente.

Os Autores recorreram desta sentença, tendo o Supremo Tribunal Administrativo, por acórdão proferido em 5 de fevereiro de 2015, julgado improcedente o recurso.

Os Autores recorreram desta decisão para o Tribunal Constitucional, tendo após convite de correção do requerimento inicial, peticionado o seguinte:

“…Os recorrentes pretendem ver apreciada a constitucionalidade da interpretação normativa dos artigos 252.º, 257.º e 258.º do C.P.P.T. e 201.º, 912.º e 913.º do C.P.C. sustentada na decisão recorrida segundo a qual não existe a obrigatoriedade de notificação do executado ou remidor, na venda por negociação particular, da adjudicação e data da venda do bem penhorado.

I – Interpretações normativas cuja constitucionalidade se pretende que o Tribunal aprecie:

1 - As normas constantes dos artigos 252.º e 257.º do C.P.P.T. e 201.º do C.P.C. interpretadas no sentido de que: a obrigatoriedade de notificação do executado e do titular do direito de remição, da proposta de aquisição que veio a ser aceite e do dia e hora da marcação da venda judicial, não encontra abrigo na lei vigente à data dos factos, bem como, no plano prático visam concretizar uma venda extrajudicial, as notificações que o reclamante pôs em causa, e que cabe ao executado o dever de se inteirar junto do encarregado da venda e do respetivo processo de execução da tramitação levada a efeito respeitante à concretização da venda, bem como, entender-se suficiente para a concretização válida da venda por negociação particular a notificação que deu conhecimento ao executado da modalidade da venda que seria prosseguida, no caso, fixando-se o momento próprio em que o executado poderia reagir contra a venda assim determinada, não o fazendo, mais nenhuma notificação lhe seria dirigida a não ser a de que o bem já havia sido vendido, fazendo-o em termos que os recorrentes, salvo o devido respeito, não consideram corretos na medida em que a ausência das notificações – para a proposta, bem como do preço oferecido para a aquisição do imóvel, tal como o despacho de adjudicação, do local, dia e hora da realização da escritura pública de compra e venda do imóvel – são essenciais e indispensáveis, até para que o executado possa poder transmitir aos titulares do direito de remição as condições da venda para que estes possam seguramente exercer o seu direito, sendo, por via disso, a notificação imprescindível para a boa, justa e equitativa conclusão do processo, bem como, a interpretação destas normas no sentido em que o fez o Supremo Tribunal Administrativo coloca os ora recorrentes – executado e titular do direito de remição – à margem de um processo do qual são os principais interessados, tanto mais que estamos a falar da casa de morada de família deste agregado familiar.

2 - As normas constantes dos artigos 258.º do C.P.P.T. e 912.º e 913.º, do C.P.C. interpretadas no sentido de que não se encontra a mais breve referência, que seja, à obrigatoriedade de notificação do titular do direito de remição para que se apresente em juízo a exercer o seu direito, fazendo-o em termos que os recorrentes, salvo o devido respeito, não consideram corretos, é por demais evidente que o remidor para que possa exercer direito de remição na sua plenitude deverá tomar conhecimento de todas as circunstâncias da venda, só assim se encontra em condições de formar a sua vontade por um lado e poder exercer o seu direito com toda a informação necessária, por outro. Aliás, todo o regime legal aponta, forçosamente, no sentido de possibilitar que os familiares mais próximos do executado - cônjuge, ascendentes ou descendentes - adquiram o bem a vender judicialmente, pelo preço já determinado; daí que toda a intervenção judicial neste âmbito se deva pautar pela necessidade de coadjuvar a eficácia do instituto, isto é, em termos de promover que o património do executado seja o menos prejudicado possível, não sendo possível ao titular do direito, como no caso dos autos, exercer o direito de remição até à assinatura do titulo que o documenta, ou seja, escritura pública, artigo 913, n.º 1 al. b) do C.P.C. sem a respetiva notificação comprometendo irremediavelmente todo o exercício do direito de remição por quem se configura com legitimidade para tal.

II - Normas e princípios constitucionais que se considera terem sido violados:

1 - As normas constantes do artigo 252.º e 257.º do C.P.P.T. e 201.º do C.P.C. interpretadas no sentido de que a obrigatoriedade de notificação do executado e do titular do direito de remição, da proposta de aquisição que veio a ser aceite e do dia e hora da marcação da venda judicial, não encontra abrigo na lei vigente à data dos factos viola direitos constitucionalmente protegidos, nomeadamente de acesso ao direito e aos tribunais para defesa de direitos e interesses legalmente protegidos e a um processo equitativo, previsto nos artigos 20.º, n.º 1 e 4 da CRP, assim como ver assegurada a defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, nos termos do previsto nos artigos 12.º, 13.º, 18.º, 20.º e 65.º da CRP, resultando na violação do direito à casa de morada de família;

2 - As normas constantes dos artigos 258.º do C.P.P.T. e 912.º e 913.º do C.P.C. interpretadas no sentido de que não se encontra a mais breve referência, que seja, à obrigatoriedade de notificação do titular do direito de remição para que se apresente em juízo a exercer o seu direito. É por demais evidente que o remidor, para que possa exercer direito de remição na sua plenitude, deverá tomar conhecimento de todas as circunstâncias da venda, designadamente valor da venda, encargos a suportar com o ato da escritura, só assim se encontra em condições de formar a sua vontade por um lado e poder exercer o seu direito com toda a informação necessária, por outro. Aliás, todo o regime legal aponta, forçosamente, no sentido de possibilitar que os familiares mais próximos do executado - cônjuge, ascendentes ou descendentes - adquiram o bem a vender judicialmente, pelo preço já determinado; daí que toda a intervenção judicial neste âmbito se deva pautar pela necessidade de coadjuvar a eficácia do instituto, isto é, em termos de promover que o património do executado seja o menos prejudicado possível, não sendo possível ao titular do direito, como no caso dos autos, exercer o direito de remição até à assinatura do titulo que o documenta, ou seja, escritura pública, artigo 913, n.º 1 al. b) do C.P.C. sem a respetiva notificação, criando na esfera jurídica do titular do direito um verdadeiro direito condicionado e demasiado oneroso consubstanciando uma violação de direitos constitucionalmente consagrados e protegidos previstos nos artigos 12.º, 13.º, 18.º, 20.º, n.º 1 e 4 e 65.º da CRP.

Estas questões da constitucionalidade foram suscitadas nas alegações de recurso dos ora recorrentes, bem como, nas conclusões desse recurso para o Venerando Supremo Tribunal Administrativo.”

Apresentaram alegações, em que além do pedido de fixação do efeito suspensivo ao recurso, que foi indeferido por despacho do relator, fizeram constar as seguintes conclusões:

“…

13 - As normas constantes do artigo 252.º, 257.º e 258.º do C.P.P.T. e 201.º do C.P.C. então em vigor,...

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